Capítulo Trinta e Seis

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Capítulo Trinta e Seis

A princesa Oksanna tinha arriscado a sair de seus aposentos pela primeira vez, e o sentimento que dominou seu corpo fora um tanto incomum. Na realidade, temia do que poderia ver além daquela suíte real que ninguém atreveu-se tirá-la, mas fora tranquilizada quando notou que nenhuma diferença saltante aos olhos existia, senão o fato de que Nassor Diámat já não marchava mais por aqueles corredores, ao menos, não em liberdade.

Assim como tinha dito a Comandante Eklissi, nenhum soldado estava na sua porta. A princesa andou lentamente pelos vazios corredores do castelo de calcário, talvez estivesse muito cedo para ver alguém. Vagou cuidadosamente pelo seu andar, esperando encontrar alguém que conhecesse, gostaria de pedir permissão para ver Rara, desejava arduamente rever sua companheira, mas o jardim que costumava morar era distante. E temia ser pega passeando sem permissão, desconfiarem de suas intenções, e ser machucada...

Oksanna parou diante um salão, onde outrora, seu marido tinha lhe disponibilizado como um ateliê particular na qual a princesa não pôde desfrutar por muito tempo. A porta estava entreaberta, e ao espreitar o âmbito interior, notou que estava vazio. Penetrou cautelosamente na peça empoeirada, onde grandes lençóis pendiam sobre as janelas, para que a luz do exterior não adentrasse, fazendo com que ela visse diante seus grandes olhos, a poeira valsar no ar.

Quis deixar que a luz diurna banhasse a bela decoração do ateliê, preenchido com velhas telas e tinta, mas por reflexo, proibiu-se, pensando que se Nassor mandara fechar o local, não era mais bem-vinda ali, logo os lençóis não poderiam ser retirados. A escuridão deveria prevalecer, do contrário, haveria punição...

Repentinamente, a princesa arfou, com um olhar marejado. Seu marido estava preso, mas ainda assim, ela vivia na sombra do medo, e de todos os sádicos horrores que ele lhe infligiu...

Inspirando fundo, Oksanna foi levada pelo impulso de seguir até a janela e puxar os panos que tapavam a luz, deixando-os cair e provocando um vento assim como um barulho. Seu corpo estremeceu e seu coração disparou, estava levada pela pura adrenalina por um pequeno e simples gesto. Subitamente, estava rindo, e chorando, porém as lágrimas que caíam de seus olhos resultavam de uma mistura de tristeza, medo e alívio pelo que estava vivendo.

Marcus Viana - A Miragem (instrumental)

As partículas de poeira valsavam delicadamente na corrente de vento, levando-a numa doce memória de quando era apenas uma garotinha, e gostava de dançar com as ondas de poeiras que existia no castelo de Helsker, levadas pelo vento, criavam uma terna harmonia e fazia a menina dançar, timidamente e feliz no seu pequeno mundo.

Ela levantou delicadamente o braço e girou suavemente sua mão, observando atentivamente as partículas de poeira seguirem seus movimentos. Em seguida, criou uma melodiosa balada em sua mente. Virou lentamente sua cabeça, sentindo todo seu pescoço deslizar, era dolorido, porém, de alguma forma, libertador. Um sorriso vacilou nos seus lábios rapidamente, e ela estremeceu, incerta do que estava fazendo. Uma tempestade de areia de sentimentos e sensações invadiu seu corpo, Oksanna estava aterrorizada, porém algo lhe fez continuar e este talvez fosse a vontade de sentir a liberdade retornar ao seu comando. Rodopiou pela sala, e balançou seu corpo no perfeito ritmo da sua melodia, mexia delicadamente os membros ainda recuperando dos profundos ferimentos deixados pelas mãos de seu marido.

Outrora, a arte da pintura e da dança sempre tinham sido seu refúgio pessoal para todos os problemas de sua vida. E até mesmo aquilo, Nassor Diámat tinha destruído. Por isso, poder tornar a dançar naquele momento era como se tornasse a sentir a vida escalando sua pele e revigorando o imenso vazio deixado pela perda da filha.

Ceres - O Retorno Da Escuridão [LIVRO 3 - COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora