A face esquerda do meu rosto ardia.
Meu pai estava parado bem na minha frente com os olhos arregalados. A coloração rosa do sangue sob a pele da palma da sua mão direita começava a voltar ao normal.
Eu tinha medo do meu pai quando ele ficava zangado ou chateado — embora não fosse muito comum isso acontecer, mesmo quando fazíamos (Jonathan ou eu) algo de errado. Ele não nos batia. Era totalmente contra as medidas agressivas para punir os filhos. Ações violentas faziam ele sentir como se estivesse agindo como seu próprio pai, o vovô, George. Meu pai nos contava (quando estava prestes a nos dar uma surra) como o vovô batia nele, que ele o obrigava a tirar toda a roupa e o golpeava com um cinto de couro. Papai tinha marcas na altura do abdômen e nas costas para nos provar a veracidade de suas histórias. Então, para nos fazer sentir culpados e sortudos por não levarmos uma surra como ele, papai nos mostrava suas cicatrizes e nos relembrava o terror que vivera na infância. Após ouvi-lo, e refletir sobre o meu comportamento, eu começava a chorar. Depois ele nos mandava ir para o quarto.
Mas eu não estava chorando. Não ali. Não depois do que tinha visto.
Por outro lado, os olhos do papai estavam marejados e vermelhos, como se a qualquer minuto fosse começar a chorar como uma criança ao tirarem o seu brinquedo. Porém, vê-lo chorar também não era comum, nem quando ele se cortava ou batia em algum móvel sem querer.
Talvez ele se sentisse culpado por ter me batido pela primeira vez; talvez se sentisse envergonhado pelo que estava fazendo com sua secretária no escritório da loja de materiais de construção e por ter sido pego; ou sentia-se preocupado com o que poderia acontecer caso eu contasse para a mamãe o que eu tinha visto naquela tarde.
"Por quê não leva o Charles junto com você?", disse minha mãe para o papai enquanto tomamos café da manhã.
Eu comia meu cereal em flocos favorito, Froot Loops, em uma tigela de porcelana, enquanto ouvia a sútil discussão matinal.
Aos sábados eu costumava acordar bem cedinho para assistir os desenhos animados na American Broadcasting Company. Minha mãe estava sentada à mesa da cozinha de frente para o papai, que tomava apenas uma xícara de café preto, sem açúcar. Jonathan ainda dormia (ele acordava depois das 8h:00 nos fins de semana — nas férias de verão depois das 10h:00).
Naquela manhã, quando desci para o primeiro andar e vi o papai sentado à mesa da cozinha, deixei de lado a vontade de assistir Super Amigos e corri até ele; disse bom dia, o abracei e ele retribui com um leve sorriso, agitando a mão sobre o meu cabelo.
Mamãe me deu um beijo sobre a cabeça quando sentei na cadeira ao lado do papai, colocou a tigela de cereais e uma garrafa de leite sobre a mesa e se sentou de frente para ele.
"Tenho certeza que o Charles adoraria passar a tarde com o papai, não é, querido?", minha mãe tinha um sorriso estranho no rosto como se estivesse com dor, porém feliz — se é que isso fazia algum sentido.
Olhei para o meu pai. Eu queria ir com ele, embora não soubesse exatamente para onde. Já fazia algum tempo que não tínhamos um momento só nosso; seria bom ter uma aventura pai e filho estilo Jon Baker e Frank Poncherello. No entanto, ele não parecia muito empolgado com a sugestão da mamãe.
Fiquei calado, mergulhando silenciosamente a colher na tigela de cereal.
"Eu tenho muitas coisas para resolver, Haley", disse meu pai. "Hoje à tarde tenho uma reunião importante com os donos da construtora Hoodkroft, responsável pela barragem Widham. Eles irão analisar a nossa proposta juntamente com a Hampstead & Barllet. É um contrato importante e você sabe.
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ANTES DO ETERNO AGORA
Любовные романыManter-se afastado dos holofotes promove uma frágil e reconfortante segurança. No entanto, sempre chega o momento em que devemos assumir o papel principal de nossa história e emergir a luz de nossa própria jornada; a luta pela autodescoberta se inic...