Eu poderia começar a contar a minha história desde o meu nascimento, ou simplesmente dizer o que eu senti ao ver minhas asas – literalmente – crescerem há dois anos.
Não, prefiro apenas relatar o início de como minha "vida normal" mudou drasticamente em apenas três semanas, do dia para a noite, de uma hora para a outra, da água para o vinho.
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Estávamos no mês de setembro de 2015, era outono, a minha estação favorita. Eu, frequentava a Escola Óli. Fundada no ano de 1987, na época ela possuía apenas 28 anos, porém, aparentava ter saído diretamente da idade das trevas com sua aparência medieval por fora. Era mais um dia comum, em uma pequena cidade comum, localizada no norte de Relávus, uma pequena Republica no meio do Oceano Atlântico, próxima à Bahamas e outros países com suas ilhas próximas. Nunca saímos daqui, nunca mesmo, muito menos viajamos até Fleuma, nossa ilha mais próxima que fora isolada por razões desconhecidas. Alguns dizem possuir répteis venenosos de todas as espécies e tamanhos. Outros dizem haver criaturas perigosas demais, alguns exageram nos alertando sobre "criaturas" parte humana, parte pássaro, dizendo que roubam a nossa sanidade e depois nos assassinam da forma mais cruel possível. Seja lá o que for, qualquer um que resolve viver por lá nunca mais retorna, alguns chamam de perdidos, ou isolados.
-Annelise, fala sério. Você já checou seu cabelo umas três vezes só essa manhã. Vamos logo! - Esbravejou Noah, meu irmão gêmeo. Ignorando-o completamente, continuei encarando meus olhos castanhos no espelho de seu quarto. - Annelise, se eu me atrasar a culpa será sua.
-Eu já entendi Noah! Acalme-se e me espere lá fora, tudo bem? Eu já vou.
Sem questionar minha atitude, ele saiu bufando pelo corredor como faz toda manhã. Desfiz meu rabo de cavalo num segundo, fazendo meus cabelos castanho-claro caírem sobre meus ombros cobrindo parte das minhas costas, suas ondas logo se destacam sob o velho casaco vermelho que eu basicamente implorei para minha mãe comprar em uma loja velha. Chequei meu relógio de pulso e vi que tinha mais dez minutos.
-Tudo bem... Falta alguma coisa... – murmurei, olhando em volta passei meus olhos pelo quarto bagunçado de Noah, cama desarrumada, cabeceira cheia de papéis rabiscados... Minha mochila encostada na beira da cama, vermelha cor de sangue, vermelha... Vermelho, VERMELHO! "É isso!" minha mente gritou, meu inseparável batom vermelho. Abri minha mochila derrubando tudo pelo chão, "onde está?". Separei tudo pelo chão e o encontrei, rapidamente fui até o espelho e com cuidado passei em meus lábios pálidos, dando um pouco mais de vida, talvez "muita vida".
Chequei o relógio mais uma vez, três minutos.
-Ai meu Deus! – joguei tudo o que havia tirado dentro da mochila e saí correndo em direção à Noah que me olhava em tom de reprovação.
-Me lembre de te acordar mais cedo da próxima vez.
-Desculpe Noah, foi a última vez eu prometo. – sorri para ele na esperança de animá-lo, seus olhos verdes quase me fuzilaram antes de desviar até a porta onde logo a fechou e trancou, me ignorou por completo. – É sério que você vai ficar bravo comigo? O que eu fiz dessa vez?
-Tirando o fato de ter invadido o espelho do meu quarto, me deixando esperar por você como todas as manhãs e ainda por cima nos fazer chegar atrasados. Nada. Você não fez nada, Annelise. – ele sorriu ironicamente para mim e saiu pisando firme sem me permitir alcança-lo.
Noah e eu, apesar de sermos irmãos gêmeos somos bem diferentes um do outro, começando pela aparência, ele possui madeixas douradas e olhos claros, muitos pensam que ele é mais velho por conta da altura e talvez do pouco de maturidade que aparenta ter. Ele possui muito senso de humor, - exceto pela manhã - eu digo que é a sua pior fase do dia. Apesar de tudo, ele sempre foi bom comigo, por um longo período eu tentei protegê-lo, mas depois percebi que ele é a pessoa que mais me protege.
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-Eu ouvi dizer que estão chegando alguns alunos novos aqui em Óli. – sussurrou Diana, uma antiga colega de classe.
-Sério?- balbuciei enquanto comia um sanduíche.
Nós estávamos embaixo de uma árvore, escondida dos amigos do meu irmão durante o intervalo. Eles não eram tão amigáveis quanto tentavam ser... A princípio, eu não me importei com aquilo até ela dizer de onde eles haviam chegado:
-Eles vieram da ilha Fleuma, dá pra acreditar?
- O quê?! – minha voz elevada desafinou com a surpresa, me fazendo engolir um pedaço do sanduíche por inteiro, senti como se minha garganta rasgasse, me fazendo tossir um pouco.
- Shh... Fala baixo. – repreendeu-me ela. - São cinco no total, não sei se são parentes ou coisa parecida.
Os cabelos dourados de Diana dançavam com o pairar leve do vento, seu olhar era critico a nossa volta e de vez em quando olhava para mim, ela sabia que não poderíamos tocar no assunto em público.
-Mas, - analisei a expressão dela quase notoriamente - ninguém sai de lá. – espantada, Diana desviou o olhar do meu, olhei na mesma direção que a sua e avistei uma garota ruiva, nunca vista por lá, ao seu lado uma jovem alta e negra, ambas conversando.
- Elas vieram de lá. – Disse Diana, uma delas me encarou e eu rapidamente olhei para Diana que mais uma vez murmurou. – Aquele dali, está vendo?
Discretamente ela apontou para um rapaz de costas, alto, vestido numa jaqueta de couro. Pude sentir meu estômago revirar com toda a curiosidade despertada, afastei o pensamento que borbulhava em minha mente com milhões de questões surgindo.
- Estou sim.- balbuciei mordendo mais um pedaço do sanduíche.
- Ele também é um deles. O mais discreto até onde sei. – Ficamos observando em silêncio, esperando para saber se ele viraria em nossa direção mas logo fomos interrompidas pelo sinal ensurdecedor.
-Te vejo mais tarde Anne. – Diana levantou-se levando consigo uma pequena agenda onde sempre anotava o que acontecia de importante nas aulas.
Ri comigo mesma, imaginando minha desorganização com os horários.
- Patético.
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Liberdade
FantasyAnnelise Vie, sempre gostou de ouvir histórias e lendas contadas por seus pais durante a sua infância. Mal sabia ela que elas "talvez" poderiam possuir alguma verdade embutida, ao conhecer Akira Folko, suas dúvidas sobre si mesma e sua origem começa...