Capítulo 1: Invocando a pessoa errada (ou a pessoa errada invocando?)

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O som das gotas de água pingando do teto da caverna pareciam compor uma sinfonia peculiar. Todo o chão tremia, mas as velas acesas apenas ficavam mais fortes. O fogo se agitava a medida que as palavras amaldiçoadas preenchiam as paredes de rocha úmidas, ecoando por todos os corredores escuros mais próximos, e até os mais distantes.

Com uma faca na mão, realizou um pequeno corte no pulso esquerdo e deixou o sangue pingar exatamente em cima da linha do pentagrama invertido desenhado no chão, envolvido por pedras encantadas e crânios de animais antigos, preservados por séculos apenas para aquele momento. As chamas dançavam de acordo com o ritmo e a intensidade do canto entoado pela grossa e grave voz que chamava pelas forças ocultas e esquecidas nos mais antigos livros.

Ao proferir o último termo proibido, a brasa ardeu, subindo em um redemoinho vermelho, e explodiu, evaporando todo o resquício de água nas pedras negras da câmara. Os crânios racharam e rolaram para longe, chutados pelo imenso poder de fogo. O homem permaneceu imóvel enquanto o calor invadia os túneis à sua volta, fazendo os morcegos voarem desesperados para fora da caverna, mas não rápido o suficiente para impedir que fossem desintegrados.

Quando a cera terminou de derreter, o fogo apagou abruptamente, deixando apenas uma nuvem de fumaça escura pairando sobre o pentagrama, que se dissipou aos poucos. O sujeito vestindo preto ajeitou a gravata, com o queixo erguido. Aguardou que a silhueta desnorteada recuperasse seus sentidos e se apresentasse a ele. No entanto, quem lhe apareceu não fora exatamente o que tinha esperado.

Saiu do círculo uma mulher alta, com as pernas compridas um tanto bambas. Seus cabelos negros ondulados caíam desgrenhados sobre seu rosto, mas assim que os arrumou, ele pôde ver seus olhos castanhos poderosos. Tinha estatura firme, pés fincados no chão e olhar atento. Ao ver que estava em ambiente desconhecido, sua mão foi instintivamente procurar pela faca em seu bolso, mas se deteve por um segundo. O que viu diante de si fez seu corpo paralisar.

O homem estufou o peito. Deu dois passos adiante e colocou-se em frente à ela. Em seguida, se apresentou, com sua voz de trovão.

— Seja bem vinda aos meus domínios, mortal.— Apesar de confiante, soava insatisfeito.— Onde está o seu Lorde? Não o vejo ao seu lado.

— É o quê? — perguntou um pouco alto demais, com os dedos na ponta da lâmina, preparada para qualquer movimento brusco daquele ser estranho nem um pouco simpático.

— É óbvio que o grande guerreiro Asta deve ter-lhe enviado — explicou, impaciente. — Não tente perder o meu tempo com mentiras. Onde ele está?

— Olha moço, eu não sei que, você é... — Ela levantou uma das mãos em sinal de inocência e chegou para trás — mas se você não me explicar isso direito, eu vou começar a assumir algumas coisas ruins ao seu respeito.

— Oh, mas é claro! — ele exclamou, parecendo se lembrar de algo importante. — Que indelicado da minha parte. Permita-me me apresentar. Sou Lorde Demogorgon Stakriseligos Corsonleguilas Baphometuras Lanthaern, o Senhor do Nono Círculo dos Infernos, Governante Supremo das Terras Vermelhas e das Trezentas tropas do Atlântico.

A mulher cruzou os braços e encarou bem aquele sujeito. O desconhecido vestia um terno preto, perfeitamente liso e sem nenhuma dobra irregular, como se tivesse acabado de sair da loja, sapatos brilhantes e gravata apropriadamente amarrada. Vestia luvas escuras e, no lugar da cabeça, havia um crânio humano de prata com adornos em espiral e apenas o vazio no lugar dos olhos.

Olhou para as próprias vestimentas. Nos seus pés, estavam suas pantufas de elefante cor-de-rosa peludas, e vestia uma camisola um pouco transparente. Seu cabelo estava preso em um coque mal feito com algumas mechas soltas, ainda um pouco molhado do banho recém tomado e um creme hidratante que deixava suas bochechas brancas. Na sua coxa, estava um pequeno cinto com uma faca bem afiada. Certamente, não estava usando roupas muito apresentáveis.

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