AQUELE CAFAJESTE, O MELHOR QUE VOCÊ TEVE

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Odiava as noites de outono, mas não poderia se dar o luxo de ficar em casa. Odiava aquele lugar e odiava mais ainda depender inteiramente dos fetiches que alguns homens tinham por mulheres mais velhas. Não era mais atraente. Fedia à cigarro e os olhos de ressaca apenas pioravam sua imagem. Mas apesar disso não rasteja atrás de ninguém. Às vezes recebia carícias das amigas quando não conseguia nenhum programa, mas nunca se rastejava. Nunca.

Respirou fundo, já era tarde e não havia mais ninguém. Era melhor ir para casa. O caminho mal iluminado e deserto lhe dava calafrios, mas já nem tinha medo de homens. Suspirou, provavelmente não teria dinheiro para o jantar do dia seguinte, mas não iria se preocupar com isso agora, que queria apenas chegar em casa e ter uma noite tranquila.

Já estava bem perto do cortiço onde morava, quando lembrou-se que havia um trecho que odiava e esquecera de desviar a trajetória. Aquele beco. Aquele maldito beco. Por mais que o odiasse daria tudo para reviver o que passara ali. Ele a salvando de alguns homens que tentavam feri-la. Estendo-lhe a mão, mesmo sabendo que era uma prostituta e ele um homem de classe. Ofereceu-se para acompanhá-la até em casa. Dias depois eram amigos e até algo mais. Florence passou meses incríveis ao lado dele, sem precisar se sujeitar à relações em troco de algumas notas. Ele não lhe deu apenas carinho e atenção, mas também dignidade. Fez-lhe rir nas tardes quentes e a protegeu do frio nas manhãs geladas. Restaurou sua paz, alinhou seus planetas e deu-lhe segurança e autoestima.

Mas ele era só mais um cafajeste, dentre tantos outros. Porém foi o melhor que teve. Apesar de ter acabado, sobretudo não o culpava. Algumas coisas simplesmente acontecem, nem tudo há um culpado. O que tiveram foi verdadeiro enquanto durou, mas nada dura para sempre. Estava feliz de ter acontecido, não se arrependia de ter experimentado o amor e a felicidade depois de tanta tristeza e amargor que sua vida foi.

Olhou para dentro do beco e viu aqueles olhos mel tocarem a sua alma. Ele não estava ali, era apenas uma fenda temporal que se abriu e deixou-lhe contemplar o passado. Sorriu enquanto algumas lágrimas deitavam-se pela sua face enrugada.

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