A menina

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Saio dali rapidamente com lágrimas nos olhos. Paro na frente de uma pequena casa, sento no degrau da pequena escada que lá tinha e começo a chorar. Aquele desenho existia. Eu sei. Eu o vi. Eu não sou louca.

Instantes depois, uma mulher abre a porta com um olhar preocupado.

- Está tudo bem, menina? -ela diz tocando minhas costas.

- Não sei. -respondo entre soluços.

- Entre, tome um chá  e se acalme. -ela segura minha mão para me ajudar a levantar.

Entro naquela pequena casa. A decoração era simples e o ambiente era super agradável.  A mulher me guia até  a mesa onde o chá e algumas bolachas estavam.

- Qual é o seu nome, querida? -pergunta ela me fazendo sentar na cadeira que era feita de madeira.

- Kalina.

- Você  é  daqui? Não  parece ser japonesa. -diz ela sorrindo.

- Nasci no Japão, minha mãe  é  ocidental, meu pai é  japonês. 

- Entendi. Quer me dizer o motivo de estar chorando lá  fora? -ela coloca um pouco de chá em uma xícara  de porcelana branca e me entrega.

- Peço perdão por ter ficado na porta da sua casa. Eu estou preocupada.

Conto toda a história de como meu pai fugiu. Não conseguia  decifrar o seu olhar, mas de algum modo me senti acolhida.

- Não se preocupe, você  vai achar seu pai. E vamos torcer que ele ainda não tenha chegado na floresta. Tome um pouco de chá, precisa comer para aguentar essa longa caminhada.

- A floresta é  muito distante daqui? -pergunto após  dar um longo gole no chá. 

- Não muito, mas é  perigoso.  Antes de partir passe aqui para eu te dar comida para você  comer durante  a viagem.

- Não  se preocupe com isso.

- Eu insisto.

Dou um leve sorriso, tomo um longo gole de chá e como algumas bolachas. De um certo modo aquilo me fez bem. O nome da mulher que me ajudou é  Minah, viúva e mãe de um menino de dez anos. Agradeço mais uma vez a sua ajuda e volto para o Hana.

Chegando lá vou diretamente para o meu quarto e arrumo minhas coisas rapidamente, apesar de não  ir embora naquele momento. Decido dar mais uma volta naquela agradável vila.
Suas ruas estreitas e casas de madeira dão  àquele lugar uma sensação de simplicidade.  Enquanto caminhava, pessoas me olhavam com curiosidade, não  era todo dia que uma pessoa com características ocidentais passava por ali.

Crianças brincavam alegremente, correndo e pulando por todo lugar, com exceção de uma menina que estava sentada num cantinho observando os outros brincarem, seu olhar era triste, ela queria brincar, mas parecia que não  podia. Me aproximo e ela me olha confusa.

- Olá, menina -digo sorrindo me agachando para ficar na mesma altura que ela.

- Olá, moça -diz ela tímida. 

- Por que não  vai brincar com eles?

- Não  estou com vontade. -diz ela olhando para eles.

- Fizeram algo para você?

- Mais ou menos. Dizem que eu sou maluca.

- Eu conto  sobre o que aconteceu comigo, e conto histórias  sobre a floresta  Aokigahara. 

- Floresta Aokigahara? O quê sabe sobre ela? -falo num tom quase desesperado. 

- Por que quer saber? -ela me olha.

- Meu pai está  lá -engoli seco.

- Ele morreu? -ela pergunta me olhando nos olhos.

- Não  sei... Estou atrás  dele.

- Aquela floresta é estranha, não  deveria ir.

- Mas o meu pai está  lá. 

- Ou não -diz ela brincando. 

- Você  não  respondeu a minha primeira pergunta.

- Você deve me achar louca também.  -ela baixa a cabeça. 

- Eu não  sou diferente  de você. Pessoas me chamam de louca também. 

- Sério? Você  vê coisas estranhas também?

- Sim -dou um leve sorriso.

- Você  é  igual a mim. -ela sorri fazendo com que seus olhos formem uma linha fofa.

- Pode me contar o que sabe sobre a floresta?

- Qual é  o seu nome?

- Kalina. Responda a minha pergunta. 

- Eu me chamo Hamada. Existem algumas histórias sobre a floresta.  Ela é  famosa por ocorrer muitos suicídios  lá, por isso que também  é  chamada de A Floresta do Suicídio. Tem uma história  de quando alguém entra na floresta sem o intuito de tirar a própria  vida escuta vozes, pedidos de socorro das pessoas  que lá  morreram, e às vezes é  atacado por animais que nem a ciência descobriu. 

Ela suspira e continua.

- Quando alguém  morre lá, sua alma fica  vagando pela floresta esperando alguém  que a salve daquele lugar. Que a traga de volta à vida. A natureza daquele lugar é  peculiar. O ar que respira, o solo que pisa e as árvores  que vê  a fazem ter alucinações  e ouvir coisas fora da realidade. A energia emanada de lá  não  é  boa. Você  pode ir e se arriscar, mas tenha cuidado.

- Como sabe de tudo isso? -pergunto sem acreditar no que ela acabou de dizer.

- Eu vivenciei tudo isso, Kalina. -diz ela séria. 

- Então, por que está  aqui? -pergunto 
- Eu não  estou. -ela sorri novamente. 

-Mas eu estou te vendo.

- Às  vezes a nossa mente nos faz ver coisas que não  são  reais.

- Pare de brincadeira! Diga aonde mora, vou levá-la para casa. Deve estar doente.

- Por que se nega a aceitar isso? -ela ri.

- Me diga aonde mora. Vou levá-la para sua mãe. 

- Pode ir sozinha. Pergunte para qualquer pessoa dessa vila sobre mim,eles vão  te contar tudo sobre a minha morte. Tire suas próprias  conclusões. 

Ela sai andando, e equanto caminhava vi seu corpo desaparecer. Me levanto incrédula, minha cabeça  estava uma confusão, não  sabia mais no que acreditar. Me sinto tonta. Eu a vi. Eu a escutei.  Qual é  o problema comigo?
Vejo um grupo de senhoras conversando. Lembro do que ela me disse. "Pergunte para qualquer pessoa sobre mim." Respiro fundo e vou na direção  das senhoras.

- Com licença, senhoras -digo um pouco tímida. 

Elas param de conversar imediatamente e me olham um pouco incomodadas, mas curiosas para saber o motivo de eu ter interrompido sua conversa.

- Sim? O que deseja, querida? -pergunta  a senhora mais velha.

- Eu estou de passagem por aqui e queria ver uma pessoa. Mas não  sei aonde ela mora.

- Diga o nome. -disse a senhoa mais baixa.

- Hamada. Uma menina. Sabem onde ela mora?

Elas fizeram uma expressão  de espanto seguida por uma expressão  de pena. Rostos  tristes  se fizeram presentes.

- Você  não  sabe? -perguntou a senhora mais alta.

- Sobre? -perguntei de volta. 

- Hamada morreu há  dez anos.

 




A Verdade Não Contada - JungKook -Onde histórias criam vida. Descubra agora