- Charlotte, acorda! - eu a ouço mas finjo que não o faço - eu sei que você está acordada - ela diz e eu sei que a batalha está perdida. Abro os olhos lentamente e encontro os seus azuis, os lábios em uma linha, sinal de que ela não está feliz.
- Você está atrasada para a escola...
- Mãe, eu posso- eu tento falar, mas ela me interrompe. Talvez pedir para faltar hoje não seja uma boa ideia.
- Nem pensar, levante! - ela quase grita -Agora!
Levanto as mãos em forma de rendição, e murmuro um "OK". Vou para o banheiro e faço toda a higiene matinal, quando termino, desço e encaro a minha família toda reunida à mesa.
- Bom dia - digo, sem entusiasmo. Eu realmente não quero enfrentar aquele colégio hoje. Eles respondem ao meu cumprimento, eu sento e tomo o café silenciosamente.
~•~
- Chegamos, Charlotte - meu pai diz. Eu estou no Ensino Médio, e meus irmãos estão no Ensino Fundamental, então felizmente não estudamos juntos. Me despeço dos que estão no carro e saio.
Ando diretamente para a minha sala. A verdade é que eu não falo com ninguém aqui, só uma garota, chamada Mary, com quem troco conhecimentos de Matemática e Literatura. Me dou conta que vou entrar no segundo horário; então quando entro todos os olhares pousam em mim, sinto minhas bochechas quentes mas as controlo rapidamente. Ignoro, e sento na minha cadeira.
Depois que todos pararam de olhar pra mim e voltaram sua atenção para o professor e o quadro, eu olhei pela sala e procurei pelos gêmeos.
Explicando melhor a história: há gêmeos na minha sala, mas o que iguala é apenas a aparência. Desse jeito até parece que eu conheço eles, mas não, é apenas a minha mania de observação. Eu fico no meu canto e observo tudo o que está acontecendo ao meu redor. E o que eu percebi neles é que um é muito diferente do outro.
Um é popular e o outro não; um é "comunicável" e o outro não (às vezes o comparo comigo); entre outras características. O estranho é que eu nem sei o nome deles, mas conheço suas personalidades.
~•~
Na hora do intervalo eu sento sozinha também, e observo a vida dos outros passar pelos meus olhos. Observo os gêmeos: o "comunicável" está em grupo, rindo e pregando peças , o outro está sentado numa mesa, com uma garota e um garoto. "Até ele tem amigos, Charlotte".
Eu admito que prefiro observar o que fala pouco e não é popular. Os dois são bonitos, sim, mas o que não é popular é mais interessante. Ele parece comigo. Espero que ele não perceba a minha pequena obsessão.
~•~
Chego em casa e me jogo no sofá, mas imediatamente lembro que tenho que lavar louça e fazer o lanche, já que chego antes de todo mundo em casa. Quando termino de fazer as tarefas de casa, como meu lanche e subo para o meu quarto.
Jogo minha mochila no chão, abro meu computador e começo a escrever; estou criando uma história, mais propriamente um romance adolescente, não que eu acredite nessas coisas (no amor). Se meus pais descobrem que eu ando fazendo outra coisa que não seja estudar para ser advogada, eles me matam.
- Char, chegamos! - ouço minha mãe gritar, desligo o computador e o fecho rapidamente. Pego meus livros e cadernos e os espalho pela minha escrivaninha, sento e faço cara de concentrada.
- Char... - ela abre a porta e me espia - está estudando? - eu aceno a cabeça em concordância, e ela fecha a porta. " Foi por pouco ".
~•~
O jantar está espantosamente alegre. Minha irmã, Clarice, conta sobre o seu dia para a minha mãe; Carlos fala com o meu pai sobre algum jogo de futebol que deu empate; e eu... Bem, eu estou comendo em silêncio.
- E você, Char? - o Dr. Marcos, mais conhecido como meu pai, pergunta.
- Eu o quê? - eu falo, surpresa.
- O que você fez hoje? - ele diz, deixando seus talheres na mesa e olhando seriamente pra mim. Estou começando a ficar tensa.
- Eu fiz o mesmo de sempre - respondo - o senhor sabe, ir a escola, lavar louça e estudar - volto a comer.
Ele me encara por um tempo e suspira. Todos estão quietos, meus irmãos voltaram sua atenção para seus pratos e minha mãe nos observa. Minha mãe cutuca meu pai e limpa a garganta, como se estivesse pedindo que ele falasse algo.
- Char, sabia que você pode interagir conosco? - ele pergunta, num tom tão suave que eu até estranho.
- Que? - é só o que eu consigo dizer.
- Nós somos sua família e estamos sentindo sua falta - me surpreendo com a voz da minha mãe.
- Mas eu estou sempre aqui, são vocês que não notam minha presença! - eu digo, irritada. Eles fingem que eu não existo.
- Filha, se chegou a esse ponto a culpa não é só nossa!- meu pai fala dessa vez, e eu tento me acalmar porque minha irmã de 8 anos está me olhando, preocupada.
- Olhem... Eu não peço a atenção de vocês, só quero que não esqueçam que eu ainda sou sua filha - eu falo, olhando para as minhas coxas - eu me acostumei a ser assim; a ficar no meu canto.
- Char... - minha mãe segura minha mão e levanta meu queixo, olhando diretamente nos meus olhos - nós te amamos. Nós só queremos que você volte a ser aquela menina alegre de antes, que fazia piada de tudo e cortava o cabelo do irmão pra fazer "poção polissuco" - eu admito, lembrando de tudo isto, de como eu era antes, lágrimas vieram aos meus olhos.
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My Peace in Hell
RomanceO mundo já não é o mesmo. A vida na pacata cidade de Marsytown mudou. Para todos os cantos, tudo que você pode ver são rostos melancólicos, implorando por socorro. Nota da autora: Essa história surgiu na minha mente através de um sonho, e imediatame...