Cap. 1

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    Grum ainda era jovem quando deixara sua cidade natal. Quer dizer, alguns ainda o viam como jovem demais para tal decisão, porém para outros, a idade de 19 anos já o fazia um adulto, responsável por seus caminhos e escolhas, ainda mais para os que não gostavam dele morando lá. Para falar a verdade, ele não era uma criatura sociável ali, mas era humilde, e tinha um grande coração.

   Ele vem de uma família de 7 filhos, sendo 3 irmãos e 4 irmãs, sendo o mais novo entre eles. Não era mimado, mas ao contrário, muito de seus irmãos não gostavam dele por achá-lo estranho ou chato. Afinal, todos eram alegres, tocavam e dançavam juntos com todos os outros da aldeia. Não sabiam o que havia de errado no irmão para não gostar de tais coisas. Porém, dentre os irmãos, havia um que lhe era mais chegado. Este era Taah, o 5° filho. Eles frequentemente exploravam a floresta pelo incentivo do mais velho, e assim se metiam em encrencas que acabavam chegando a aldeias vizinhas de outras espécies, e esse com certeza foi um dos grandes motivos pelos quais os outros os repugnavam, de certa forma. Ao crescer, sempre compartilhara suas idéias com o irmão, incluindo a ideia da futura viagem. Desta vez, porém, o outro não poderia acompanha-lo. Havia se tornado um dos líderes da aldeia, e mesmo não concordando, teve que deixá-lo ir. Nunca viu os olhos do irmão tão brilhantes como naquele momento de partida. Talvez fossem lágrimas, ou ansiedade... 

   Finalmente arrumou as malas e pôs-se a viajar. De primos distantes a totais desconhecidos, as paisagens e seus habitantes mudavam conforme suas próprias formas. Todos eles tinham suas maravilhas e seus perigos naturais, e por mais imprestável que parecesse, sempre existiam criaturas que moravam no lugar. Algumas se viam generosas, oferecendo comida e um lugar para passar a noite para que prosseguisse sua viagem no outro dia. Outros, porém, caçaram-no pensando ser um rival tentando roubar ou atacá-los. Alguns se afeiçoaram a ele de tal maneira que, até mesmo o ofereceram uma casa para morar na região, mas mesmo sendo tentador, por muitas vezes negou, pois seu verdadeiro objetivo era encontrar um lugar ainda inabitado onde pudesse construir seu lar com as próprias mãos. A viagem prolongou-se por 1 ano quando finalmente alçou seus olhos que, brilhantes, admiravam a paisagem daquela floresta, finalmente inabitada, que se tornaria em pouco tempo sua nova casa.

   A terra era fértil, com uma notável diversidade de plantas e animais, inclusive que nunca ouvira falar antes. Chamou a floresta Gauender, uma junção de palavras que descrevem algo incrivelmente agradável e produtivo. Como algo "maravilindo" na nossa língua. Em seus primeiros meses percebeu que novos animais apareciam de tempos em tempos, curiosamente sempre feridos de alguma forma, ou em sua maioria, velhos. Com o passar dos dias aprendeu a se comunicar com todos os bichos da floresta e decidiu criar uma aliança para manter a paz entre todos. Aos mais perigosos, jurou não aborrecê-los se, em troca, não o aborrecessem. Eles poderiam continuar a sobreviver do seu jeito, porém se caçassem algum dos recém-chegados bichos que estariam machucados, ele os vingaria por não terem chance de defesa. E quanto aos machucados, jurou cuidar deles, e sem querer se apegava a cada um, e quando morriam, os enterrava para que não fossem devorados pelos insetos e larvas nojentas que aparecem no sepulcro. E assim o acordo foi feito.

    Na verdade, ao redor dali existiam outras criaturas, mas elas não se atreveriam a chegar perto do famoso riacho das lendas que fazia a divisa norte-sul da floresta. Grum foi alvo de vários avisos destas criaturas para que não seguisse para lá. Existia uma lenda de que monstros vinham e envenenavam a água, roubavam animais e destruíam o que viam pela frente. Isso se seguiu por muito tempo até que as criaturas, furiosas, planejaram um ataque aos monstros, que pararam de vir, porém de vez em quando avistam alguns deles, mesmo não tão violentos quanto antes, mas ainda assim preferem manter-se receosos. 

 Em tempos de chuva o riacho enchia, tornando-se um largo rio onde animais de todas as espécies e direções vinham e bebiam dele, e era a época em que presas e predadores viviam em certa paz para conseguir beber e saciar sua sede perdurada por todo o dia. Em épocas secas, porém, era o contrário. Ele se tornava um pequeno córrego ou simplesmente desaparecia. Presas que se aproximavam tinham grande chance de serem pegas. Foi chamado então de Hanececk Sokwicia, ou "Saciador das épocas". Em alguns trechos ao longo do rio existiam pequenas estradas de pedras escorregadias que poderiam servir como caminho para quem se atrevesse a atravessá-lo.

    Algumas criaturas se atreveram e seguiram o caminho para o norte. Diziam que no final existiam duas entradas de pedras, mas apenas aquela mais á direita era por onde os monstros saíam e entravam. Muitos dos que se arriscaram nunca mais foram vistos retornando, provavelmente sendo mortos por eles. Os que viveram para contar história, porém, viraram lendas em suas aldeias, como campeões. Uma dessas criaturas, a mais conhecida, era Pan, que era da mesma classe e espécie que Grum, fazendo com que isto fosse seu ponto de referência por ali.

   Apesar dos avisos, muitas vezes ia e passeava por suas margens à procura de novos animais que poderiam surgir do outro lado, e quando não havia nenhum, imaginava-se como um guarda da floresta, marchando de um lado para o outro esperando por algo. Talvez também fizesse isso por saudade da infância, quando ficava com Taah admirando qualquer coisa. Independente do que fosse nunca era chato por causa das boas conversas entre os dois.

   No começo do dia fazia seu caminho entre as árvores até chegar ao riacho, e assistia ao lindo nascer do sol, com o vento matutino suavemente frio com tons de azul-alaranjados no céu, onde a lua ainda se despedia ao oeste, e ao leste o sol chegava com seus beijando a terra com seus primeiros raios que projetavam sombras entre as árvores, enquanto os pássaros já começavam a cantar suas primeiras melodias do dia. Agora até mesmo alguns animais o seguiam, já esperando que viesse, principalmente os que receberam seus cuidados no início. Taah o acharia engraçado agora! Pelo menos é o que ele pensava.

Sem perceber, mais um ano já havia se passado



As crônicas de Grum - TesteOnde histórias criam vida. Descubra agora