Cap. 2 [parte 2]

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   Depois de viver por um ano na maravilhosa floresta, já estava desacreditando na famosa lenda dos monstros da divisa. Afinal, nunca tinha visto tais monstros, e tudo parecia normal até então. Sua teimosia era tanta que a atravessava quando via um animal que estava realmente ferido, e que não conseguiria atravessar sozinho.

  Em seu tempo na floresta acabou por fazer amizade realmente  improvável: um orc intimidador, que mostrou-se solitário e gentil. Seus encontros se davam quando colhia as uvas da videira que ficava quase no final da floresta, sendo cercada por paredes de terra da chapada que ficava á frente e os pés dos muitos vales que se estendiam á frente. Também conseguiu fabricar uma pequena flauta de pan, e tocá-la era um de seus passatempos preferidos. Os animais à sua volta dormiam tranquilamente quando se punha a tocar. Tentava reproduzir as músicas de sua tribo, mas agora, a primeira vez que tocara, não entendia o por quê se deixava perder um sentimento tão imenso crescendo em seu coração pelas lindas melodias que saíam de um instrumento tão simples, e ainda melhor, estes sons eram feitos por ele!

   Uma nova manhã começa, e Grum faz sua caminhada até o riacho para observar a paisagem e se aconchegar com os animais. Mesmo que fizesse isso todo dia no mesmo lugar, nunca se cansava de fazê-lo, afinal algo sempre mudava: sejam folhas caídas das árvores, novos peixes, ou simplesmente as nuvens com formatos diferentes. Cantando, Tocando, e as vezes dançando, aproveitando estes momentos como podia.

   Continuava com suas notas suaves, que sem perceber fizeram com que o tempo passasse muito rápido, e a tarde já tivesse início. Realmente, esqueceu-se de tudo: Comida, afazeres, sol, chuva... Quando de repente um dos animais ficou em alerta. Parecia estar procurando algo, olhando ao redor entre as árvores do outro lado do rio. Sua melodia era tão boa aos ouvidos que, com os olhos fechados, não conseguiria ouvir som ou movimento algum além dos seus... Até que um brado fino ecoou, e fez com que  se arrepiasse e finalmente percebesse que algo estava errado. Levantou-se rápido, não sabia se eram os monstros ou um animal machucado. Os outros animais fugiram e ficaram atrás das moitas, sem saber ao certo o que fazer, esperando que seus receios por alguma ameaça passassem. 

    De ambos os jeitos, seria melhor se armar e buscar o pobre animal que gritava por ajuda, como sempre fazia.  Apenas seguiu, sorrateiramente, para onde suspeitava ser sua fonte.

   Enquanto andava, atentava-se sem parar quase freneticamente à todas as direções, se precavendo para ataques repentinos, pois mesmo que já estivesse habituado a isso, não custaria nada ter cuidado Sua 'arma' era apenas um galho comprido, não muito grosso, que poderia ser usado como bastão ou para arrancar as frutas de galhos altos. Ou seja, muito útil. Depois de muito andar já perdeu as esperanças. Como um barulho tão alto poderia vir de tão longe? Não acharia nada mais que árvores e mais árvores, e então decidiu voltar.

   Continuaria o caminho se não fosse por um barulho de folhas e galhos sendo pisados a alguns metros. Sorrateiramente e da forma mais rápida, escondeu-se nas moitas, quase tropeçando ao fazê-lo. 

   -Uhhh -  resmungos de uma voz suave se aproximavam 

   Como não arregalar os olhos com surpresa naquele momento?  Aquilo era muito interessante, mas estava incerto de resgatá-lo. Afinal, não parecia um animal normal, como os outros.  De onde surgiu? Era semelhante a si... mas não igual, e era baixinho, com pelos mais claros que os seus. O que seria capaz de fazer? Qual sua espécie? Muitas perguntas como essas ecoavam em sua cabeça sem parar. Antes de qualquer coisa decidiu apenas observá-lo.

   A criatura ia de um lado ao outro, as vezes voltando para o mesmo lugar sem nenhum motivo aparente... E o dia já escurecia, e a criatura finalmente parou, provavelmente decidindo voltar para sua toca. O estranho é que ainda agora não seguia ao sul, mas sim ao norte, onde dizem ser o lar dos monstros. Será que teria um espírito aventureiro assim como Grum? Suas suspeitas subiam a cada passo.

   - Não vá por aí... Ah, o que estás fazendo? Não sabes que é perigoso?- Pensava consigo mesmo ao ver cada ação da criatura

   E chegaram então ao pé de uma ladeira. Ela olhou pra os lados, confusa. Arregalou os olhos quando encontrou algo na terra, e resmungou palavras inaudíveis por causa da distância, e logo devorou o objeto com atrocidade. Não era um animal , nem uma planta... o que poderia ser aquilo? Era comprido e claro, estava um pouco sujo de terra, algo que nunca vira antes. 

   Ela então continuou a andar, já subindo até o topo do pequeno morro, e Grum foi atrás com um pouco de dificuldade, mas por sorte sem fazer qualquer barulho. Alguma coisa se aproximava e ia em direção a ela por um caminho de terra estreita que não tinha plantas nem qualquer verde sobre si. Tudo parecia diferente.. afinal, seria aquilo alguma besta feita de madeira? Levava dois indivíduos, mais altos que a pequena criatura que já estava seguindo.

   E um deles levava um instrumento de cordas, e uma música animada chegava a seus ouvidos, e quis tocar junto, mas não pôde fazê-lo porque seu acompanhante logo desceu e agarrou a pequena, e parou o que fazia.

  Mais uma vez um grito foi ouvido, e descobriu que desde o início era ela que gritava. Não parecia se divertir, mas ao contrário se via apavorada, querendo fugir, mas sendo levada pelo maior. Grum não sabia o que fazer, e nesse momento só pensou em salvá-la e esqueceu que se escondia, fazendo com que as folhas o denunciassem, fazendo um som muito bem perceptivo.

  E pararam e fizeram silêncio, olhando para todos os lados, procurando de onde veio o barulho. A criatura mais uma vez gritou por ajuda, quando um coelho saiu da moita, e uma risada feia e alta foi ouvida.

 Naquele momento ele pensou se poderia fazer com que ficassem bons e parassem caso sua música aquecesse seus corações. Começou a tocar, e pararam, ainda do mesmo jeito que estavam, mas sem continuar o que faziam. Interessante, isso poderia ser usado para tirá-la de lá.

   Caminhou sob a sombra das árvores, ainda tocando, até se encontrar atrás deles. E quando parou suspiraram, e ao olharem pra trás viram-no e apavoraram-se como se vissem um demônio. A menina mais uma vez pôs-se a chorar.





As crônicas de Grum - TesteOnde histórias criam vida. Descubra agora