Capítulo 1 - Um príncipe sem coroa, ainda é um príncipe ✎

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"Porque o medo mata tudo, Mo lhe dissera um dia, a razão, o coração e até a fantasia” – Coração de Tinta, Cornelia Funke

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"Porque o medo mata tudo, Mo lhe dissera um dia, a razão, o coração e até a fantasia” 
Coração de Tinta, Cornelia Funke

   Louise costumava afogar suas mágoas numa xícara de chocolate quente, mas desta vez, embarcou em uma nova aventura tão almejada quanto adiada. Nos braços de Tia Emma, ela sabia que teria a proteção e acolhimento que nunca tivera com sua mãe. Por alguma razão, Emma Thompson sempre tivera o cheiro gostoso de canela e biscoitos frescos. Apesar de sua rotina, que consistia em trabalhar como professora e ser voluntária num lar de idosos, a mulher, no auge dos seus quarenta e cinco anos, sempre conseguia cuidar de sua casa e de seus felinos: Sr. Bigodes e Majestoso. Ao chegar na cidade, Lou sentiu a nostalgia da infância; um misto de aromas que embriagava seus sentidos.

    O ponto de encontro foi marcado num lugar especial para tia e sobrinha, que partilhavam uma paixão, dentre a maior delas, os livros. Ao adentrar na livraria, Louise pôde ouvir o tilintar do velho sino, que ela carinhosamente chamava de Sininho. Distraída como sempre, entre pilhas de livros infantis, sua tia encontrava-se distante, perdida nas páginas ilustradas.

— Estou procurando um livro, cujo o enredo principal se passa numa cidade interiorana, onde uma garota destemida é arrastada por um furacão. — De forma sorrateira, Lou pediu indicação de seu clássico favorito, O Mágico de Oz.

— Está falando de O Mágico de Oz, querida? — Sem tirar sua atenção do livro, Emma respondeu — Na segunda prateleira à esquerda, ao lado do Pequeno Príncipe e os contos de Charles Dickens.  — Ao perceber o silêncio da cliente, Emma caminhou até a prateleira, sendo surpreendida por sua sobrinha.  — Louise! Ai meu Deus! Achei que você fosse chegar um pouco mais tarde.

— Eu vim o mais rápido que pude, estava tão ansiosa para chegar, o caos da cidade não me fazia bem, muito menos o meu pai. — Elas se abraçaram de forma demorada, como Lou suspeita, o cheiro de canela e biscoitos ainda estava lá. — Estou sentindo o irresistível aroma dos meus biscoitos favoritos?

— Seu pai não costuma ser um homem fácil, sabemos disso, e ele não tem pretensão de mudar. — Para fugir do clima estranho que se instalava aos poucos, Emma tornou para o assunto favorito de sua sobrinha. — Com a sua chegada, fiz os biscoitos de sempre, alguns com gotas de chocolate e outros de mel.

— Meu estômago está ansioso para provar essas delícias — Elas caminharam até o balcão principal e Louise ainda carregava suas malas cor de rosa, cansada, as colocou nos fundos da biblioteca. — Pensei em deixar as malas na sua casa, mas queria fazer uma surpresa, então acabei trazendo tudo.

— Só o básico, né? Seu apartamento não coube na mala. — Emma sorriu e Louise apenas revirou os olhos, costumava ser precavida, isso significava que ela exagerava um pouco na quantidade de utensílios. — Pode me ajudar com alguns livros aqui? Teremos a noite toda para fazer o que você quiser. Cineminhas das garotas? Sessão indique um clássico? Mimica à bolonhosa? Estava ansiosa pela sua chegada, meu bem. Finalmente minha Loulouzinha retornou, depois de tanto tempo.

[...]

  Sabendo que não dava para limpar tudo magicamente, elas teriam um certo trabalho em organizar os livros da biblioteca que estava fechada há mais de 1 ano, Louise ajudou no que podia e ao sentar-se no chão leu as páginas do velho exemplar de O Pequeno Príncipe. O familiar tilintar do sino anunciara a chegada de um cliente, mas, como Tia Emma estava no balcão a morena permaneceu lendo quietinha.

— Emma, a mulher mais formidável que pôs os pés nesta cidade... — Uma voz masculina inundou  o local, fazendo Louise que escutava de longe, revirar os olhos com a cantada barata. Conhecendo bem sua tia, ela sabia que Emma provavelmente colocara uma mecha de seu cabelo castanho escuro atrás da orelha, sempre fazia isso quando ficava tímida.

— Querido... são seus olhos... — Uma risadinha baixa foi ouvida por Louise, sem acreditar que ambos estavam tendo um diálogo tão cafona. Com certeza, pensara Louise, era algum pescador de meia idade tentando levar sua tia para jantar, ela revirou os olhos, não gostando da intimidade dele. — Vai querer o mesmo de sempre? Sabe onde encontrar, pode ir.

Após alguns segundos, a garota não ouviu mais nada, desconfiando que sua tia estava tendo um encontro amoroso entre os livros e ponderou ficar escondida na biblioteca para sempre, em razão de sua vergonha por imaginar tais coisas. Porém, ela ouviu passos firmes e não cogitou olhar, fingiria para Emma que não estava prestando atenção nos dois.

No entanto, não foi bem isso que aconteceu. Sapatos de couro se aproximaram de Louise, que levantou o olhar lentamente sob o homem parado ao seu lado, ao observar o sorriso divertido nos lábios dele ela se enrijeceu, ficando completamente desconcertada.

— Achou o que procurava? Você deve ser a Louise, meu nome é Chang. — Estendendo a mão de forma cordial, ele a saudou, a morena não tardou em apertar e ser levantada por ele. — Preciso pegar alguns livros, se você não se importar. — Pequeno Príncipe... Uma boa escolha.

— Prazer, Chang. — Dissera de forma tímida, ainda envergonhada por ouvir a conversa de sua tia e constatar que o possível pescador de meia idade era um jovem galanteador barato. — Ah, claro... — Louise guardou o livro que estava lendo na prateleira mais próxima e voltou ao caixa, observando um meio sorriso no rosto de Emma.

— Vejo que se conheceram, desculpem por isso, acabei esquecendo que estava sozinha nessa biblioteca empoleirada. Chang é filho de uma das mulheres mais incríveis desta cidade, minha melhor amiga. Já falei bastante sobre a sua chegada, Louise, mas sinto que você terão muito tempo para boas conversas.

Os dois ficaram em silêncio, logo após, Chang apenas sorriu e assinou os papéis para os empréstimos dos livros, Louise tentara ler, mas as capas estavam bastante gastas. Emma observava os dois, de forma curiosa, notando o comportamento estranho de Chang, que não visitava a biblioteca desde que fora aberta novamente, e sua sobrinha, que ficara notavelmente incomodada com a presença dele.

— Ah, claro! Posso ser um ótimo guia, se assim desejar. Ou, quem sabe a Emma resolva sair da toca felina dela para jantar com a minha mãe qualquer dia desses. — Chang sorriu, mas, seu olhar deixava o convite endereçado para a garota, que ele nem sequer conseguia parar de encarar.

— Não fale deste jeito, o Sr. Bigodes e o Majestoso consomem muito de meu tempo, gatos dão bastante trabalho, meu jovem. — Emma sorriu e cruzou os braços, fazendo os dois sorrirem. — Assim que minha sobrinha se sentir confortável, iremos jantar na sua casa, pode avisar para a sua mãe. Em breve vocês irão desfrutar da companhia dessas elegantes damas. — Chang fez um aceno em concordância e saiu da loja, olhando para Louise uma última vez antes de partir.

Entre páginas de livros velhos, Louise descobrirá uma nova aventura, que jamais cogitou encontrar, numa cidade tão pacata, romântica e cheia de mistérios.

Querida Bibliotecária | INCOMPLETAOnde histórias criam vida. Descubra agora