Jasper
Três anos antes...
Sorrio para o casal recém noivos na minha frente e agradeço a Deus por mais um dia, Luiz o meirinho que trabalha comigo desde que me lembro acompanha as pessoas para fora do tribunal. Meus olhos percorrem o espaço uma última vez antes de levantar e sair.
Confiro a hora no relógio de pulso e solto um suspiro exasperado, estou atrasado dez minutos para o almoço com a minha esposa. O que para ela significa que estou atrasado umas duas horas, Cíntia adora aumentar o tempo e falar sem parar sobre como estou sempre atrasado para os compromissos que ela arruma em cima da hora.
Cíntia e eu somos casados a mais de dez anos, vamos completar dezesseis daqui algumas semanas e tenho preparado a minha agenda a meses para poder sair em uma viagem com ela. Faz tempo que não saímos como casal, não por minha culpa, apesar de ter a agenda sempre cheia, mas porque ela está sempre ocupada com os seus compromissos que não tem tempo para nós dois.
Enquanto Otto dirige pela cidade até o restaurante em que vamos almoçar penso em nós em todo. Cíntia foi uma luz na minha vida, era sempre divertida e encantadora. Conhecê-la na faculdade foi como ganhar na loteria, mas nos últimos meses parece que ficar na minha companhia tem sido um fardo para ela.
Toda vez que penso que vamos ter um tempo para namorar, conversar sobre os nossos planos para o futuro ou ter filhos, ela acaba encontrando algo para fazer ou uma desculpa para mudar de assunto. A nossas vidas andam tão afastadas ultimamente que a última vez que vi a minha esposa foi no começo da semana.
Eu preparei um jantar romântico para ela, estava pronto para tentar conversar mais uma vez sobre adicionar um bebê na nossa vida, mas a mulher demorou tanto para chegar que acabei desistindo de esperar. Não sou um homem tão jovem assim e se demorar um pouco mais nunca teremos filhos, o que para mim é uma coisa impossível de se pensar. Eu sempre quis filhos, pensei que esse fosse o desejo da Cíntia também quando nos casamos, mas agora já não tenho tanta certeza.
Otto estaciona o carro em frente ao restaurante cinco estrelas e desce para abrir a minha porta, guardo os papéis que estava em minhas mãos dentro da pasta outra vez e saio.
- Tenha um bom almoço Excelência. – Deseja ele com um aceno de cabeça.
- Você também Otto, aproveite para visitar a sua filha enquanto isso. – Respondo e ganho um aceno positivo de cabeça.
Otto volta para dentro do carro e arranca um minuto depois, ele tem uma hora e meia para almoçar, espero que saiba aproveitar esse tempo ao lado da pequena Lili, sua filha de três anos e uma gracinha de menina.
Avanço para dentro do restaurante e sou cumprimentado ao longo do caminho. Distribuo sorrisos gentis a alguns e uma carranca para outros até ser recebido pela hostes.
- Juiz Hemingway seja bem-vindo Excelência. – Cumprimenta a moça com um sorriso cordial – sua esposa já está esperando pelo Senhor, siga-me por favor. – Pede ela educadamente.
Não preciso dar muitos passos pelo salão para encontrar a cara de desagrado da Cíntia, ela está fumegando e batucando os dedos em cima da mesa. Abro meu maior sorriso e ela revira os olhos insatisfeita para mim.
- Você está atrasado. – Resmunga ela.
- É um prazer vê-la também querida. Você está linda – Elogio tocando seus lábios gentilmente com os meus – já pediu? – Pergunto tomando meu lugar em frente a ela.
- Na verdade já almocei – responde ela fazendo a minha testa se franzir – você demorou. – Justifica.
- Foram dez minutos Cíntia – sussurro frustrado – poderia ter esperado por mim ou então mandado uma mensagem. – Sugiro.
- Para ouvir as desculpas usais de sempre? – Pergunta ela bebericando o seu vinho.
- Que desculpas usuais? – Pergunto e continuo sem deixá-la responder – sempre atendo os seus pedidos e nunca faltei em um encontro com você. – Murmuro.
- Está esperando um tapinha de bom menino por isso? – Pergunta com um revirar de olhos.
- Na verdade um pouco de reconhecimento seria bom – Digo a ela com um suspiro – você sabe que em algumas semanas vamos completar dezesseis anos de casados e estava pensando em viajar com você. – Murmuro trocando de assunto.
- Oh, eu tenho compromissos na próxima semana. – Diz ela batendo a unha no queixo – talvez devêssemos deixar para o próximo ano.
- Tudo bem – relevo tentando disfarçar a pontada de dor no meu peito, apesar de tudo ainda desejo a sua companhia – Então que tal aproveitarmos a oportunidade para falar sobre aquele assunto inacabado. – Sugiro com um sorrio.
- Que assunto? – pergunta ela conferindo a hora no celular em cima da mesa sem me dar muita atenção.
- Aquele sobre um pequeno Hemingway correndo pela casa. – Murmuro e ela finalmente encontra o meu olhar
- Ah sim esse assunto – Resmunga com indiferença – pensei que já tivéssemos falado sobre isso, uma criança seria responsabilidade demais no momento. – Fala com um aceno de mão.
- Momento? – Pergunto ela acena que sim – Cíntia eu não sei se você parou para prestar atenção, mas eu tenho quarenta anos querida e você não está tão longe dessa meta também. Se esperamos mais vamos perder a nossa chance. – Murmuro olhando para ela com expectativa.
- Melhor ainda, não teremos choro de madrugada e nem noites em claro por causa de cólicas. Não vamos gastar dinheiro com uma babá e nem mesmo com colégios internos. – Divaga sem parar.
Enquanto ouço a Cíntia falar sem parar sobre os contras de ter um filho, penso comigo mesmo que tudo isso que ela acha ser uma coisa ruim, para mim seria o paraíso. Eu quero filhos, sempre quis, mais de um até.
Eu estou pronto para sossegar, diminuir minha carga de trabalho e dedicar a minha atenção em paparicar a minha esposa enquanto ela espera o nosso primeiro filho. Mas a Cíntia parece não querer as mesmas coisas que eu, na verdade já faz um tempo que não desejamos as mesmas coisas.
- Então deixe-me ver se entendi direito – peço interrompendo sua enxurrada de palavras – você está dizendo que não quer ter um filho comigo? – Pergunto somente para ter certeza.
- Exatamente, talvez a gente possa ter um cachorrinho ao invés disso. Mas é claro que você teria que cuidar dele porque minha agenda está lotada de compromissos e eu ainda tenho chás durante a tarde...
- É só com isso que você se importa? – Pergunto interrompendo suas palavras mais uma vez – Desde quando você é uma pessoa tão fútil? – Pergunto com uma carranca.
- Hora não seja tão antiquado Jasper, são apenas escolhas de vida e você deveria se acostumar com elas já que vamos ficar juntos pelo resto da nossa vida, não é você que vive quebrando regras? – Pergunta ela petulante.
- Tem razão, eu vivo quebrando regras por isso vou quebrar mais uma. – Murmuro e ela acena feliz, mas minhas próximas palavras a fazem perder o sorriso na hora – eu quero o divórcio Cíntia.
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Sua Excelência - Série "Café da Gloria" vol 1 (Degustação)
Literatura FemininaJasper Isaac Hemingway terceiro é um homem fora do comum, sua vida é guiada por uma única regra "Carpem dien". Jasper conhece como ninguém as voltas que a vida dá, depois de sofrer um atentado logo no início de sua carreira ele decide aproveitar cad...