Era a segunda festa após o resultado do paredão e Prior estava ansioso. Já havia avisado a mãe que iria aproveitar a noite. Ele apenas não sabia o quanto se arrependeria na manhã seguinte. Enquanto se arrumava, vez ou outra procurava por Daniel no quarto. Na maioria das vezes, o loiro estava penteando o cabelo. Mas, agora, quando Felipe se virou para observa-lo, encontrou Daniel fazendo o mesmo. Felipe não era do tipo que desviava o olhar quando situações assim aconteciam. Pelo contrário, soltava uma gracinha ou abria um sorriso. Dessa vez, não fez nenhum desses atos. Apenas continuou observando o sulista desconcertado com o momento. Daniel quem teve que cortar o contato visual que, apesar de não ter durado muito, em sua cabeça, pareceu uma eternidade.
- E aí, Salsicha? Animado pra festa? – como bom brasileiro, Felipe não era de desistir fácil.
- Uhum. Quero beber bastante. Mas, gente, não vamos exagerar. – a última frase ele dirigia para Guilherme, Pyong e Babu que se arrumavam no quarto também. Uma tentativa de incluir mais gente na conversa e não tornar aquele um momento dos dois. Não é como se ele não quisesse conversar com Felipe. Ele apenas não podia. Já havia deixado o personagem de lado uma vez, o que resultou em magoar Prior, e isso, sim, ele não queria de jeito nenhum. Não queria ter que acordar de novo, soltar o mão do arquiteto e depois ainda beijar Marcela em sua frente para reafirmar o que a maioria dos telespectadores já duvidavam ser mentira: ele não era apaixonado por Felipe.
E Prior, aos poucos, começava a acreditar nessa mentira. Afinal, não seria a primeira vez que ele foi trocado dessa forma. Por isso era mais fácil adotar o estilo: "apega e não se apega".
- A Flay vai atacar hoje, hein, Prior. – Guilherme comenta.
O paulistano dá risada: - Hoje eu tô pro ataque também.
Nem o mesmo entendeu o porquê havia falado isso. Se o motivo foi para fazer ciúmes em Daniel, o objetivo foi alcançado com sucesso. Aquela fala fez o sulista se sentir mais perdido ainda, afinal Prior estava afim de Flay? Mas e todas as vezes que ele se esquivava das tentativas dela? Eles não eram brothers? Todas essas dúvidas martelavam em sua cabeça. Pena que Daniel nunca foi muito bom de entender nas entrelinhas senão já teria deduzido que Prior não queria a Flay, nunca quis. Prior queria ter a certeza de poder querer Daniel. Mas o próprio sulista já havia deixado subentendido que Felipe não podia.
Logo, todos são chamados para a sala. A porta se abre em seguida e os participantes já começam a aproveitar os embalos da festa. Prior segue em direção à bebida. O aviso a sua mãe não havia sido em vão. Ele realmente queria aproveitar muito. Daniel não demora a ir fazer um drink também.
- Tu vai ficar com a Flay? – o ator pergunta.
- Agora cê vem puxar assunto. – Prior rebate, rindo.
O ator não responde. Ele ainda não poderia colocar a culpa na bebida visto que ainda não havia tomado nada.
Felipe se afasta para dançar e Daniel faz o mesmo após preparar um drink. A embriaguez apareceu tão rapidamente quanto poderia. Ambos já tinham dificuldade para andar sem cambalear. As falam também já apresentavam sinais da quantidade de álcool que os interlocutores haviam ingerido.
Já se passava das três horas da manhã quando a música Ponto Fraco anima os remanescentes da festa.
- Ei, se toca, tá na cara que eu sou todo seu. – Prior cantava alto, apontando pro céu. Não queria cometer o erro de olhar para o sulista que o admirava do outro lado do jardim. – Era pra acontecer, mas não aconteceu. Você tá adiando a vontade de Deus. Parece que não percebeu que eu estou completamente em suas mãos.
Flayslane é mais ousada e chama a atenção de Prior, apontando para ele, o que faz o mesmo rir.
- Sua felicidade é sua opção. – eles cantam o último trecho juntos. Um olhando pro outro. – Você joga sujo. Sabe que você é o meu ponto fraco. – Prior desvia o olhar de Flay quando percebe estar sendo assistido por outra pessoa. Seu expectador era Daniel que assistia à cena com certo tom melancólico. Nem toda bebida do mundo tornaria aquele cenário mais agradável para o sulista. – Tenta ser feliz mas tá fazendo errado. Procurando em outro alguém o que está do seu lado.
O último trecho Felipe canta olhando para quem deveria olhar desde o começo: Daniel. O sulista não consegue disfarçar o sorriso. Sorriso esse que se transforma em uma careta quando observa Flay se aproximar demais. Os minutos que seguiram aquela aproximação foram os piores que já havia vivenciado na casa: Felipe cede e dá um selinho na morena. Durou cinco segundos o selinho – sim, Daniel contou. O cronômetro em sua mente se perguntando se aquilo se transformaria num beijo. Ele finalmente teve sua resposta: não, mas o que seguiu o selinho foi um abraço diferente de todos que Felipe já deu dentro da casa. O arquiteto não se afastou, não tentou antecipar a duração do momento. Apenas se deixou ser abraçado e abraçou Flay.
Não percebeu quando mas sua visão embaçou. Daniel julgou ser o álcool. Eram lágrimas. Ele queria estar naquele abraço, queria ser Flay, queria não ter medo de se aproximar, de assumir que estava apaixonado. Queria ter beijado Prior quando o mesmo deu a deixa.
O sulista segue em direção a casa, precisava sentar, tomar uma água. Ficar sóbrio e voltar para o personagem. Só que seu plano dá errado quando se depara com Prior atrás dele.
- Tá tudo bem? – Felipe pergunta.
Daniel sentia que falar com o arquiteto era como a quebra da quarta parede, esse ato que ele aprendeu quando fazia teatro: a quarta parede nada mais é do que uma barreira imaginária que separa os personagens do público. Quando você derruba a quarta parede, você dá conhecimento a plateia de que o personagem não é real. Felipe fazia ele mostrar seu lado real, não fictício, não baseado em um roteiro.
- Tô. – mas Daniel estava acostumado a encenar, não iria sair do personagem tão facilmente quanto da última vez. – Só to com saudade da minha família.
- Entendi. Senta aí. Vou pegar uma água pra você.
E foi o que Felipe fez. Em poucos minutos, os dois já estavam sentados no sofá. Um do lado de outro. Daniel não ousava olhar pra Prior com o tanto de vodca que havia consumido durante a noite. Se tem um ditado verdadeiro é: "quando a bebida entra, a verdade sai". E ele não queria arriscar falar a verdade dessa forma.
- Você tá bem mesmo? – o arquiteto questiona quando percebe Daniel começar a chorar novamente.
O mais novo nega com a cabeça. Coloca as mãos no rosto e apoia os cotovelos sobre seus joelhos. Digna cena de novela das nove. Isso só se confirma quando o sulista sente a mão de Prior em suas costas.
- O que rolou, Salsicha?
- Não me chama assim.
Felipe franze o cenho: - Por que? Você disse que nem se importava com o apelido.
- É tudo complicado.
- Então, descomplica, cara.
Claro que Prior iria falar aquilo. Os dois formavam uma tela contrastante. Daniel, desde pequeno, sempre teve a mania de pensar demais. Felipe, por outro lado, como bom jogador de futebol, também sempre teve que raciocinar por onde poderia ir no campo para conseguir fazer o gol, o que diferencia os dois é que: Prior só fazia isso nos campeonatos que participava ou nas peladas de domingo. Na vida, o arquiteto agia quase sempre sem pensar.
- Tu beijou a Flay.
Nunca que Daniel iria terminar aquela frase com: "E eu não gostei". Ele só diria o fato e esperaria a resposta.
- E daí?
- Eu achei que vocês fossem amigos.
- Foi só um selinho, ô, Daniel. Selinho eu dou em todo mundo.
O mais novo assente com a cabeça. Felipe alcança o rosto dele, tirando as duas mãos que cobriam os olhos claros e observa cada milímetro da face tão desconhecidamente conhecida por ele. A pele leitosa, a boca do tamanho perfeito, e o sorriso que Daniel dá sem entender o que está acontecendo. Para provar o que havia dito, o arquiteto se aproxima com cuidado do ator. Olha para os olhos do loiro a sua frente e depois para os lábios dele que mantinham distância mínima dos seus. Foi sutil. Sem a pressa e a rapidez que Prior tentou o beijar – e apenas acertou o canto da boca do mais novo – há algumas semanas na festa em que eles se aproximaram. As bocas se uniram num encaixe único, só deles. Quando desfizeram aquela ligação, o desejo dos dois era igual: queriam de novo.
- Viu? – Felipe diz, assim que se afasta minimamente de Daniel. – Eu dou selinho em todo mundo.
Mas Daniel não queria ser todo mundo.
- Eu gosto de você. – as palavras saem de forma automática da boca do loiro. – Mesmo você sendo todo errado. Que saco.
O paulistano sorri, sem graça. Não esperava ouvir aquilo. Ele se aproxima e abraça Daniel. Estava ficando bom nisso. Sentiu o coração do outro acelerar contra o seu e sussurrou no ouvido do mais novo: - Eu também gosto de você, Salsicha.
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It's you.
RomanceO problema de Felipe Prior é brincar demais. E o de Daniel é não entender nas entrelinhas.