Capítulo 3

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Ryan tornou a verificar as horas. Paula não chegava, e aquela preocupação o atormentava. Enquanto Kiki vivia se atrasando, tanto que quase perdeu o vôo naquela manhã, a pontualidade era sagrada para Paula.
E eles deviam ter se encontrado no píer trinta minutos atrás. Elliott não sabia de seu paradeiro. Confessou ter estado o tempo todo verificando provas e trabalhos feitos por seus alunos. Como Paula, que tinha tanto interesse por tudo e por todos, podia considerar casar-se com alguém igual a ele?
Nada houve entre Ryan e Kiki. Em vez de aproveitar a siesta para dormir, ela preferiu se trancar no banheiro para tratar da pele e cuidar das unhas.
Ryan, por outro lado, empenhava-se em procurar tirar Paula da cabeça. “Não consigo pensar em ninguém mais com quem eu prefira partilhar minha primeira vez”, ela dissera.
Quantas vezes e com quantas mulheres Ryan acabara na cama por causa de semelhantes insinuações? Mas jamais com Paula. Ela nunca antes o fitou com um convite naqueles olhos amendoados. Sua voz jamais antes adquiriu aquele tom rouco ao dirigir-se a ele, nem o abraçou como se abraçasse um amante. E se Ryan tivesse algum juízo, teria seduzido Kiki durante a siesta e procurado esquecer a amiga de infância.
— Está vendo o que estou vendo? — perguntou Elliott.
Um movimento a distância chamou a atenção de Ryan, que olhou naquela direção. Uma loira sensual vinha caminhando devagar pela praia, os cabelos cheios de trancinhas, à moda jamaicana. Por um instante, Ryan notou algo um tanto familiar naquele caminhar confiante. De repente, mal conseguia respirar. Aquelas trancinhas, aquelas pernas... No espaço de um segundo, sua imaginação a pôs nua em cima dele, com aquelas pernas deliciosas envolvendo-o pela cintura.
— Paula de fato possui pernas fantásticas.
Paula? “Paula?! O que...” Ryan tirou os óculos escuros. Não admirava ele ter reconhecido seu caminhar. Tornou a colocar e a tirar os óculos, mal notando Kiki vindo junto com Paula.
Quando ela passou ao lado de uma quadra de vôlei de praia, o rapaz junto à rede se virou, desajeitado, para observá-la, de queixo caído. A bola acertou suas costas, atirando-o ao chão.
— Desculpem-nos pelo atraso. — Kiki passou o braço pelo de Ryan.
— Nós nos encontramos a caminho daqui. — Paula sorriu. — E então? O que acharam de meu novo visual?
Havia continhas coloridas presas na ponta de cada uma das tranças, que alcançavam seus ombros, o estilo acentuando as maçãs de seu rosto e os lábios cheios. A camiseta branca que usava sobre o biquíni oferecia um relance tentador dos seios perfeitos. Desde que chegaram à Jamaica, Paula não parava de surpreender Ryan, revelando todo tipo de coisas novas sobre si mesma.
— Gostei. É muito diferente... — Elliott a estudava com atenção. — Ficou muito bem.
— Mas o que deu em você para fazer isso?! — No minuto em que disse aquilo, Ryan se arrependeu.
No entanto, não estava acostumado àquela versão sensual de Paula despertando ainda mais suas fantasias.
— Ora, Ryan, não seja bobo e diga o que achou!
“Droga, feri os sentimentos dela!” A fantasia que teve com Paula voltou-lhe à memória. O que ele achava? Bem, àquela altura, se revelasse a verdade, a assustaria. E a si próprio também.
— Desculpe-me, Paula, Só não estou acostumado a vê-la desse jeito. Esqueça o que eu falei. Você ficou linda.
— Também acho. Eu faria o mesmo se tivesse essa sua adorável estrutura óssea — comentou Kiki.
Elliott sorriu, e fitando o top do biquíni da namorada de Ryan.
— Não vejo nada de errado com sua estrutura.
Kiki se envaideceu. As sobrancelhas de Paula arquearam-se sob os óculos de sol.
Elliott era um idiota, Ryan decidiu. Por que flertava com Kiki diante de sua namorada, uma mulher tão adorável?
Paula gostava de planejar o próximo passo que daria, mas Ryan se agarrava a qualquer oportunidade que se apresentasse. Kiki e Elliott...
Ryan ficaria mais do que feliz em dar a Elliott corda bastante para que se enforcasse. Se o professor continuasse se insinuando para Kiki, ele não teria de se preocupar em ver Paula sendo conduzida pela nave da igreja para se casar um tolo. Tudo o que Ryan precisaria fazer seria oferecer um pouco de encorajamento, atirar um nos braços do outro e apenas observar.
Elliott não merecia Paula, e Ryan estava prestes a provar isso.
Claro que não pretendia levar as coisas adiante com a cientista. Uma semana de praia, sol e mar sem sexo era um preço pequeno demais a pagar, para evitar que Paula cometesse o maior erro de sua vida.
Ryan atirou a chave do jet ski para Kiki.
— Você e Elliott ficam com o número vinte e sete. Nós ficaremos com o vinte e oito.
Entusiasmadíssima, Kiki montou no jet ski e acenou para Elliott.
— Vamos lá, estou ansiosa! Há muito tempo não pego um virgem.
Elliott acomodou-se na garupa e enlaçou Kiki. Dada a diferença de altura, suas mãos pousaram bem debaixo dos seios redondos. Kiki ligou o motor.
A brisa soprando do mar espalhava uma mistura potente de filtro solar e do perfume de Paula. O que estava havendo com ela naquele dia? Seria a atração pelo desconhecido que fazia o coração de Ryan bater forte como o de um adolescente se preparando para o primeiro encontro? Quando se acostumasse com aquele seu novo penteado, talvez tudo se normalizasse.
— Eu diria que Elliott está bastante entusiasmado com Kiki, e ele ainda não bebeu... Não concorda comigo? — Paula indagou, o que soou com um toque de asperidade aos ouvidos de Ryan.
Com o braço pressionado junto à cintura de Ryan, ela acabava com sua serenidade.
Kiki acenou de longe.
— Ei! Venham juntar-se a nós!
Ryan também fez um aceno.
— Tem razão quanto a Elliott, Paula. Neste exato momento, ele parece apreciar muito o fato de estar agarrado a Kiki. E sou capaz de jurar que ela não se importa.
— Você se importa?
— Nem um pouco. Entre nós dois nada existe além de uns poucos encontros.
Ryan não iria ficar sentado observando Paula cometer o maior erro de sua existência casando-se com Elliott. Conhecia bem aquela tolinha e sabia do que ela era capaz quando decidia seguir um objetivo à risca.
— Por favor, me ensine como pilotar esta coisa. — Paula reuniu as trancinhas e as segurou na nuca. — Vamos lá?
A última coisa que Ryan queria era ver Paula competindo com Kiki por Elliott. Mas se ele, Ryan, distraísse sua atenção, flertando com ela como fizera naquele dia no almoço... Bem, era o que sabia fazer de melhor, embora com Paula ele jamais tivesse tentado. Porém, conseguiria fazer aquilo. E se, no fim, ela desistisse de se casar com Elliott, essa seria a melhor das recompensas.
Paula tirou o frasco de protetor solar da sacola.
— Por favor, passe isto em minhas costas, Ryan. Eu não alcanço, e Elliott não está aqui para me ajudar... — Tirou a camiseta e estendeu-lhe o vidro. — Não quero me queimar demais no primeiro dia. Na verdade, prefiro não me queimar.
Ryan ficou paralisado. Que Deus o ajudasse... Em toda a praia, as mulheres usavam biquínis menores e bem mais reveladores, mas nenhuma ficara tão bem como Paula. Um lento calor começou a arder em seu abdome e se espalhou por todo o corpo.
— Ryan? — Ela balançou o frasco diante de seu rosto. — Vai me ajudar com isso ou terei de pedir ajuda aos jogadores de vôlei?
— De modo algum. Vire-se.
Ryan derramou uma generosa quantidade de protetor solar na palma da mão e devolveu-lhe o vidro por sobre o ombro. Esfregou as palmas e parou-as no ar. “Controle-se, homem. Essa é Paula. E acabe logo com isso!”
No instante em que tocou a pele delicada ele se deu conta de que subestimara aquela tarefa. Suas mãos e a ponta dos dedos pareciam ter vontade própria, massageando, às vezes acariciando. Ainda bem, considerando que seu cérebro parara de funcionar.
Deslizou por sob a alça do biquíni. Paula estremeceu, e a resposta repercutiu dentro dele. Cuidando para não deixar um só centímetro de pele sem proteção, Ryan correu as mãos por sua espinha, indo até abaixo da cintura.
Outro estremecimento dela. Paula era tão sensual, tão sensível a seu toque... E pensar que tocara apenas suas costas.
Ryan conteve uma ânsia insana de escorregar as mãos por sob a calcinha do biquíni e massagear-lhe as nádegas. Assim, sussurraria doces palavras em seu ouvido, até Paula ansiar por um lugar isolado naquela praia onde pudesse realizar sua fantasia com ele. Talvez se fosse outra mulher... Mas aquela era Paula.
E Paula queria apenas que Ryan passasse creme protetor em suas costas, não que ficasse fantasiando a seu respeito.
Desse modo, Ryan deixou cair as mãos e, mais uma vez, lembrou a si mesmo que aquela era sua melhor amiga. Amiga, e não mulher, advertiu à própria libido, à própria mente e a todas as partes de sua anatomia.
Paula o encarou.
— Já chega. Vamos? Não quero continuar virgem.
Ryan teve de fazer força para não deixar escapar um gemido.

Paula verificou as horas. Onze. Após o vôo e toda a agitação da corrida de jet ski naquele mar azul-turquesa com Ryan, devia estar exausta. Em vez disso, sentia-se mais cheia de energia do que nunca.
Apesar do horário, a noite continuava plena de promessas. No jardim, os pássaros noturnos cantavam chamando, um ao outro, e a brisa chegava até ali impregnada pelo perfume das flores e das ervas exóticas.
A ritmada música caribenha ecoava do clube dentro do hotel, o Jungle Room. Paula passou o braço pela cintura de Elliott, seus quadris instintivamente respondendo ao ritmo. Animada, se ela dirigiu a Ryan e Kiki.
— O que acham de dançarmos um pouco?
Kiki agarrou a mão de Ryan e puxou-o em direção ao hotel.
— Excelente idéia! Vamos ao clube.
Elliott, após ter tomado três taças de vinho durante o jantar, demonstrou mais entusiasmo do que talento ao ensaiar alguns passos.
Paula tentava acompanhá-lo e ria.
— Não sabia que você gostava de dançar, Paula — Ryan comentou enquanto ele e Kiki os seguiam.
Paula notou, naquele dia que, por mais que ela e Ryan se conhecessem, havia muito que desconheciam a respeito um do outro. Através dos anos, enquanto discutiam sobre seus respectivos relacionamentos, evitavam qualquer comentário sobre a sensualidade de cada um. Quando Ryan passou protetor solar em suas costas, Paula descobriu um novo lado dele. E também de si mesma. Seu toque sensual quase a virou do avesso.
— Talvez existam duas ou três coisas sobre mim que você desconhece... — Paula lançou as palavras por sobre o ombro.
Por mais que tentasse manter uma entonação casual, não pôde evitar um toque sutil de provocação.
— Vocês são amigos há muito tempo, Paula? — Kiki quis saber.
— Vinte e quatro anos.
O volume da música aumentava à medida que se aproximavam do clube.
— E nunca se cansam um do outro?
“Nunca!” Ryan era a pessoa mais interessante que Paula conhecia.
— Não.
— Não.
A resposta dos dois foi simultânea.
Elliott aumentou a pressão no ombro da namorada, puxando-a para mais perto.
— Paula pode não se cansar, mas eu, sim. Ele está sempre por perto. — Elliott se queixou para ninguém em particular. — Sem ofensa.
Ryan achou graça do comentário.
— Fique tranqüilo, Elliott. Não me ofendo com facilidade.
— Vinte e quatro anos e vocês nunca...
— Nunca — Paula logo assegurou.
Não que Kiki se importasse, estava apenas curiosa. Era como se a amizade deles fosse uma esquisitice a ser dissecada. Talvez em outra noite e em outro lugar Paula tivesse ficado ofendida com a atitude da jovem. Mas não ali e naquele momento, quando o calor e o ritmo alucinante despertavam-lhe pensamentos lascivos.
Kiki parou a alguns passos da porta do clube.
— Vinte e quatro anos e nenhum dos dois jamais tentou? Desculpem-me, mas não dá para acreditar.
Em uma ou duas vezes, Paula também não acreditou. E, desde que chegaram à ilha, sentia a tendência, a sutil provocação entre ela e Ryan. No entanto, não confessaria aquilo só para alegrar Kiki. Balançou a cabeça, rindo da insistência dela.
Elliott interveio:
— Creia: eles são como dois irmãos.
Na claridade fornecida pela chama da tocha, Paula fitou Ryan, o ar preso na garganta, o sangue correndo mais rápido nas veias. O olhar que ele lhe lançou deixou claro que a queria consigo.
Em um dia normal, aquela idéia a aterrorizaria. Mas não havia nada de normal, ou de racional, na noite jamaicana. Aquilo a excitou.
— Acho que minha irmã está querendo dançar.
Entraram no Jungle Room. O ar carregado de perfume e fumaça de cigarro os recebeu. Casais lotavam a pista. A melodia alta e de ritmo empolgante contagiou Paula, impedindo conversas e acabando com inibições.
Os quatro juntaram-se à multidão aglomerada, e Paula rendeu-se de vez, girando, ondulando, seu corpo respondendo ao ritmo com movimentos sedutores, a música dentro dela, impelindo-a em direção a um lugar além de suas usuais fronteiras.
Em minutos, a aglomeração pareceu ter engolido Kiki e Elliott. Ryan, no entanto, continuava ali. Paula chegou mais perto dele, ainda dançando, a boca junto a seu ouvido para poder ser ouvida.
— Onde estão Kiki e Elliott?
Ryan deu de ombros e meneou a cabeça.
— Não sei. Está preocupada com eles?
A boca carnuda, o fogo do desejo cintilando em seus olhos, seu corpo musculoso contra o dela na confusão da pista, a batida implacável da música, tudo aquilo a empolgava. Paula enlaçou o pescoço de Ryan, num convite irresistível. Então, recuou, sorrindo, maliciosa.
Com as pupilas brilhando com intensidade, ele aceitou o desafio e seguiu-a.
A pista oferecia uma oportunidade única de seduzir sem conseqüências. Dançando, Paula cruzou a linha de que jamais considerou sequer se aproximar.
Em meio àquela atmosfera de sonhos, pareceu a coisa mais natural do mundo para Ryan puxá-la contra si. Paula, audaciosa, exigiu um beijo. Ryan gemeu contra seus lábios, as mãos moldando suas costas.
Paula rendeu-se à fervente fusão. Cerrou as pálpebras enquanto ele, com a língua, explorava sua boca. Abraçando-o com mais força, sentiu-o pulsar da excitação dele contra si. Uma paixão febril fluía através dela. Onde a febre de Paula terminava e a dele começava, não dava para saber.
Ryan, de repente, interrompeu o beijo.
— Paula?
Com os olhos ainda fechados e devastada pela paixão, ela deslizou a ponta da língua pelos lábios intumescidos.
O que dera nela? O que estava fazendo? Aquele que a incendiava a ponto de enlouquecê-la era Ryan, seu melhor amigo!
— Desculpe-me... Eu não devia...
E, tendo ultrapassado a fronteira para um lugar do qual não havia retorno, Paula fez o que qualquer covarde teria feito.
Deixou-o parado ali e saiu correndo.



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