Sapatilhas de vidro

75 4 2
                                    


O sol da manhã invadia a sala através das janelas iluminando a jovem. Enquanto dançava, sentia a luz aquecer sua pele confortavelmente.

Cada movimento, cada esforço...exigia o máximo de sua concentração.

Uma sensação de inquietação tomava sua mente. Já não conseguia lembrar a última vez que sentiu prazer ao dançar, mas mesmo assim o fazia.

_1!... 2!...3! 1!... 2!... 3!

_ Postura reta! Levante mais a perna!(Dizia o professor incessantemente, a fazendo repetir os movimentos).

_ VAMOS! Sem perder o foco! Concentre-se! Você lembra? "Diamantes não nascem prontos, eles são?!... (Gritou o professor).

_ Lapidados! (Respondeu a bailarina a voz ofegante enquanto continuava a série de movimentos).

A dança era sua vida. Seu destino. Sua obrigação. E ela não poderia ser outra coisa a não ser perfeita. Só existia a perfeição e nada além disso.

As palavras de sua mãe ecoavam em sua cabeça como um mantra sádico, um martelo martelando sobre a cabeça de um prego.

"Não existe nada além do primeiro lugar!"

"Você nunca será perfeita se não der tudo de si!"

"Enquanto você se distrai, outra menina está dançando e se tornando melhor que você."

"Não faça corpo mole! Eu aguentei bem mais que isso!"

"Ria dançando, chore dançando, todo sofrimento... toda dor ...isso é só psicológico!"

"Nós te criamos pra ser perfeita ... sua única obrigação é nos dar isso!"

"Não me decepcione!"

"Você não está se esforçando o bastante!"

"Você é deprimente!"

Todos aqueles pensamentos invadindo sua mente sem avisar. Por fora talvez pudesse parecer calma, mas por dentro se sentia inquieta, ofegante, tonta e sem ar.

Enquanto girava em rodopios, cenas traumáticas do passado giravam em um ritmo caótico em sua memória, a fazendo perder cada vez mais o ar. Então por um passo em falso, se desequilibrou e caiu no chão.

O professor, à distância, se manteve inerte, mas seus olhos continuam focados analisando todos os passos da bailarina.

Uma mulher com uma prancheta na mão se aproxima dele. Ela tinha aparência jovem e cabelos castanhos, longos com grandes cachos nas pontas.

_ Professor Rupert a reunião docente é daqui a meia hora, devo lembrá-lo que também receberemos alguns possíveis patrocinadores para a próxima temporada.

_ Sim. Mais uma sequência e já vamos encerrar. (Disse o professor em tom de voz baixo e calmo, sem tirar os olhos da bailarina). Veja Helena...(Com um leve movimento da cabeça indicou discretamente para a bailarina). Está tudo perfeito, a sincronia de cada movimento... Postura, inclinação... Mas eu sinto que ainda falta alguma coisa...

_ Mas está não é Elizabeth Johnson, a grande promessa da academia?(Helena cochichou).

_ Sim. Ela mesma. (Confirmou o professor, no mesmo tom de voz).

_ Ouvi dizer que outras instituições já fizeram propostas para que ela abandonasse a academia. E que muitos patrocinadores novos estão surgindo, motivados pela expectativa do que ela pode se tornar. E que até mesmo a Diretora foi pressionada para lançá-la como profissional antes do final do curso...(Disse em voz baixa).

A Bailarina da GaiolaOnde histórias criam vida. Descubra agora