Capítulo nove

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ÁLVARO

Em uma nova cidade, e sem contatos para trabalho, tive que contactar meus antigos chefes e clientes para pedir indicações. Encontrar um emprego não é nada fácil. Por sorte, poupei dinheiro o suficiente para me manter por alguns meses até conseguir emprego e estabilidade financeira. Eu nunca tive uma vida de luxos, ao ter que juntar dinheiro para pensar no meu futuro, tudo ficou um pouco mais apertado, mas com muito esforço as coisas se ajeitaram. 

Após dois meses residindo em BH, felizmente, consegui emprego em uma obra que terá início em breve. Essa oportunidade veio através de uma empresa terceirizada. Porém, enquanto a obra não se iniciava decidi dar uma volta pela cidade. Ficar o dia inteiro dentro de casa estava fora de cogitação.

Eu estava passando por uma floricultura quando vi uma mulher de costas. Seu corte de cabelo era idêntico ao que Maitê usava quando nos conhecemos: preto, liso e curto. Parei de súbito no local. Naquela época ela dizia que queria assumir seus cachos e tingir o cabelo com cores claras, mas existe a possibilidade de Maitê ter desistido da ideia e ter continuado alisando o cabelo. A observei por alguns segundos. Intrigado, querendo saber se aquela era Maitê ou não, entrei no local sem cerimônias e abordei a moça.

— Maitê? — Perguntei com um sorriso esperançoso no rosto.

A moça se virou e então pude notar que eu estava equivocado. Acho que estou ficando louco. Procuro Maitê em todos os rostos que encontro pelos lugares em que passo.

— Olá, acho que se enganou, senhor. Meu nome é Lis, posso ajudá-lo em algo?

Meu sorriso já não estava mais lá, o que me restava era uma provável vermelhidão, pois sentia meu rosto se esquentar de vergonha.

— Me desculpe! Pensei que fosse uma pessoa que conheço. — Sorri sem graça.

— Está tudo bem. Isso acontece às vezes. — Riu. Pelo menos ela se divertia com a situação. — Que tal levar um buquê para entregar para a moça que procura quando se encontrarem?

— Eu gostaria muito, mas sequer sei onde encontrá-la. — Respondi com uma careta que a fez rir um pouco mais. — Não nos vemos há doze anos.

— Nossa, parece que o tempo ainda não curou seu coração. — Disse em tom de cumplicidade.

Ela parou por um instante, colocou um dedo na boca, pensativa, e segundos depois seu rosto se iluminou.

— Espere apenas um minuto, já volto.

Sem esperar minha resposta, Lis saiu pelos fundos da loja e desapareceu por alguns minutos. Quando voltou, tinha uma flor e um cartão nas mãos.

— Essa é a uma Astromélia. Apesar de seu nome não tão convencional, ela tem uma beleza extraordinária. — Disse me estendendo uma flor cor de rosa com alguns detalhes amarelos. Ainda um pouco confuso, peguei a flor e a observei mais de perto. — Essa flor tem um significado muito lindo. É uma das minhas favoritas. — Seus olhos brilharam ao fazer esta afirmação. — Ela significa amizade duradoura e felicidade plena. Ou seja, é a flor perfeita para presentear em quaisquer ocasiões. Além disso, Astromélias são as flores ideais para expressar saudade. — Foi nesse momento que entendi qual era o seu ponto.

— Lis, sei que você tem a melhor das intenções, mas não posso levar esta flor. Acho que não voltarei a vê-la tão cedo.

— Eu entendo. — E ali estava o tom de cumplicidade outra vez. — Como você não pode levá-la agora, pois pode murchar, eu trouxe esse cartão com uma foto dessa linda flor, então você pode escrever um bilhete para sua amada aqui e entregar quando tiver a oportunidade.

Posso assegurar, com toda certeza do mundo, que Lis é a melhor vendedora deste lugar. Ela tem um sorriso nos olhos e um jeito divertido que encanta qualquer um. Saí da loja com uma suculenta, para tia Julieta e o cartão para Maitê. Não tenho esperanças de reencontrá-la, mas esse cartão certamente será uma boa recordação. 

Antes de sair do local, Lis me fez prometer que, caso eu reencontrasse “minha amada” e tudo desse certo entre nós, eu voltaria até a floricultura para comprar um arranjo de flores com algumas Astromélias para que eu presenteie, em suas palavras, “a mulher que tem meu coração”.

***

E

ra sábado, quando meu primo, Joaquim,pediu para que eu cuidasse da sua filha Vitória enquanto ele estivesse fora com sua esposa. Como era um favor simples e eu ainda não estava trabalhando, me dispus a ajudar. A menina era um pouco agitada, mas eu tenho facilidade para lidar com crianças, então  não seria tão difícil para mim. 

Pouco antes de deixarem a garota na casa dos meus tios, que estavam fazendo uma curta viagem, meu primo me ligou dizendo que havia uma mudança de planos e que, na verdade, eu precisaria cuidar de Vitória apenas por um período de tempo, já que a menina foi convidada, por uma amiguinha da escola, para ir assistir um filme no cinema. Joaquim me passou o endereço e disse que era para eu combinar com a mãe da amiguinha de Vitória um horário para ir buscar a menina.

Alguns minutos antes do almoço o interfone tocou e eu fui atender. Era meu primo com sua filha. Vitória estava com os cabelos castanhos ondulados soltos, em contrapartida, seu pai estava com o cabelo preto amarrado em um coque. A criança trazia consigo uma mochila verde com um sapo estampado. Joaquim , parecia ter pressa, pois me cumprimentou, passou breves instruções, deu um abraço na filha e pediu para que a menina não aprontasse com o tio Álvaro, nem com a mãe de Lara.

— Oi, tio Álvaro! Tudo bem? — Disse sorrindo assim que seu pai se afastou.

— Oi, Vitória! Estou bem e você?

Ela apenas assentiu e entrou na casa assim que eu lhe abri passagem.

— Sabe, tio, ainda bem que você e a mãe da Lara estão livres hoje. — Disse séria ao se sentar no sofá.

— Ah, é? Posso saber o motivo? — Perguntei sem entender onde ela queria chegar com essa declaração.

— É que meus vovôs e minhas vovós estão ocupados hoje, se vocês também estivessem ocupados eu teria que ir para a festa da empresa da mamãe. — Explicou. — E é tão chato essas coisas de adulto.

Ela tinha razão. As coisas de adulto são realmente muito chatas. Por esse motivo a convidei para brincar de alguma coisa. Ela disse que precisava poupar energia para passear com a amiga, então teria de ser uma brincadeira calma. Essa criança é uma peça. 

Já que brincadeiras agitadas estavam descartadas, peguei alguns materiais de desenho e fomos para a mesa desenhar. Paramos para almoçar uma lasanha quatro queijos que pedi em um aplicativo, já que sou uma negação na cozinha. 

Entre brincadeiras e conversas, a hora passou bem rápido. Quando dei por mim, estava na hora de levar Vitória para a casa de sua amiga. Peguei o carro da tia Julieta emprestado e levei a menina. Fomos o caminho inteiro cantando músicas infantis. 

Chegando ao destino, que não era muito longe, desci do carro com Vitória e seguimos até o interfone localizado perto da porta de entrada. Uma voz feminina soou do outro lado da linha e aquilo me assustou a princípio, pois, por mais que possa parecer loucura, eu já tinha escutado essa voz em algum lugar. Ela liberou a minha passagem e minhas mãos suaram em sinal de nervosismo, como se eu estivesse com algum pressentimento, em relação ao que eu veria. 

Tirei qualquer ideia da cabeça, já que a única coisa que estava do outro lado da porta era a amiga de Vitória. Passei as mãos em minha calça jeans para secá-las e respirei fundo. Dei a mão para Vitória e caminhamos juntos até a porta do apartamento, que ficava no primeiro andar, toquei a campainha e aguardei sermos recebidos.

A porta abriu e eu não pude acreditar no que eu estava vendo.

Quando o Acaso Vira DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora