•|Prólogo|•

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O deslizar do tecido tênue incomodava o tato.

Observei-o enquanto traçava uma linha silenciosa por minha extensão corporal, escorregando até enfim encontrar o piso frio de porcelanato.

Voltando os olhos para o espelho à minha frente, contemplei a visão do homem que havia me tornado.

Oh, uma espinha.

Minhas mãos pressionavam o granito frio que compunha a pia com força exacerbada, os nós dos dedos tornaram-se brancos: uma expressão clara do nervosismo intermitente que me perseguia há noites.

O arrependimento era uma cogitação que meu subconsciente insistia em trazer à tona, eu sabia que era uma missão arriscada mas ainda assim decidi tomar a iniciativa e aceitar todas as consequências possíveis por causa de um orgulho sujo e mesquinho que eu costumava sustentar.

Batidas na porta trouxeram um arrepio passageiro, um alerta sobre minha possível demora. Afastei os pensamentos e voltei à neutralidade que havia sido treinado desde o início, pondo-me a vestir o conjunto de roupas simples que me foram dadas.

Recolhi as outras peças do chão e vesti as pantufas de algodão antes de sair do banheiro e andar pelos corredores largos e tóxicos do laboratório. A sensação doentia de ver tudo em movimento, todas as coisas -e pessoas- quase que completamente brancas era uma percepção indescritível, enervante, ainda que eu tenha passado por situações piores no exército.

- Vejo que o senhor vestiu as roupas novas! -disse a secretária que havia me guiado até o banheiro anteriormente, entrando em meu campo de visão.

- Lhe cai bem. -complementou, dessa vez o tom de flerte em sua voz era explícito.

- Obrigado. -eu respondi curto, demonstrando o quão desinteressado eu estava sobre sua opinião.

- Ahm... É a última porta. -ela disse gesticulando em direção à placa onde leia-se área restrita- Boa sorte.

Agradeci escondendo as mãos nos bolsos, ou tentando já que a calça não os tinha. Eu observava atônito, parado no corredor, quando a porta foi aberta e convidaram-me a entrar na sala.

Os técnicos de informática checavam cada parte do equipamento em funcionamento enquanto os matemáticos calculavam a margem de erro e os cientistas estudavam as possibilidades de qualquer alteração intrínseca que pudesse comprometer o experimento.

- Este é Jeon Jungkook, nosso pioneiro!

Pra não dizer cobaia.

Haeun, doutora chefe de pesquisa, introduziu-me com um sorriso orgulhoso e sons de palmas preencheram o local. O que abafou as vozes e sonidos mecânicos provenientes da gama de computadores acumulados no canto esquerdo da sala.

Fiz uma pequena reverência e caminhei em direção à máquina desconhecida quando a doutora movimentou as mãos sugerindo que eu o fizesse.

Assemelhava-se a um aparelho de ressonância magnética porém aparentava ser mais confortável, o que comprovei ao sentar sobre o colchão macio que havia sobre a parte móvel.

- Essa bala aqui -a cientista colocou uma bolinha esverdeada sobre a palma da minha mão- você só vai comê-la quando fecharmos o tubo e iniciarmos o experimento. Caso esteja se perguntando, ela reduz os movimentos peristálticos gradativamente assim como os batimentos cardíacos. Precauções!

Assenti com um movimento de cabeça e deitei sobre o estofado coberto pelo tecido fino esticando os pés. Senti uma movimentação estranha abaixo de mim e constatei que a maca era corrediça, arrastando-me para dentro do grande tubo que uma vez possuindo todos meus membros dentro teve sua porta fechada.

- Mastigue a bala até que ela derreta por completo. Mantenha a respiração calma e controlada. -fiz conforme instruído e senti meu corpo amolecer imediatamente.

Um microfone portátil foi ligado e após o teste um discurso proferido pelo professor Kim TaeHwan -como ele mesmo havia se apresentado- foi transmitido aparentemente em uma rede de escala internacional.

Dizia-se que viagens no tempo eram impossíveis, utópicas. Mesmo quando cientistas excepcionais como Einstein e Hawking provaram com argumentos físicos que com uma tecnologia adequada seria possível.

Hoje eu e minha equipe estamos aqui para provar após anos de pesquisa e desenvolvimento que uma viagem espaço-temporal não é uma utopia, mas sim real e atingível.

A partir da dilatação do tempo pela velocidade, tem início hoje, dia vinte e cinco de setembro de dois mil e cinquenta, o experimento Time skip: um salto para a humanidade.

- Caso dê certo, -uma voz diferente disse agora ressoando por dentro do cilindro- o prazo estipulado para que você volte é daqui há mais ou menos um mês.

- E como vou voltar se eu for para o passado ou alguma forma de realidade alternativa que não possua tecnologia?

Na realidade, eu estava impressionado sobre eles conseguirem me ouvir do lado de fora quando eu mesmo não conseguia escutar minha própria voz por causa da sonorização interna.

- Se você sobreviver, da mesma forma que veio. A máquina possui um rádio acoplado e quando o mesmo piscar, significa que o equipamento entrará em curto em torno de trinta minutos. Que seria o tempo ideal para você voltar à máquina.

Um solavanco puxou-me para baixo e eu pude sentir as extremidades do cilindro conectarem-se a uma estrutura aparentemente maior e de ferro ao julgar pelo som. As vibrações constantes deram origem a uma turbulência que indicou uma possível movimentação futura.

E em questão de segundos me tornei um viajante do tempo.

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