vamos a mais um capítulo!
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Ela precisa ter certeza do que o "tudo bem" dele significa. Por isso, pega a caneta na mesa e escreve na prova "farei outra?". Percebe o sorriso do professor antes de pegar a caneta e escrever "você já tem dois pontos!".
Suspira e acena, pela milésima vez, aceitando. Aponta para a porta e o professor confirma com um sorriso, Tina aproveita para sair da sala de uma vez, não sem antes olhar para a professora que está com os braços cruzados, a olhando séria.
— Desculpe — diz e sai.
O professor mais rígido a deu dois pontos. Deu porque ela é surda. Deu porque não se importa com o crescimento dela. Deu porque não acredita que ela tem futuro.
Se não, ele teria mandando-a sentar ou, ao menos, a deixado ir para o banheiro, se fosse verdade.
No entanto, Val não gosta de pensar muito sobre esses acontecimentos. Usa o "privilégio" da culpa e pena alheia poucas vezes em sua vida. Não se orgulha disso, tampouco se envergonha. Um sentimento complexo.
Sala quatro. Repete mentalmente e desce os degraus. Não falta muito para o intervalo e os corredores se tornaram um inferno, por isso adianta. Esperará por ele no corredor, próximo a algum banheiro, para não parecer que está filando — se algum professor aparecer.
Sabe que ele não terá como reconhecê-la, mas já combinaram que o amigo dele o fará.
Ela não sabe ao certo porque o encontrará. Tentar conversar? Tentar passar algum tempo juntos? Mas por quê? Qual a razão? Não encontra. Deveria deixá-lo de lado, deveria encontrá-lo apenas no centro. No entanto, algo em seu peito a impede de ir embora, a impede de desistir de encontrá-lo.
Se distrai mexendo em seu celular enquanto os minutos passam. Percebe a mensagem de Alan.
Nem vi que você saiu da sala... Algum problema ou desculpa?
Suspira, sabe que se ele está mexendo em seu celular e ainda não é o intervalo, é porque está pescando.
Inventei uma desculpa.
Não demora muito para receber a resposta.
Sou seu fãn!
Ela encara aquela última palavra por longos segundos. É impressionante como até mesmo ela, que nunca ouviu aquela palavra, sabe que não se escreve daquela maneira. Há vários problemas dentro do erro de ortografia de Alan.
Valentina não é uma pessoa de pontuar as coisas, mas, felizmente, eu sou. Vamos aos pontos!
1. Alan vem de uma boa educação e boa família;
2. Alan fala, portanto, ouve;
3. Alan diz que sabe falar inglês;
4. Fã é a grafia em português;
5. Fan em inglês;
6. Fãn é loucura;
7. Mário Quintana está certo e
8. Valentina está triste.
Há muito tempo, Val encontrou na internet uma frase de Mário Quintana que dizia "O verdadeiro analfabeto é aquele que sabe ler, mas não lê". Uma verdade gigantesca. O que a entristece é o fato de saber que pessoas como Alan — mesmo as que não vieram de boa família, mas são "normais" ou ditos como "perfeitos" — têm mais atenção e possibilidades que alguém como ela... A questão é que: ele nem tenta, nem se esforça para ser um pouco melhor nos estudos! É como se o mundo já fosse dele e ele não precisasse saber como escrever "fã", mesmo quando seu corretor automático o corrija para qualquer outra maneira que não seja a de duas letras e acento circunflexo.
— Valentina? — Ela não ouve, é claro, quando uma pessoa se aproxima, falando. Percebendo seu deslize, a toca cuidadosamente no ombro, chamando sua atenção. Quando seus olhos estão no menino negro à sua direita, ele sorri. — Valentina?
— Quem é você? — pergunta em libras o que o faz franzir o cenho.
Antes de ter tempo para raciocinar, vê Ethan ao lado do menino. Val engole em seco e acessa o mecanismo de tradução em seu celular.
— Ela está aqui? — Lê os lábios de Ethan enquanto ele se vira para o outro menino.
— Está, é ela.
— Oi, Ethan e amigo de Ethan — a voz mecânica é acionada.
— Oi — os dois meninos falam em libras e ela ri. Não é nada mais do que fechar todos os dedos e deixar apenas o mindinho levantando enquanto dá uma volta em um círculo no ar, como se realmente desenhasse a letra 'o'.
Ela não dirá, mas eu posso dizer: é uma cena fofa.
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Incompatíveis
Teen FictionValentina lia letras de músicas; Ethan as ouvia. Ela lia livros; ele os sentia. Ela lia legendas de filmes; ele os ouvia dublado. Seria apenas um casual distinto, mas era além disso. Ela não podia ouvir. Ele, não podia ver.