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O corpo de Althon foi sugado para cima e para baixo ferozmente até surgir em um local que não sabia se de fato estava em sua cidade ou em que ano seria. Era noite, mas a cidade não escurecia devido a infinitude de luzes multicoloridas, hologramas extravagantes, logogramas chineses estavam estampados em diversos prédios, banners e torres de comunicação. Os olhos do doutor demoraram para se acostumar com aquela intensidade de brilho. Mas não havia tempo para apreciação. Os gritos de pavor estavam em todo lugar. Carros batidos. Vândalos saqueavam uma loja ao lado. Uma criança chorava em busca de sua mãe. Tiros podiam ser ouvidos a algumas quadras dali. As pessoas corriam para lá e para cá sem destino. As ruas estavam abarrotadas delas. O caos predominava.

— O que está acontecendo? — perguntou sem resposta para um senhor que corria em desespero. — Ei, você! Espere um pouco. Não vou machucá-la. Espere... — tentou novamente sem resposta para uma adolescente com um cabelo roxo.

Althon caminhou apressado em direção ao grupo, mas uma explosão próxima fez com que dispersassem. Então, centenas de indivíduos surgiram correndo em direção única. Como se fugissem de algo. O doutor seguiu aquelas pessoas em manada.

— O que houve? — arriscou a perguntar a um homem que corria com seu filho no colo.

— A nave está indo embora.

— O que está acontecendo?

— Como assim o que está acontecendo? Se não chegarmos a tempo, já era. Vamos morrer. Tudo por conta dessa merda de escavação lunar...

Uma nova explosão, desta vez ainda mais perto, fez com que Althon fosse jogado ao chão. Imediatamente se recolheu em estado fetal após ser pisoteado por alguns. Ficou naquela posição até que não pode mais ouvir passos. Levantou-se. Uma dor aguda na costela. Sabia que não era grave, mas, mesmo assim, era uma dor. Então, notou de relance a nave desaparecendo no céu avermelhado. Seu coração gelou. Tremeu. Retirou rapidamente as ampolas e se aplicou grosseiramente. Precisava sair o mais rápido possível daquele inferno. Seus olhos não acreditavam no que via. Antes de desaparecer, fitou novamente a Lua despedaçada invadindo a atmosfera terrestre.

Silêncio. Escuridão total. Sabia que, pelo gosto metálico na boca, estava novamente dentro do Big Bang. Aliviou-se e respirou fundo. Tateou a parede gélida até encontrar a manivela que dava acesso ao exterior. Fez um leve esforço para girá-la e nada. Tentou de novo. Nada. E de novo, só que, desta vez, com toda força que seu corpo pudesse depositar, mas a manivela não se movera um milímetro. Seria cansaço? Quantas horas havia ficado acordado? Quantos dias havia se passado? Não saberia dizer. Tentou por diversas vezes até sua força diminuir. Mesmo exausto sabia que conseguiria facilmente abrir aquele portão, mas algo estava atrapalhando sua coordenação motora. Quando se deu conta, percebeu que estava inalando alguma substância que fazia seu corpo afrouxar-se. Recostou como pode em um canto qualquer. Seu corpo foi relaxando e seus olhos, pesando. O ambiente estava propício. Por fim, tombou desacordado.

— Tire-o daí e o limpem. — disse uma voz conhecida em tom de soberania.

A claridade do portão machucava os olhos de tamanha intensidade. Althon tentou enxergar mais sua visão estava embasada demais. Sentiu algumas mãos o segurar e o colocar em uma maca. Tentou se mexer, mas fivelas foram presas quase que imediatamente.

— Me tirem daqui. — gritou em vão — Quem são vocês? O que querem de mim? Me solte! Me... — tudo ao redor voltou a girar e então apagou novamente.

A escuridão predominava. O silêncio ensurdecedor. Então, aos poucos, foi recobrando a força. A garganta ansiava por algum líquido. Olhou para os lados, mas não conseguia enxergar nada. Sabia que não estava sozinho devido a várias respirações e roncos por todo os lados. Uma dor latente surgiu em seu braço esquerdo. Tateou. Seu corpo se contorceu ao toque. Então, pequenos relapsos surgiram daquele momento. Primeiro lembrou de cortarem suas vestes deixando-o nu. Depois, raspando sua cabeça e, por fim, antes de desmaiar mais uma vez, sentiu um forte cheiro de carne assada e o número 44305 escarificado em seu braço.

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