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Naiane pousou a caneta sob a folha de papel, assim que a grave voz do responsável pelo curso de iniciação ordenou que os estudantes pausassem a feitura da prova e que a entregassem.
Guardou o seu material no interior da bolsa negra, agarrou o manuscrito e depositou-o nas mãos do administrador da formação, correspondendo ao cordial sorriso que lhe foi dirigido.
Não aguardou que a confusão instalada à saída atenuasse, ao invés decidindo fazer parte dela, e em largas passadas abandonou o edifício, almejando pelo momento em que regressaria a casa e tomaria um banho quente. A sua cabeça doía, os seus tensos músculos rogavam por distensão e a sua mente desesperava por uma boa dose de distração.
A avaliação a que fora submetida havia sido, na sua pessoal opinião, aquela com maior grau de dificuldade e exigência de preparação até então.
Desejava apenas que as noites de privação de sono e descanso físico e mental, por virtude de um intenso estudo, se manifestassem frutíferas aquando da entrega da nota final.

Com a sua característica tranquilidade, conduziu em direção à habitação que, um dia, partilhara com Dora, a irmã da mãe e, por conseguinte, sua tia que, largos anos antes, emigrara para o continente europeu, e mais concretamente para Terras de sua Majestade, na procura de alcançar o nível de vida desejado, claramente, uma realidade impossível na pacata cidade onde, antes, residia, no seu país de origem. Eventualmente, conhecera um cidadão britânico que lhe fizera apaixonar e, anos mais tarde, casar. Da união, nasceu a única herdeira do casal, Sandrine, que, por consequência da nacionalidade alemã do marido, tinha a sua residência habitual na cidade de Munique. Ainda assim, sempre que possuía a oportunidade, regressava a Liverpool, a fim de visitar a família e, sobretudo, trazer à memória os melhores momentos com os seus falecidos progenitores, vítima de doença linfoproliferativa no seu mais elevado estágio.
Aquando do falecimento de Dora, a sua única descendente autorizara Naiane a permanecer, usufruir e habitar a moradia, ao invés de a vender, tal como, habitualmente, acontecia quando no quesito das sucessões por morte. Procurando compensar a familiar pela sua solidariedade, a mexicana começara por depositar, mensalmente, uma quantia monetária correspondente a uma renda, na conta bancária de Sandrine, ainda que, no dia seguinte, o dinheiro lhe fosse devolvido, como clara por parte da mais velha, que persistia em recusar que a morena lhe pagasse o que quer que fosse. A mulher era a única família que lhe restava e Naiane, eternamente, grata lhe estava.
Após alcançar o destino final, estacionou o seu velho automóvel - cuja propriedade lhe havia sido transmitida pela tia por intermédio de um contrato de doação - no pátio frontal da moradia sendo, imediatamente, recebida por Hermosillo, o seu bordier collie, e, igualmente, um presente de Dora, o único membro da sua família que se havia disponibilizado para cuidar de Naiane aquando da precoce morte dos seus pais, vítimas de um fatal acidente de viação.
Soltou uma fraca risada assim que o canino deu impulso em direção frontal e colocou as patas nos ombros da rapariga que, lhe afagou o focinho.
Ordenou ao animal que a acompanhasse, alimentou-o, permanecendo a observá-lo enquanto o canino devorava a sua ração preferida e, com um último carinho no seu fofo pêlo, adentrou a moradia, subiu ao segundo andar, onde estava localizado o seu espaço pessoal, livrou-se das vestes e correu para o banho, não contendo um suspiro de puro deleite, quando a elevada temperatura da água, abraçou os seus tensos músculos, relaxando-os. Naquela específica ocasião, optou por prolongar o tempo sob o chuveiro, pela precisão que sentia. Nunca se havia considerado uma pessoa ansiosa, contudo, parecia não conseguir evitar naqueles últimos tempos.
Travando as suas perturbadoras reflexões introspectivas, abandonou o duche, selecionou umas leggins e uma sweat como traje, pela comodidade que proporcionava, e guiou em direção à pastelaria/restaurante, com o objetivo de auxiliar o casal inglês no descarregamento e arrumação de material necessário ao funcionamento do estabelecimento.
Assim que da porta de entrada se aproximou, um fraco sorriso não segurou ao observar Joseph concentrado numa disputa de xadrez com Trent. O foco que o jogador depositava no jogo, bem como a expressão que adornava os seus atraentes traços faciais, conduziram-na à conclusão que o mais novo encontrava-se em desvantagem e que se afigurava pouco satisfeito com tal facto.

Yes, I do | Trent Alexander-Arnold Onde histórias criam vida. Descubra agora