III. Você Valia

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Caminho descalça pelo chão de madeira gelado. Meus batimentos estavam tão acelerados que mal conseguia concentrar-me em qualquer outra coisa. Se eu não estivesse sentindo como se fosse morrer, aquele seria o ápice da cena mais importante da minha vida nos últimos tempos.

Desliguei o telefone, indo em direção ao estranho que me aguardava do outro lado da porta. . Era meu Thomas, tarde, mas ainda assim. Não. Meu não.

Mesmo depois de eu ter me desculpado com Aimee por ter dado um mini show em sua casa, ela não deu mais sinal de vida. Não me disse absolutamente nada sobre seu encontro com Thomas. Era ela minha melhor amiga e tinha acompanhado exatamente todos os momentos que passei desde que o conheci, mas não estava ali para me ajudar, nem sequer dizer se ele era perigoso. Mas agora era o momento de ser madura o suficiente; a fase da paixão passara e eu era uma nova pessoa.

Passei a mão pelo cabelo preto, sem precisar olhar no espelho para saber que estava repulsivo depois da jornada no restaurante. Tremi a mão na maçaneta, segurando-a firme. Termine de montar seu quebra cabeça, a voz de Aimee gritava dentro de mim. Quando a porta velha rangeu, a luz fraca do poste revelou a figura de preto, com profundos olhos de um oceano negro me perfurando. Ele piscou lentamente, os cílios negros como os olhos. Eu sentia que para ele aquela não fosse a primeira vez. Se não controlasse meus movimentos, ia começar a me bater como um peixe fora d'agua. Recuei, dando um passo pra trás. Aquele não poderia ser...

— Você.

Dois palmos mais alto, escondia as mãos no bolso do jeans preto. Sua camisa escura estava abotoada e passada como se estivesse indo a um compromisso formal. A mesma boca carnuda que distribuía sorrisos marotos anos atrás estava calada. Aquilo era um tiro no peito. Quantas vezes eu não ansiei por beija-lo, sentir seu toque? E agora nós éramos apenas dois desconhecidos. Era como se alguém me puxasse com força para o passado, destruindo o muro que construí para afasta-lo. Meu castelo estava em ruínas.

Eu ainda o amava. E ele não precisava dizer nem sequer uma palavra para me convencer do contrário. Era como finalmente conhecer aquele ídolo que nunca esteve perto suficiente para tocar. Minha mente fez questao de abrir a caixa de memórias dolorosas:

"— Você é três anos mais velho. Eu não quero te deixar convencido, mas você é bonito pra cassete, Thomas Miller. Um pedaço de mal caminho.

— Eu sou um baita problema, isso sim.

— Um enigma nas horas vagas. — Sorri, sentindo o mundo parar de girar."


— Sentiu minha falta?

Sua voz baixa fez com que meu corpo se arrepiasse da cabeça aos pés. Nem mesmo dez mil Jaydens me fariam sentir o que Thomas estava proporcionando agora. Estreitei os olhos, encarando seu pescoço. Ele não tinha tatuagens na última ligação. A coruja de asas abertas cobria seu pescoço e acabava onde a gola da camisa começava. Se ele tinha mais, eu provavelmente nunca saberia.

— Você tem tatuagens agora? — Disparei. — Por onde você andou?

Era um péssimo momento para começar a surtar e disparar palavras como eu sempre fazia. Mas era mais forte que eu. Fechei as mãos, sentindo as unhas cravando a pele. Ah, se eu tivesse o poder de voltar na porra do tempo.

— Você gostou? — O sorriso brincava em seus lábios como um gatilho apontado.

— Eu ia te perguntar o que você está fazendo aqui, seria justo? — Dei um passo à frente — Eu não consigo acreditar que esse seja o garoto que eu conheci na internet anos atrás. Sabe o que você parece? Um safado, mentiroso, descarado. Com essa cara de bandido você não escreve nada além de pichação nos muros da sua cidade! E essa historinha de morar em Bridgeport?

END GAME - REVISAOOnde histórias criam vida. Descubra agora