Planeta 1 (Parte 1/3)

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Para não me arrepender depois
(excitação)

Capítulo 1

   Minhas crônicas marcaram os grandes livros de história, onde apareço como heroína, revolucionária ou qualquer outro título exagerado, digo isto pois tudo começou com o imaturo, arrogante e despretensioso eu escapando do lar aos dezoito anos, num caminho que me forçará a crescer independente de minhas escolhas, era isso que eu rusticamente acreditava ser liberdade.

   Naquele tempo, pela primeira vez pude voar sem a menor das preocupações. Só de pensar nos próximos passos após fugir de casa já sentia o coração palpitar. Agarrei uma oportunidade única, afinal, meu planeta sempre foi louvado por sua ampla capacidade de detecção e não é todo dia que desativam o sistema para revisão. Até uma desprezível formiga poderia ser localizada desde que estivesse dentro do campo planetário, portanto, "fugir de casa" era um pouco mais trabalhoso do que parecia ser nas histórias antigas da vovó Hara, mas estava satisfeita, algumas centenas de milhares de quilômetros se mostraram suficientes para despistar. Viajei usando meu traje criador de campo, que já se mostrava diferente dos habituais, pois meu DNA coperiano (é o que permite o uso funcional do traje) nasceu ativado somente da cintura para baixo, logo, só era possível vesti-lo entre o quadril e os pés. O design daquele equipamento sempre me incomodou, era grosso demais na panturrilha e tinha um encaixe apertado na parte superior das coxas, apesar de tudo era compacto se tratando de uma máquina que me permitiu voar e controlar poderosas esferas. Estas últimas (esferas) não eram nada mais do que várias peças maleáveis de um metal bem resistente, que podiam flutuar em alta velocidade e tomar diversas formas. Geralmente as usava na configuração de esferas ou qualquer coisa que fosse versátil nas lutas, inclusive, é daí que vem o nome; não andava sem elas de jeito algum.

   — Estamos nos aproximando de um planeta anão... Mas talvez seja um asteroide, na verdade planeta anão não é nem considerado planeta... Devia ter falado terra à vista, seria tão mais legal, como se nós fôssem-...

   — Já entendi, Kan-san. Vida inteligente?

   — Não é catalogado, portanto não foi povoado, ao menos legalmente... Ei, se liga no que eu-...

   — Seu relatório foi concluído, ative o limitador de palavras.

   Esse robô tagarela é K-A n°3, imaginei que seria uma boa ideia nomeá-lo de Kan-san e criar intimidade, só não esperava que sistemas avançados de I.A. pudessem se tornar tão irritantes. Máquinas do modelo K-A tem formato de bola, uma câmera central, vários receptores de sentido (olfato, audição etc) ocultados em seu corpo, além de duas aberturas nas extremidades norte e sul, que exercem várias funções, em geral de lá saem as garras e o produtor do combustível que provê ar, saciedade e sobrevivência no espaço para nós coperianos.

   Comumente víamos ladrões, criminosos e os mais diversos tipos de traficantes nos tempos antigos, porém, após a cisão da Terra, a escala dos problemas cresceu exponencialmente, resultando nos vigentes piratas espaciais... Eles tem cabelos longos, brancos, sujos e jogados para trás; são velhos, mas não o suficiente para se ter esperança de que eles morrerão logo; e o pior de tudo, eles tem um olhar de confiança e desprezo, como se te olhassem de cima e o considerassem ser nada mais do que um alvo de testes... Por que fui tão específica? Desculpe, na verdade falo de apenas um, Condivár, o simples pirata espacial, ou pelos menos foi o que eu imaginei aquele dia.

   — Está ouvindo isso, Kan?

   — Me parece som de mineração.

   — Se estou correta, explorar planetas não catalogados é proibido por lei, certo?

   — Correto, Tobumi-san [...] Está sonhando acordada?

   — Talvez possa começar minha nova vida como uma heroína que prende super vilões... Ou apenas patéticos mineradores ilegais... Bem, todos tem que começar de algum lugar.

   Ser uma xerife heroína interplanetária foi um sonho que nasceu e virou destroços dentro de minutos. Avistei, por de trás de uma pedra, dois rapazes quebrando rochas, enquanto um outro levava um cristal dando tanto cuidado quanto se dá à uma substância radioativa.

   "Em mais ou menos cem metros há uma nave de fuga com três homens. Um deles tem cabelos brancos e parece ser mais velho, assumirei que é o capitão."

   — Ei! De onde você saiu, garota...? Merda! É uma coperiana!! Não tenham piedade!

   "Mais esses outros três que acabaram de me ver. Tsc... Nove pessoas? Talvez nem chamando mais eles me derrotariam, serei breve com esses coitados, mas assim como aquele ali disse: sem piedade."

   Como eu nasci manifestando DNA coperiano apenas nas pernas, minhas lutas podem ser resumidas a chutes e manobras com a parte inferior do corpo, para coordenar os movimentos das esferas. Imagino que detalhar embates seja irrelevante, mas vou conceder-lhes o privilégio.
Os malfeitores estavam equipados com bastões, tasers desestabilizadores e picaretas. Me perguntava o porque da qualidade medíocre dos equipamentos.
   "Talvez eles sejam inexperientes. Então é uma pena, não terão recompensas."
   O homem que anunciou minha posição tomou a frente com um bastão, desarmei-o com um chute e desci rapidamente minha perna em direção ao chão, isso serviu de comando para que uma esfera me defendesse de um ataque que vinha pelas minhas costas. Duas picaretas, dois bastões e um taser na mão secundária; não tinha tempo para lidar com isso, meu objetivo era o rapaz do cristal, que, por sinal, já estava perto das escadas da nave. Fiz as esferas assumirem configuração de meia lua e, em seguida, rodarem aleatoriamente à minha volta – semelhante a um furacão –, tornando desviar praticamente impossível, poucos segundos foram necessários para derrubar todos ao meu redor. Quando acabou, peguei impulso e fui em direção à nave. O cristal já estava nas mãos do capitão. Ele vestia apenas uma luva enquanto calma e habilidosamente usava-o para carregar sua pistola. 

   "No fim ele realmente era o chefe. De qualquer forma, melhor não subestimar ninguém, usarei uma esfera como escudo de sacrifício para o próximo ataque. Desculpa, bolinha."

   Ao ouvir a arma carregar, senti um arrepio forte subir a espinha e resolvi desviar de última hora. Por mais ágil que eu tenha sido, não foi suficiente para escapar da carga elétrica de poder grotesco vinda daquele cristal. Parte do meu traje foi destruído e uma das minhas asas ficou exposta. Com o equipamento danificado, as últimas lembranças que tenho são de cair rodopiando igual a um avião defeituoso e desacordar.

   O que disse? Preciso esclarecer alguma coisa? Ah, claro... não se preocupe, meu equipamento não tinha asas, isso seria ridículo. Me referi às minhas próprias asas.

Tobu no Tobumi-chanOnde histórias criam vida. Descubra agora