CAPÍTULO II - EM TERRITÓRIO FRANCÊS

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Pierre Lacarte gostava de falar, realizava verdadeiros monólogos e se empolgava ainda mais sobre algo a que estimava tanto quanto sua terra natal.

E durante o trajeto, Nichollas, por mais que tentasse fugir, não pôde livrar-se do outro que descrevia detalhadamente os pontos que achava mais importantes...

Isto significava todos.

Chegou em Paris no início da noite, não demorando-se a escolher um local para se instalar, elegendo um já conhecido de uma estadia anterior.

O silêncio do quarto incomodava os ouvidos, a mente não era mais ocupada com as ladainhas de Pierre e estava livre para pensar, para criar diversos cenários sobre o encontro com Marie.

No mais otimista, ela lhe ofertaria um doce sorriso e aceitaria retornar para Inglaterra, onde permitiriam-se vivenciar o amor que foi renegado tempos atrás.

Apesar de ser um sonhador, Nichollas sabia que tal estimativa chegava a ser utópica de tão irreal. Pelo que conhecia de Marie, estava mais do que certo de que ela não cederia tão facilmente. A moça tinha seus motivos, ainda não confiava suficientemente nele para abandonar os receios e ser arrebatada pelos sentimentos que compartilhavam.

E seria a missão de Nichollas provar a ela que era digno de sua confiança e amor.

A ansiedade ultrapassava os limites intangíveis, tomando uma forma palpável em torno de si. A noite foi mal-dormida, o corpo ainda estava rígido e dolorido, um reflexo dos momentos angustiantes que antecederam o nascer do sol.

E sob a luz matinal que prometia um recomeço, Nichollas muniu-se da carta de Charles e saiu à procura de Marie.

Recorreu a uma carruagem de aluguel e ao afastar-se do centro, o fulgor dos inúmeros transeuntes se amenizava de forma drástica, e esta não era a única característica notada pelo Batterfield, mas também a decadência ao redor. As moradias dispunham-se desordenadas, as ruas eram estreitas com dejetos às vistas, latrinas corriam a céu aberto e um rato ou outro passava por ali.

Os pensamentos vagaram até a dama que apreciava os cravos na estufa de Charlotte Gardens House, aquele era o lugar dela, cercada de pétalas suaves, e não ali. O peito doía porque sabia que Marie merecia muito mais, e queria ele poder remediar a forma pouco afável que a vida a tratou até então.

Ao descer da carruagem, foi impossível não sentir o odor pútrido que impregnava o ar. Colocou a mão no bolso da calça, passando os dedos pelo papel, mas não necessitava conferir o endereço grafado na caligrafia do irmão, já havia decorado.

Rue Cardinet, 5

Repetiu para si mesmo ao fitar o número preso numa construção tão degradada quanto qualquer outra ali.

As tábuas do chão rangeram quando ele entrou, o ar era pesado, bolorento. Uma mulher não demorou a recepciona-lo, os lábios eram pintados de carmim e a cintura robusta estava apertada por um corpete, era difícil compreender como ela ainda conseguia respirar com tamanha compressão. A juventude já havia a deixado, porém era evidente que ela se esforçava em mantê-la.

Ela correu os olhos por ele, sem pudores ao avaliá-lo, Nichollas podia até ler seus pensamentos: um estrangeiro que possuía dinheiro o suficiente para vestir-se com roupas de qualidade.

— Como posso ajudá-lo, messieur? — questionou com um sotaque carregado.

— Procuro uma dama, Senhorita Turner.

— Ah, compreendo. — Deu um sorriso lascivo. — Veio no local correto, mas creio que a moça em questão não realiza tais serviços. — Fez um gesto despreocupado com a mão. — É melhor procurar outra que atenda as suas necessidades, messieur.

A Mensagem dos Cravos [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora