Capitulo 3 - Escute seu medo

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“Não a nada mais torturante que a própria mente humana. Todas suas complexidades assumiram um papel crucial para loucura. Todos nós escondemos nossa complexidade em nosso inconsciente, cada um com sua loucura, cada um com seu segredo. Talvez, todos os mistérios do mundo, sejam a doce e amarga manifestação dos segredos escondido na mente insana da humanidade, desejos e vontades reprimidos, fantasias e ilusões, sonhos e pesadelos, a misteriosa mente humana sustenta mundos e dimensões inimagináveis, o portal da loucura se encontra dentro de nós mesmos.” – Filipe Soares Luz.

A primeira regra do ritual é não levar nada consigo além do relógio e da vela, evidentemente uma regra no qual irei infligir  para o bem dessa investigação, irei provar a todos o quão loucos estão em dar inocência a irresponsabilidade do ato dos outros, alegando serem vitimas do sobrenatural, eles não passam de vitimas da loucura!

Não irei trazer muito comigo, apenas trarei um medidor de oxigênio e uma câmera que estará responsável por filmar minhas ações a medida que meu oxigênio se mantiver escasso.

Utilizamos uma solitária de um presidio abandonado. Levou meses para que eu chegasse no estágio permitido pela seita para fazer o ritual. Retiramos as celas e colocamos um chapa de ferro própria para vedar todas as saídas, cumprindo assim o pedido do ritual de o mesmo ser realizado em um quarto sem janelas contendo apenas uma porta, porta esta contida na chapa, uma porta sem tranca, apenas com uma maçaneta para mantê-la fechada. O irônico era que a chapa fechava até mesmo a saída de ar. Segundo eles era preciso isolar se de qualquer energia exterior.

Mantemos sigilo sobre a experiência que seria a prova da inexistência de fatos sobrenaturais e da culpa dos membros da seita.

Mas o que mais me instigava era o fato de o “sobrenatural” ser sinônimo de inocência, na opinião do  juiz, pensando bem ele me parecia suspeito, já vi muito daqueles olhares que ele fez na hora do julgamentos do paciente 278.

Desde o dia em que comecei a investigação, nada me parece real, deve ser essa rotina maldita.
Estranho falar em rotina quando você se depara com um a série de situações fora do comum ou fora da lógica e simplesmente não argumentamos contra isso, a menos que sua rotina seja essa isso foge as regras da sanidade.

A cela é fechada, faltam 12 minutos para meia noite, estou ansioso, sinto como se já estivesse aqui antes, como uma nostalgia, se é que posso chamar isso de nostalgia. Encaro as paredes daquela cela enquanto a porta do local ainda está aberta.

--E então Carlos, ainda vai insistir nessa loucura? Você não precisa provar nada p....- Ele continuou falando por acho que uns 3 minutos, não sei como nem o porque, mas o resto da fala me foi simplesmente ocultada, sabe quando perdemos o foco de uma conversa quando estamos com nossa mente vagando em nossos pensamentos? Acho que foi isso.

--John, não sei o porque mas estou aqui, simplesmente quero cumprir com meu dever, cumprir com a justiça e... – Fui interrompido por John, sorte a minha, não estava falando coisa com coisa, ainda não tinha o foco da conversa.

--Justiça? ora vamos Carlos, sabemos muito bem que não se trata de justiça, você está curioso quanto ao fato desses fenômenos sobrenaturais. – Disse John.

--Não me venha com asneiras, o sobrenatural não existe, simplesmente são coisas fora do padrão no qual não conseguimos explicação lógica, simplesmente é algo que afirmamos sem ter certeza de sua lógica. – Disse eu aflito de que John esteja certo, não quero que o motivo de eu estar fazendo essa merda seja para conhecer a possibilidade da lógica dessa seita estar correta.

--ok ok... faltam 5 minutos, depois disso não ficara ninguém nessa ala da prisão, sabes muito bem que sequer sabem que estou aqui. Instalamos algumas câmeras escondidas em buracos na cela sem que tivessem percebido, assim saberemos oque ocorre na cela e até mesmo se existe alguma influência exterior por parte dos membros da seita.

--Oque??? Não me diga que aquele juiz de merda está monitorando esse experimento?

--S-Sim i-inclusive (diz num sussurro), está escutando nossa conversa. – Que merda ele está aqui?

--Não acredito nisso, bastava fazer o paciente 278 pagar pelo que fez e pelo que os membros de sua seita fizeram, isso é ilógico!

--Você ainda quer fazer isso? – Pergunta  John.

--Claro que sim! Vou acabar com essa merda, afinal, isso tudo parece a porra de um sonho, não terei problemas em entrar naquela sala. – Digo irritado com tanta manipulação, me sinto uma marionete nas mãos de um sistema corrupto.

--De qualquer forma, estamos te escutando e filmando tudo que acontece nessa sala, se você tiver problemas, devido ao tempo que estiver ai ou pela sua teoria estar certa e o nível de oxigênio afetar seu raciocínio saia por essa porta imediatamente que estaremos te esperando no final do corredor.

--Tudo bem, isso já estava na minha mente.

--A propósito, falta 1 minuto, melhor entrar.

--Ok

--Posso fechar a porta?

--Pode.

--Até mais tarde Carlos.

--Boa noite John.

A porta se fecha, por alguns segundos, sinto como se perdesse a luz da vela, me ergo levemente para chamar apoio para John para que me a acendesse novamente, porém, percebo que não se passava de uma mera ilusão, minha mente estando tão cheia de pensamentos focou na escuridão do quarto e não na vela, a impressão que tive foi que a vela estava apagada estando ela acesa.

Escuto o relógio, tic-tac, tica-tac, é tudo que tenho para ouvir.

--Não me admire que fiquem loucos, esse barulho é ensurdecedor estando em silencio.

Com a mera luz emitida da vela vejo pelo relógio que se passaram 1 minuto desde a 00:00hrs, 1 minuto? parece ser verdade o que dizem, o tempo não passa para aqueles que não tem nada a fazer.

Tento recordar das primeiras horas retratadas no livro, talvez esse momento de silencio me faça refletir melhor na investigação desse caso, na lógica de toda essa merda, seja qual for a merda de lógica que tenham inventado. Apesar de tudo, lógica para mim é algo que sempre existiu, imutável, teorias são a reprodução da lógica, matemática é uma lógica, ela esta presente em todo nosso universo e na nossa física, religião é teoria, você não pode dizer que um anjo mais um anjo é igual a dois anjos porque você nunca viu um deles, não pode dizer que existe um mundo sobrenatural, uma segunda dimensão, um universo paralelo ao nosso chamado de espiritual, você simplesmente não pode afirmar nada disso pois não se tem base nenhuma, não temos provas, não temos uma energia a ser medida e identificada, e nem presenciamos influencias do mundo espiritual no nosso mundo, tais influencias não passam de coisas da nossa cabeça.

Refletindo sobre as coisas, minha mente me leva a pensar que existem coisas naquela cela, vultos e sombras, um mero jogo de ilusões.  Minha visão perde o controle sobre o que quer ver, a escuridão do quarto engole a luz da vela, o único tipo de estimulo que ainda tenho é o tic-tac do relógio, me lembrei dos primeiros eventos citados pelo livro, as primeiras 3 horas não acontecem nada, não acontecem nada, NADA ACONTECE!!!

Sem querer solto um berro ordenando para que nada acontecesse, e funcionou! Meu cérebro atendeu ao meu pedido, volto a enxergar a luz da vela a notar minha solidão, vendo que não existe nada naquele quarto além de mim, um relógio e uma vela.

--Passou-se tanta coisa, quantas horas  são?- digo a mim mesmo.

Olho e relógio, e o primeiro pensamento que venho a minha mente é, PUTA MERDA!!!, passou-se 5 minutos desde a 00:00hrs, o tempo é mortal nessas horas, fico meio atônito, começo a entender porque muitos se esquartejaram, arrancaram suas tripas e deram por suicídio, ficar 24hrs em um quarto escutando a merda de um relógio faz você sentir que esta a mais de 24 anos, a sensação é que cada minuto, é um dia, mês, ou alguma merda qualquer, já nem estou preocupada nas medidas de tempo utilizadas, quero sair daqui!

Me arrependo desse meu pensamento, não se parece comigo, parece outra pessoa, oque irão pensar de mim? Desistindo dessa forma, simplesmente não provarei nada, alias, provarei uma única coisa, que sou um completo idiota.

Tento espantar meu medo e me apegar as regras do livro, usar as primeiras 3 horas para se preparar psicologicamente, simplesmente vou aceitar o fato de que para ficar 24hrs no meio do nada é realmente necessário se manter preparado psicologicamente, sendo que esse período todo será uma verdadeira batalha mental.

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