Capítulo II- "Éter" O outro lado do mundo

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Mexo-me na cama antes de abrir os meus olhos lentamente, o quarto está escuro, iluminado apenas pela luz da rua e da lua que entra pela janela. Sinto todo meu corpo doer, olho para o lado e vejo uma pequena bandeja em cima da cômoda. Nela tem um pouco de comida e um bilhete, que logo pego e começo a ler.

"Deixei um pouco de comida para quando acordar, caso esteja com fome. Pode descansar mais, se não houver ninguém em casa quando acordar nós fomos ao mercado, beijos!"

Ass. Mamãe

Terminei de ler o bilhete e deitei novamente na cama, fechando os olhos e tentando esquecer a dor que sentia em meu corpo. Porém percebo que começa uma pressão na cama, como se algo tivesse subindo nela, então abro os olhos para saber o que era, e vejo que ele estava sobre mim, com aqueles olhos me encarando como se pudesse enxergar a minha alma. Aquilo era muito assustador, aquela coisa agarra meu rosto, chega mais perto e com a voz falha e tenebrosa diz:

- Hora de brincar.

Ele agarra no pescoço me suspende o ar, tento me soltar de seu aperto, e ele me joga na parede, acabo esbarrando em algumas caixas fazendo um barulho alto, e ele não para por aí. Se aproxima novamente, e com aquelas garras enormes começa a arranhar minha pele cada vez mais fundo.

Eu grito de dor e ele ri do meu sofrimento enquanto parece se deliciar com o som dos meus gritos, agarra meu braço novamente e com força me joga para o outro lado do quarto, onde acabo esbarrando na cômoda fazendo a bandeja cair e o copo que tinha nela quebrar espalhando vidro para todo lado. Caída no chão olho para cima, ele deve ter cerca de 2 metros de altura, com o grande corpo curvado e seus membros longos, ele pisa em mim me forçando contra os cacos de vidro que estavam espalhados pelo chão, fazendo vários deles cortarem a minha pele, lágrimas começam a sair dos meus olhos, a dor é horrível, é a primeira vez que me machucam tanto, tudo que eu sinto no momento é dor e medo.

Antigamente havia mais deles, mas depois de um tempo foram indo embora um por um, e só sobrou ele. Há um ano que ele vem infernizando minha vida, todas as noites um sofrimento pior que o outro. Sempre me perguntei se ele também iria embora para me deixar em paz como os outros fizeram. Mas pelo que vejo vou morrer antes que ele se vá, o pensamento de morrer naquele momento me aterroriza, tudo finalmente estava começando a ir bem e agora o pensamento de que tudo pode acabar me deixou ainda mais apavorada.

Não consigo prestar atenção em mais nada, os meus sentidos estão turvos, a minha visão está embaçada e não consigo distinguir corretamente os sons..., mas lá no fundo eu ouço uma voz gritando, uma voz feminina semelhante a voz de minha mãe, escuto passos apresados vindo da escada. Vejo que a coisa vai em direção à porta como se pretendesse ir atrás de quem estava se aproximando, ele queria pegar a minha mãe e era a única coisa que eu não poderia deixa-lo fazer!

Levanto correndo, após juntar todas as minhas forças ignorando tudo aquilo que eu estava sentindo. Fecho a porta e minhas pernas não aguentam mais então eu caí logo após passar a tranca ficando entre ele e a porta. E é o exato momento em que ela chega à porta e tenta abrir gritando o meu nome.

- Annabelle você está bem? Abra a porta e me deixe entrar. O que está acontecendo aí dentro?

- Querida calma! Annabelle abre essa porta agora! diga o que está acontecendo aí dentro, você está nos preocupando Annabelle!

- Desculpa pai, mãe... Eu não posso abrir essa porta. - Falo com a voz fraca e falha sem saber se eles conseguiriam ouvir o que estava dizendo. - Ele vai machuca-los se vocês entrarem. Isto é a única coisa que eu não posso permitir! Me desculpem, por favor me desculpem por tudo!

- Annabelle deixe de brincadeira e abra essa porta agora! – ouço meu pai gritar do outro lado, antes de me sentir ser agarrada pela cintura e ser suspensa no ar por aquela coisa que vai em direção a janela comigo e diz.

- Vam-m-mos brin-caaar em um lugar maiiis silen-c-cios-soo. - Sua voz rouca soa enquanto ele se apoia na janela como se estivesse se preparando para pular, o barulho do meu pai tentando arrombar a porta fica mais alto, meus olhos cansados e pesados não conseguem deter as lágrimas que escorrem.

- Annabelle me responda agora! O que está acontecendo aí? Abre a porta! Deixe a mamãe te ajudar por favor!

- Mãe, pai... Eu vou sentir saudades! Adeus. - Digo em um último sussurro antes dele pular.

~x~

Não sei quanto tempo se passou, a última coisa que eu lembro é que ele me pegou e saiu pela janela, após isso não recordo de mais nada. Acordo com ele ainda me carregando sobre seu ombro, não sei aonde estamos, é muito parecido com a cidade em que eu vivia, mas, ao mesmo tempo é bem diferente.

As casas e os prédios estão abandonados e as plantas tomam conta de tudo, os carros estão destruídos e não há ninguém por perto, porém o que mais chama a atenção são algumas torres enormes espalhadas pela cidade, todas tem cores diferentes e pelo que parece ele está me levando até uma que é da cor preta. Ao olhar para aquele lugar sinto como se algo estivesse me sufocando, o ar me falta nos pulmões, eu tento me mover e ele me aperta mais forte contra seu corpo, como se estivesse me mandando ficar quieta.

- Para onde você está me levando? - Ele demora um pouco, mas então responde.

- A coleta está quase terminando, você logo não terá mais utilidade. - A sua voz grossa ainda está falha, porém mais compreensível do que era antes.

- O que você quer dizer com isso? Me deixe ir! Por que fazem isso comigo? - Falo me alterando um pouco.

Continuo a tentar me soltar, mas paro assim que vejo que chegamos à torre negra, na qual ele entra e vai subindo, lá dentro é bem escuro, não consigo enxergar nada de início, mas logo meus olhos parecem começar a se acostumar. Ele continua até que após um tempo para e empurra uma porta, então ele entra em uma sala mais iluminada.

A luz nessa sala era muito fraca, vinha de apenas algo que parecia uma planta estranha, pelo menos não estava um breu total. Olho em volta e me surpreendo com o que há dentro da sala e pelo som que ele faz, também não esperava aquilo.

- O que vocês estão fazendo aqui?! - Ele fala com um tom claramente ameaçador dirigido aos dois seres a sua frente, porém meus olhos focaram nos dois garotos jogados no chão do lugar, mas logo minha atenção volta ao ser que responde.

- Então finalmente resolveu voltar, Relicta!

PesadelosOnde histórias criam vida. Descubra agora