Durante todos esses dias em Gamcheon, fazia calor. Desde que cheguei aqui, só fico suando como um porco. E como calor me estressava como nunca, talvez seja por isso que eu fiquei mais mal humorado aqui que em qualquer outro lugar. A casa da Velha não era lá tão ventilada, no meu quarto mal tinha uma janela! Só uma janela quase inútil, que além do mais eu nem podia deixar aberta durante a noite por causa dos mosquitos. Mas depois de um calorão, finalmente o ar pareceu se acalmar e quando acordei, nem acreditei que tinha despertado sem o suor manchando um pouquinho do meu travesseiro.
Por conta disso, fui de ônibus a escola pela primeira vez. Como era a segunda ou terceira semana de aula – eu não contei –, o motorista estranhou quando me viu o esperando no ponto de ônibus. Ele estava acostumado a passar ali sem buscar ninguém então entendi o olhar desconfiado enquanto subia as escadinhas do veículo, andando até o primeiro banco vago que tivesse ali dentro. Como morava mais perto da escola, eu fui um dos últimos a subir no ônibus, ocasionando na Caminhada Vergonhosa que todo mundo evita. É aqueles passos até o último banco do ônibus onde você fica procurando por um lugar vazio porque, ou todos estão ocupados por duas pessoas ou você não tem intimidade o bastante para sentar-se com um que já tenha alguém.
Por sorte, Seokjin estava lá. Acho que esse é o único momento desde que nos conhecemos que eu agradeci por ele ser sozinho.
Sento-me ao lado do Kim, qual toma um belo susto. Ele relaxa a expressão quando me reconhece, soltando um sorriso aliviado.
— Tá devendo, Seokjin? Toma susto com qualquer coisa — resmungo tirando minha mochila das costas e colocando no meu colo, me acomodando no banco acolchoado do ônibus.
Ás vezes me esquecia que apesar de morar numa casa de bonecas numa cidade minúscula, Velha Olga tinha condições de pagar uma escola como a Cheon High School. Até o ônibus deles eram caros, nunca tinha sentado num banco tão macio como aquele. E tudo era tão limpo que nem parecia um ônibus que adolescentes frequentavam.
— É que ninguém nunca senta comigo — me explica, sem fazer isso ser uma grande coisa. Bom, pelo menos ele não tem pena de si mesmo. Odeio gente assim.
— O que você fez pra todo mundo não gostar de você? — Tudo bem, ele é bobão e bem insuportável quando quer. Mas nem é para tanto.
Seokjin dá de ombros, voltando os olhares ao aparelho colorido que prestava atenção antes de eu chegar. Eu espio, me intrigando quando vejo a tela. Era um jogo, óbvio, mas eu não fazia a mínima ideia do que era, o perguntando. Jin não tirou os olhos do jogo em momento nenhum durante a explicação.
— Isso aqui é um Game Boy. É tipo um mini computador só pra jogar, sabe? É incrível — ele diz a mim, verdadeiramente encantado.
— Entendi. — Na verdade, não tinha entendido nada mas não queria perguntar, então deixo pra lá. Como não tinha mais nada pra fazer e ainda demoraríamos um pouco para chegar na escola, mantenho os olhos no joguinho. Eu estava quieto até então mas não pude evitar um som de exclamação quando enxerguei uma pokeball na tela. — Cara, tem Pokémon aí dentro?!
Ele solta uma risada. — 'Aham. É o meu jogo preferido, depois de Super Mario.
Ele continua jogando, e eu observando. Caramba, aquele tal de Game Boy era realmente incrível. Nunca tinha visto um daqueles na minha vida, me pergunto quantas outras tecnologias eu não conhecia. Devem ter várias, aposto. Isso me deixava meio pra baixo... Eu queria ter um Game Boy também, deve ser divertido. Ou um Walkman para ouvir minhas músicas preferidas – apesar de achar que a essas alturas ele deve estar ultrapassado, por causa dos CDs e tudo mais. Só que, além de não ter pais presentes, ser órfão implicava a também não ter roupas legais nem Game Boy, nem patins, Walkman ou Discman. Acho que essa é a parte mais chata de tudo.
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O Mundo e Nós
FanfictionNo auge dos anos 90 onde todo mundo parece viver harmoniosamente, Park Jimin, qual acabou de completar 15 anos, não se vê incluso nesse cenário. Pulando de família em família por criar problemas demais aos responsáveis, o órfão não está nada perto d...