Seu Zé

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Antes de encontrar a paz no lar acolhedor do Seu Zé e Dona Geralda, passei por outro inferno. Morei com minha "vovó" por longos e penosos 4 anos, dos quais lembro em detalhes de cada tortura física e psicológica que aquela mulher me fez passar.

Ela era cruel! Tínhamos pouca comida na mesa. Vovó gastava o pouco dinheiro que tínhamos com bebida e cigarro. As surras eram diárias e por qualquer motivo, mas se bebia, a situação piorava. Uma das torturas favoritas de "vovó" era me queimar com cigarro.

O fim da nossa relação aconteceu quando ela tentou me prostituir aos 14 anos. Na sua cabeça doentia, eu precisava trabalhar e trazer dinheiro para casa, então, trouxe um velho para casa e disse que ele podia fazer o que quisesse comigo.

Ele pagou 500 reais pela minha virgindade. O ato não foi consumado, esfaqueei o filh* da p*ta no ombro. Escondia uma faca embaixo do travesseiro, na realidade, meu objetivo era acertar aquela velha por "acidente", caso ela me atacasse de madrugada. 

Consegui fugir, enquanto o velho gritava de dor e a "vovó" gastava o "dinheiro extra" em algum bar. Novamente, entrei no Bar do Seu Zé suja de sangue, a expressão dele foi de preocupação. Ele sabia o que acontecia comigo, mas até aquele momento, suas tentativas de me ajudar não tinham dado certo. 

Tentei narrar entre soluços de um choro desesperador o que aconteceu. Ele não falou nada, apenas saiu e voltou horas depois com meus documentos e poucas roupas em uma mochila velha e rasgada. 

Na época, ele e sua esposa me acolheram até resolver algumas questões. Meses depois, Seu Zé e a esposa conseguiram me adotar legalmente, até hoje não sei como ele conseguiu isso perante a justiça, mas sei como ele convenceu minha "vovó".

Antes de mais nada, Seu Zé não matou ninguém (poderia ter feito, não o julgaria). Levou alguns "amigos" consigo até a casa de "vovó", onde encontrou o velho agonizando no meu quarto. Não houve choro e nem vela, seu Zé o retirou da casa e o ameaçou. Não que importe, mas o velho passa bem. O vi semanas depois andando pela rua com uma tipoia no braço. 

Seu Zé, esperou pacientemente o retorno da bêbada e fez um 'acordo'. Ele me "comprou" por uma mesada mensal e impôs termos, entre eles, que "vovó" não se aproximasse de mim e passasse a guarda para ele e sua esposa. Lógico que ela não pensou duas vezes. 

No dia que tive certeza que Dona Geralda e Seu Zé seriam meus guardiões legais, tive uma crise de choro que durou horas, eles tiveram que me levar para o hospital. Na outra semana, a filha do Seu Zé que era psicóloga instruiu os pais a me levarem para terapia e um psiquiatra, já que minhas crises de choro, insônias, ansiedade e constante falta de animo demonstrava uma possível depressão. 

Foram anos de terapia, remédios tarja preta e técnicas para lidar com o pânico que sentia. Nunca tentei suicido, mas pensei nisso, muito, principalmente quando morava com minha "vovó", mas aprendi que a vida pode mudar e melhorar, basta ter fé e paciência. 

Ter pela primeira vez um lar estável e pessoas preocupadas comigo (além da minha mãe), trouxe uma sensação nova e peculiar, conhecida como PAZ. Mesmo assim, sou uma pessoa quebrada até hoje.

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