CAPÍTULO III - AS NOTÍCIAS SEMPRE CORREM

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Marie ainda tinha as pálpebras inchadas das lágrimas que derramou durante a madrugada, abafando-as no travesseiro para que ninguém escutasse.

Não sabia sequer ao certo por qual motivo chorou, na verdade acreditava que fosse por conta de uma somatória de fatores, e todos eles culminaram no dia anterior, no fatídico momento na taberna, sendo coroado pela infeliz fala de Lorde Nichollas no instante seguinte.

Seu cretino coração insistia em apegar-se a ele, mas a todo momento sua mente a lembrava quem Nichollas era e qual o seu lugar na sociedade.

Marie não podia simplesmente dar-se ao luxo de vivenciar uma paixão, feito as tolas heroínas dos livros que lia quando ainda era preceptora e possuía mais tempo disponível para investir em passatempos leves. E mais do que isso, não podia repetir os erros que desgraçaram sua irmã.

Pensou que havia deixado todos aqueles embaraços para trás ao mudar-se para França, porém ali estava o homem que fez crescer sentimentos novos dentro de si, desencadeando-os novamente numa torrente irrefreável.

Mas não restava mais tempo para divagações, a vida não permitia que ela chorasse por mais do que uma madrugada.

Alcançou a horrenda touca branca e desceu as escadas, que estalavam a cada passo dado, como se estivessem prestes a ruir sob os pés.

Mademoiselle Turner — chamou a voz da proprietária da pensão "Fleur-de-Lys".

Seria melhor se o chão tivesse realmente ruído.

— Madame Deverrot. — Esforçou-se para dar um sorriso.

— Um messieur inglês perguntou por seu nome ontem. Não vi a mademoiselle chegando, por isso não comentei antes.

Marie sabia que a mulher adorava mexericos, portanto não quis dar-lhe informações demasiadas.

— Trabalhei até tarde. — Tanto para compensar a confusão, quanto para conseguir reunir algumas moedas a mais.

— Ah, isto é ótimo, assim poderá quitar os atrasos.

Marie inspirou fundo, as dividas se acumulavam muito mais rápido do que ela podia liquidá-las, tornando esse cálculo sempre negativo.

— Madame Deverrot, sei que estou em débito e agradeço a compreensão, peço somente que aguarde por mais alguns dias. Tudo será pago conforme o combinado.

— Perfeito — falou com aquela maneira característica de esticar a letra "r".

Marie fez um gesto curto com a cabeça e direcionou-se a porta, o sol incidiu diretamente sobre os olhos quando saiu, lhe causando uma característica confusão de quando se passa bruscamente de um ambiente escuro para um claro demais.

Piscou algumas vezes, afastando o atordoamento, quando voltou a enxergar pode ver formar-se diante de si a figura de um homem.

Nichollas.

Isso foi o suficiente para fazer seu coração acelerar, tanto pelo desespero de vê-lo ali quanto pela afeição que ela não podia permitir que florescesse, mas que insistia em criar novos brotos apesar dela podá-los com frequência.

— Marie...

Nichollas deu um passo na direção dela, que retrocedeu de costas, tocando com a mão trêmula, a maçaneta da porta ao qual havia acabado de transpor. Não soube de que forma conseguiu girá-la, mas com ajuda de uma benevolência divina, o fez, vendo-se segura dentro da pensão. Uma falsa segurança, Marie sabia.

— Por Deus, acaso viu algum fantasma? — Fleur perguntou com um bico.

Ah sim, um fantasma do passado, porém este era bem tangível, de carne, osso e um belo par de olhos azuis.

A Mensagem dos Cravos [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora