— Hmm... - o som que escapou dos lábios do rapaz dançava sobre a linha tênue entre o resmungo e o gemido e fez a mulher soltar um risinho soprado pelo nariz. As sobrancelhas dele se uniram em desagrado enquanto, com os olhos ainda cerrados, buscava uma das mãos dela e a trazia de volta até o local onde estava anteriormente - e de onde não deveria ter saído: embrenhada em seus cabelos - Continua... - disfarçou o protesto de um pedido manhoso, tornando-se cada vez mais ciente, ainda que não de forma racional, dos lugares aos quais aquele tom era capaz de lhe levar, com ela.
— Eu só estava me servindo... - Bárbara justificou, permitindo-se uma risada e terminando servir o vinho com a mão direita, enquanto a esquerda se ocupava de brincar com os fios negros dos cabelos do garoto deitado em seu colo. Começou um carinho lento, retomando a cadência anterior, e a expressão satisfeita que seus toques desenharam sobre o rosto dele fez um sorriso nascer nos lábios cheios da mulher, que tocavam a taça - Quem eu preciso culpar por você ser tão mimado, hm? - não conseguiu conter a provocação, apertando de leve a pontinha da orelha adornada com duas argolinhas prateadas enquanto aguardava pelo sorriso gostoso e arteiro que despontou de imediato nos lábios dele.
— Os hyungs... - Jungkook respondeu de pronto, já esperando a gargalhada sonora de Bárbara preencher seus ouvidos, e a casa inteira, porque era sempre assim o riso dela: expandia-se pelo ambiente, ocupando cada cantinho, até que você não tivesse outra escolha que não sorrir também - E você também, noona. - os olhos dele buscaram os dela, brilhando em divertimento.
— Eu sou, né? - Bárbara suspirou ao assumir sua própria culpa, passando os dedos pela franja do garoto até tirá-la do caminho, deixando livre o rosto cuja perfeição dos traços já estava gravada na memória muscular de seus dedos ao desenhá-lo, e que já parecia tatuado em suas retinas. Jungkook se ajeitou sobre as pernas dela, abraçando uma das coxas enquanto se aconchegava para que a mulher continuasse o carinho demorado em seus cabelos - Sabe como se chama isso em português? - a mulher perguntou baixinho, depois de tomar mais um gole de vinho, pouco a pouco tingindo seus lábios com a cor do líquido que esquentava suas veias e corava sua pele - Cafuné.
— Cafuné? - Jungkook repetiu, arrancando uma risadinha de Babi pela pronúncia atropelada. Ele franziu o topo do nariz, deixando os dentes à mostra em um sorriso de estranhamento, experimentando a palavra mais uma vez, até que ela soasse mais como na voz dela - É engraçado... - concluiu que gostava mais do gesto do que da sonoridade, ainda que tudo o que Bárbara dizia em português, por algum motivo, parecesse ter um certo apelo - Mas noona, uma palavra só quer dizer isso tudo? "Fazer carinho no cabelo de outra pessoa"? - perguntou, erguendo as sobrancelhas em curiosidade genuína.
— Acabou o disco, deixa eu trocar... - Bárbara sorriu, fazendo suspense ao deixar o garoto sentando com as pernas cruzadas sobre a cama, abraçando uma almofada em seu lugar. Jungkook parecia lindo ali, com os cabelos um pouco crescidos revirados por seus dedos, a camiseta larga levemente puxada sobre os ombros, deixando expostos os braços que se tornavam cada dia maiores sob seus dedos, e as bochechas avermelhadas do vinho. Tão lindo, o seu garoto.
Caminhou até o toca-discos que era seu maior xodó (outro termo precioso que guardava com carinho na ponta da língua ao falar no idioma materno), tirando dali o vinil do Oasis que vinha tocando pela última hora e procurando outro que casasse com a noite preguiçosa e com aquela estática palpável entre eles.
— Sim, uma palavrinha pra dizer isso tudo... - explicou, abrindo um sorriso porque depois de anos lidando com idiomas diversos, aprendera a admirar os pequenos detalhes que fazem de cada língua peculiar e especial - Segundo dizem, não existe nenhuma tradução pra isso, em qualquer outro idioma do mundo....
— Eles dizem isso sobre "jung"... - Jungkook responde, lembrando-se daquela informação cuja origem não se recordava tão bem, os olhos escuros que, no quarto pouco iluminado, pareciam brilhar ainda mais.
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DECALCOMANIA • Jeon Jungkook
Short StoryAinda que não fosse capaz de se lembrar da primeira vez em que teve um pincel entre os dedos, Bárbara nunca se esqueceria do dia em que compreendeu, enfim, o que era arte. Até então, sua ideia era que o artístico estava na alma, e não no amor. Afina...