Marie acreditou ser incomum o silêncio que Thomas fizera durante o longo caminho que percorreram até o lugar que agora chamavam de lar. O rapaz nunca fora de falar de forma desenfreada, mas possuía olhos observadores que não raras vezes, enquanto caminhava pela cidade, faziam-no tecer comentários acerca dos detalhes que ninguém mais via.
Naquela noite, entretanto, nenhum detalhe parecia ser observado.
Não que Marie estivesse inclinada a manter longos e estimulantes diálogos e ansiasse por isto. Nem de perto. Nos últimos dias havia estado tão confusa com a chegada de Nichollas à Paris que sentia-se inapta a estabelecer um de forma minimamente organizada. Mas a verdade era que temia sobre os assuntos que não conhecia, pertencentes à mente do sobrinho, não à sua.
Mal sabia ela o quão similares eram os assuntos que permeavam a mente de ambos, porém, e o quanto os mesmos demandavam do rapaz, deixando-o reflexivo e quieto.
— Enfim, chegamos. — A fala de Marie soou assim que Thomas abriu a porta da pensão, deixando-a entrar à sua frente. — Obrigada, meu querido.
A moça colocou-se a subir os degraus deteriorados e ruidosos, em direção ao pequeno quarto conjugado que ocupavam no local.
Tratava-se de velho cômodo, dividido em dois minúsculos ambientes e um pequeno lavabo.
Em um permaneciam o pai de Marie, junto de Thomas e, no outro, a própria moça. O espaço era tão escasso que pouco além das camas antigas de colchões finos cabiam no mesmo, mas isto não incomodava Marie, que em realidade não possuía muito mais para colocar ali.
A mobília da família havia permanecido na casa que fora tomada, bem como praticamente todo o restante, salvando-se apenas poucos dos itens mais íntimos.
Quando a moça levou uma das mãos a tocarem a maçaneta do quarto, Thomas a deteve sutilmente.
— Tia Marie, antes de entrarmos, há algo que preciso lhe dizer.
Pelo interior de Marie, uma arrepio reverberou.
O silêncio de Thomas durante o caminho, unido à expressão séria que o rapaz continha faziam-na temer o conteúdo da conversa. Ela sabia que o sobrinho enfrentava problemas com bebidas e apostas, muitas vezes, tudo à exemplo do avô, e temia pelo que poderia ter-lhe deixado de tal forma. De qualquer maneira, entretanto, não desejou sofrer antes da hora, engolindo seco e ofertando-lhe uma expressão serena.
— É claro. — Retirou a mão da maçaneta e colocou-se a ouvi-lo atentamente, enquanto uma prece era realizada em seu interior.
Thomas a observou com certo ressabiamento, tendo permanecido durante todo o tempo que sucedera seu encontro com Nichollas pensando se dar o recado do cavalheiro à tia seria a coisa certa a se fazer. O histórico da família, mais precisamente de sua mãe, traziam-lhe a dúvida, conflitante com a simpatia que estranhamente conseguira sentir pela primeira vez em relação à um senhor da corte de sua terra natal. Alguma coisa bastante similar á intuição que o ajudava em seus jogos (na maioria das vezes), entretanto, o fizera sentir que o correto seria falar. Ao menos assim, esperava que ela lhe esclarecesse o necessário, para que as incômodas dúvidas afastassem-se de seus pensametos. Marie não lhe negaria em responder o que desejava, sua tia sempre fora tão correta...
— Conheci Lorde Nichollas Batterfield esta tarde. — Os lábios de Marie ficaram imediatamente pálidos, e o sorriso gentil, que na maioria das vezes lhe permeava a face de modo natural, esmaeceu. — Disse-me que não pretendia retardá-la ainda mais hoje, mas que pretende encontrá-la amanhã, para resolverem os assuntos que possuem pendentes. Me pediu que lhe entregasse isto. — Tirou do bolso do casaco um pequeno pedaço de papel, dobrado ao meio. — Trata-se de um endereço.
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A Mensagem dos Cravos [DEGUSTAÇÃO]
Ficção HistóricaSINOPSE De acordo com o conhecimento popular, os cravos eram tidos como sinônimo de boa sorte. Nichollas sentiu-se o homem mais abençoado do mundo, ao poder comprovar esta sorte. Ela trazia a referida flor em suas mãos, na primeira vez em que a bei...