Quatro estações - chaelisa [HIATUS]

One: winter by Lisa

Tudo começou no inverno.

Ainda consigo me lembrar dos pequenos flocos de neve que caíam do lado de fora naquele dia. Eram brancos e redondos, quase como minúsculas bolinhas de algodão. Lembro-me do cachecol lilás e felpudo que eu usava e do gorro magenta e extremamente chamativo que Jennie — que estava sentada ao meu lado — tinha na cabeça.
A sala estava gelada, e por mais quente que estivesse o aquecedor, a temperatura não parecia aumentar. Sem contar que o lugar onde eu estava sentada era um dos poucos que mal recebia o calor.

Trigonometria nunca fora uma matéria que eu gostasse. Qual o sentido de aprender valores notáveis de ângulos? Seno? Cosseno? Qual a necessidade? A cada aula eu me perguntava quando diabos iria usar aquelas malditas fórmulas se queria ser uma dançarina de sucesso quando fosse mais velha. Por muito tempo, o sapateado era minha primeira e única paixão.

Até ela aparecer.

— Classe, eu quero que conheçam a nossa nova aluna transferida — assustei-me com a voz grave do professor, arriscando erguer o olhar. O homem de meia-idade arrumou os óculos e pigarreou antes de continuar. — Ela veio da Austrália, tenho certeza que irão tratá-la bem, não irão?

A sala toda assentiu. Não era todo dia que recebíamos alunos novos, quanto mais alguém de outro país. Aquela não era uma grande cidade, e a maioria dos alunos que ali estudavam se conhecia desde o jardim de infância. 

Arrumei minha postura e o cachecol, observando atentamente a porta de entrada, ainda fechada.

— Interessante, como você acha que ela deve ser? — percebi que a pergunta fora direcionada a mim, e Jennie, agora virada para o lado, me olhava com expectativa. Certamente estava tão curiosa quanto o resto da classe. Àquela altura, todos cochichavam a respeito da garota nova.

Como eu disse, era uma situação incomum.

— Não sei — respondi simplesmente, voltando minha atenção ao desenho em meu caderno. Aos dezesseis anos, não gostava de deixar meus sentimentos transparecerem, mas a verdade era que eu estava muito curiosa. Qual é! Era raro ver um rosto novo naquele maldito colégio. E mais raro ainda conhecer alguém interessante.

Ao contrário de Jennie, eu não costumava sair da cidade, muito menos ir a festas. Sempre acreditei que minha aparente popularidade era devido ao meu círculo de amizades: a chefe das líderes de torcida, a líder do jornal e a aluna de ouro. Quem poderia pedir mais?
Bem, muitos poderiam, mas eu estava satisfeita vivendo à sombra das minhas amigas. A vida no anonimato não era tão ruim assim.

Jennie inflou as bochechas, pronta para me dar mais um sermão a respeito do sentimento de indiferença com as coisas que eu costumava ter, mas foi interrompida antes mesmo de começar pelo barulho da porta da sala.

A primeira coisa que percebi foram os longos cabelos tingidos de vermelho. Eram chamativos e pareciam ser extremamente sedosos. Por um momento, me perguntei qual seria a textura daqueles fios.

Em seguida, vieram os olhos. Típicos de algum país oriental, muito possivelmente da Coréia, a julgar a partir dos meus conhecimentos de k-pop e a convivência com Jennie e outras amigas, cujas famílias vieram de países do oriente. Talvez tivesse descendência coreana. Ela tinha um ar atrevido, quase como se eu estivesse observando uma criança arteira. O gorro branco combinava com os pares de luvas, ambos tricotados com lã. Usava um sobretudo azul turquesa e exibia um sorriso diferente de todos os outros que já vi: era desafiador. 

— Classe, por favor cumprimentem a senhorita Roseanne Park — anunciou o professor, com a mesma carranca séria. Os vinte e seis alunos disseram "bem-vinda" em uníssono, mas ao invés de responder, a garota limitou-se a sorrir e assentir com a cabeça.