Capítulo I

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Uma abelha entrou pela janela da centenária sala do tribunal de River County, embriagada pelo calor e pelos aromas da morna manhã de abril, enchendo o ambiente com seu zumbido.

Sentado a uma das mesas, esperando que a juíza entrasse, o advogado Dan Sullivan mantinha-se alheio ao ruído do inseto, ouvindo apenas aquele nome que soava sem cessar em sua mente: juíza Susannah Ross.

Folheando distraidamente a pasta de documentos à sua frente, mal tomava conhecimento da presença de seu cliente, na cadeira ao lado, ou de Robert Corwin, o advogado da companhia de seguros, na outra mesa, um oponente respeitável que viera de Los Angeles para representar a firma naquele caso.

Susannah Ross. Tentou tirar o nome do pensamento como fizera durante os últimos dez anos, quando não o pronunciara em voz alta uma única vez. Naquele momento, porém, o nome teimava em torturá-lo com uma insistência de enlouquecer, envolvendo-o em lembranças pungentes de uma felicidade perdida, enchendo-o com as sombras de um velho ressentimento.

Com o nome de Susannah voltava a dor quase esquecida e ele se martirizava imaginando se não seria melhor largar tudo e ficar o mais longe possível daquele tribunal e da recém-nomeada juíza.

Ainda não percebida por Dan, a abelha fez uma rápida manobra ao redor da cadeira colocada sobre o tablado do juiz e desceu sobre as mesas destinadas aos advogados, dispostas em forma de "L". O outro advogado observava-a nervosamente e ficou visivelmente aliviado vendo-a voar na direção de Dan.

— Dan! — Corwin chamou a meia-voz. — Essa filha da mãe deve estar gostando da sua loção de barba. Mate-a, homem, ou será picado.

Dan ergueu a cabeça com expressão absorta e demorou alguns segundos para perceber o que acontecia. Vendo o inseto que o rodeava, chegou a pensar em permitir que o ferroasse. Talvez fosse uma daquelas abelhas bem ferozes cuja picada lhe daria uma desculpa para largar o caso e esperar que o sócio sarasse e assumisse a tarefa em seu lugar; mas, azarado como era, inevitavelmente aquela seria uma abelhinha ordinária, que o deixaria apenas com um calombo ridículo no nariz e não o livraria do trabalho nem da provação de se ver frente a frente com Susannah. E encarar qualquer juiz com nariz de palhaço não era algo que o seduzia.

Alarmado pelo próprio raciocínio, gelou diante do perigo. Logo, porém, o esboço de um sorriso curvou-lhe os lábios. Se aquele advogado criado na cidade, o Corwin, pensava que ia vê-lo apavorado pela abelha e ferroado por ela, estava redondamente enganado. Havendo crescido numa fazenda, Dan sabia, desde a mais tenra idade, que o único jeito de defender-se de um inseto voador era ficar imóvel. E foi o que fez.

A abelha zumbiu ao redor de seu rosto, chegando a esbarrar em uma das faces, mas não o atacou. Depois de alguns segundos, cruzou a sala e saiu pela janela.

Dan relaxou os músculos e ajeitou-se na cadeira. O ar ameaçava tornar-se opressivo e já fazia bastante calor para um começo de primavera, mesmo considerando-se o clima quente da Califórnia. O servente fechou os vidros das janelas e ligou o ar-condicionado, mas ele continuou a sentir as palmas das mãos úmidas.

Aquele era um sintoma da ansiedade que o perseguia desde que iniciara a carreira de advogado, doze anos atrás, não podendo ser atribuído nem ao calor nem à umidade exagerada do ar, como acontecia ali em Cacheton, sede da comarca de River County, uma cidade eternamente úmida devido aos campos alagados para a plantação de arroz e aos inúmeros canais de irrigação que havia nas redondezas.
Naquele dia, o que o deixava ansioso não era o caso em si, mas o juiz, ou melhor, juíza, que atuaria no julgamento para o qual ele viera, viajando trezentos quilômetros.
Susannah Ross. Do signo de Gêmeos, volúvel, mulher de dupla personalidade. Era um riacho de montanha e um lago profundo, flor e chama, brisa e vendaval, gata mansa e tigresa.

(Completo) Sempre Te Amei, Nunca Te Esqueci Onde histórias criam vida. Descubra agora