Capítulo 1 - Sinal de Liberdade

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 Existem poucos momentos tão preciosos na vida de uma adolescente quanto o sinal do último dia de aula. Principalmente quando é seu último ano. Choros e gritos se misturavam numa melodiosamente, era uma felicidade que se misturava com a tristeza do adeus. Meus amigos pulavam como cangurus, Nathan quase caiu quando veio me abraçar. Era como se estivéssemos ganhando um troféu. Depois de mais de uma década de provas, deveres de casa, trabalhos em grupo e feiras entediantes, finalmente tudo isso estava acabando. Bruna respirou fundo com um sorriso tão grande que não cabia na boca. Maré, a minha melhor amiga, correu para Nathan, seu namorado dando-lhe um beijo tão intenso que me pareceu até um pouco pornográfico. Pouco depois, ela veio na minha direção.

– Não. Eu não quero baba. – Eu gritei tentando esconder meu rosto, mas ela distribuiu estalinhos pelo meu rosto mesmo assim.

Di e Ohanna vieram na nossa direção.

– Não acredito que consegui me formar. – Di parecia incrédulo. Suas palhaçadas incontroláveis e descabidas já haviam rendido um ano a mais no ensino médio. Era um alívio para ele saber que finalmente ia se formar. – Eu tô tão feliz que se não fosse pobre levaria vocês para comer no Outback.

Imediatamente nossos olhares correrão para Ohanna. A dona dos cartões de crédito. Sempre andando com roupas de marca e cultuando seus seguidores no Instagram e no Tik Tok.

– Porque vocês estão olhando para mim? – Ela se fez de desentendida.

– Por que você poderia levar a gente. – Di fez um olhar de coitado, como a de um filhote quando sente fome.

– Nem vem. Eu nem tenho dinheiro para isso.

– A por favor. A gente ajuda a pagar a metade. – Disse Nathan.

– Eu posso pedir pro meu sogro. Ele me ama. Uma vez ele até me levou para jogar golfe.

Di colocou o braço nos ombros de Ohanna como se tivesse controle total da situação.

– Primeiro, meu pai não te convidou. Eu disse que se você não fosse eu não iria. Segundo, se você for pedir dinheiro ao meu pai, nunca mais ele deixa você pisar lá em casa.

– Acho que não aconteceu do jeito que eu imaginava. – Di tirou os braços de Ohanna decepcionado.

– Porque não fazemos algo mais barato? – Sugeri.

– Concordo. – Disse Maré.

Enquanto a sala esvaziava, eu e meus amigos cogitávamos centenas de possibilidades ao mesmo tempo, numa cacofonia que apenas nós conseguíamos produzir. Porém, o que prevaleceu foi a ideia de irmos à noite numa lanchonete temática do bairro. Era mais provável de acontecer uma vez que mal tínhamos dinheiro para o nosso grupo. Mesmo depois de decidir, continuamos com a falaria, éramos babuínos, bobocas balbuciando em bando. O professor até nos expulsou da sala, então fomos buscar Paola, nossa amiga que carinhosamente chamávamos de Lola. Ela estudava na turma do final do corredor. Ohanna rotineiramente discutia com ela, então antes mesmo que fôssemos, ela supostamente se lembrou de um compromisso e arrastou Di com ela. Sempre com seus compromissos para deixar de fazer o que não quer. Uma palhaça. Fui com Nathan, Maré e Bruna em direção a sala dela. De longe já ouvíamos um barulho de violão e palmas, sabíamos exatamente onde ela estava. Lola com seu cabelo de mexas azuis e piercing na sobrancelha puxando a cantoria dentro da sala. Uns oito alunos sentados nas carteiras em círculo e ela com o violão e com suas roupas pretas e sombrias puxando todos para cantar Californication.

– Ela deveria fazer uma audição. – Disse Nathan.

– Ela tem talento. – Digo.

Nos aproximamos da rodinha para ouvir. A voz da Lola é diferenciada. Dava para notar entre todas as vozes a dela se destacando. Ficamos por uns vinte minutos batendo palmas ao ouvir o repertório aleatório que ia de Jason Marz e Aurora, passando por Cássia Eller, Bruno Mars, The Neighbourhood, The Strumbellas, com sutis pitadas de Vitor Kley, Legião Urbana e Linkin Park. Uma farofa eclética que parecia inexplicavelmente combinar tanto com a escola.

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