Capítulo 1

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O primeiro passo para mudar o mundo é nunca se acostumar com o que existe de errado.

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Era o início de mais um dia e o calor já era quase insuportável.
Sharaene acordou alarmada temendo já estar atrasada, rapidamente olhou aflita em direção a sua mãe, precisava se certificar de que ela ainda respirava, fazia isso todas as manhãs, suspirou aliviada ao perceber que ela ainda estava viva. A aparência de sua genitora estava a cada dia mais abatida, sua pele morena se encontrava demasiadamente pálida e olheiras profundas contornavam seus olhos. Ela possuía uma doença grave a qual desconheciam, porém sabiam que ela só poderia ser tratada na classe Potissimum, o que somente diminuía suas chances de vida. Com um leve beijo na testa dela para não despertá-la, Sharaene se despediu com um aperto no coração, desejando ainda a encontrar viva na volta.

Rapidamente colocou seu uniforme laranja com listras negras, uma roupa a qual odiava, porém não tinha o direito de reclamar. Quando encarou a porta caindo aos pedaços suspirou, "Tudo o que fazemos é justo. Sejam gratos." Aquela frase era escrita em todas as moradias, uma lembrança do governo para que não discordassem de suas ações. Deu uma risada ao ler novamente, não importava quantas vezes lesse, nunca acreditaria.

Ao sair para fora os raios de sol escaldantes atingiram sua pele, o sol já nascia causando um extremo calor todos os dias, apesar dos anos vivendo nessa situação, não conseguia se acostumar.

Já se preparava para andar apressadamente até seu emprego, porém algo no cenário a frente da sua casa chamou sua atenção e o que viu fez seu coração se apertar. Sua vizinha, a senhora Antonela, estava sendo enterrada ao lado de sua própria casa. Provavelmente havia falecido pela noite. Era assim ali, não existiam velórios nem nada do tipo, não existiam cemitérios nem enterros dignos, os mortos não eram respeitados, aliás nem os vivos eram.

Quando o filho caçula da senhora a encarou, uma criança que não deveria ter mais de dez anos, ela sussurrou um "meus pêsames". Nunca gostou dessa frase, ela nunca diminuía a dor da perda, mas eram as únicas palavras que podia falar naquele momento. O menino não respondeu ou teve qualquer atitude, continuou somente a encarar como se estivesse em transe.

Mortes eram constantes, a estimativa de vida dos que moravam na classe Inferius não passava de 45 anos, principalmente na parte em que ela habitava. Os que tinham mais que isso era pura sorte e a senhora Antonela era uma das contempladas com essa dádiva. Gostava da vizinha, era uma pessoa muito doce e que tinha 14 filhos, não gostava nem de imaginar o que seria de seus filhos agora, o pai já havia falecido há algumas semanas, estariam sozinhos no mundo.

A classe Inferius era dividida em duas partes. A primeira se limitava aos que tiveram a sorte de conseguir emprego e moradia próximas as fábricas sofisticadas onde eram produzido os alimentos e área de criação de animais usados para alimentação dos moradores de Potissimum. A segunda a qual ela pertencia era para os mais pobres que somente conseguiam emprego em galpões empacotando os alimentos mais simples e se tiverem sorte em áreas de cuidado de animais que não serviam para alimentação.

O caminho até o galpão em que trabalhava era grande, não possuíam nenhum tipo de meio de transporte por ali. Não existiam mais ruas demarcadas, todo o chão era coberto por pedras e areia, as casas eram espalhadas por todos os cantos, amontoadas umas nas outras o que acabava trazendo dificuldade no caminho. Todos as moradias eram simples, feitas de uma espécie de madeira sintética fina. As casas eram iguais, possuíam somente um cômodo com uma pequena divisória feita com panos onde usavam como banheiro. Na maioria das vezes que acontecia um vendaval ou por sorte chovia eram destruídas, ninguém tinha dinheiro suficiente para construir casas fortes e com bons materiais.

SOBREVIVA ATÉ O SOL NASCER [CONCLUÍDA/ EM REVISÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora