Cap. 3

27 6 1
                                    

   Grum rapidamente desamarrou as cordas que estavam nas mãos da pequena e levou-a nos braços de volta à floresta, onde é sua casa. Enquanto corria por suas vidas os indivíduos  rapidamente saíram dali na besta e certamente não voltariam tão cedo.

   A menina estava paralisada e não conseguiu se mexer nem mesmo para se contorcer e tentar fugir dos braços do estranho ou simplesmente olhá-lo. Entraram na floresta, mas tentando deixá-la mais segura , o novo objetivo se tornou chegar ao outro lado do rio, para chegarem ao abrigo. Tudo ficava mais perigoso de noite: nada podiam enxergar, então só poderia confiar em sua memória do caminho e em seus instintos.

   O barulho do fluído do rio deu um sentimento de segurança a Grum, e agora o próximo desafio seria saber onde cada pedra está e ter equilíbrio agora, ainda mais com o peso extra. O rio nessa época estava mais estreito e calmo que o normal, e isto com certeza foi de muita sorte, porque muitas vezes suas águas ficam furiosas, rápidas, e levam o que tocam. Como suas águas estavam secando mais nesta época, também foi mais fácil encontrar o caminho de pedras, agora não tão escorregadias.

  Chegaram finalmente ao outro lado, e do mesmo jeito que sempre fazia aos outros animais machucados, levou-a ao seu abrigo, cuidando dela como podia. Usava técnicas que aprendeu com as curandeiras que conheceu, tanto em sua vila como durante sua viagem, e cada cultura era diferente de acordo com as espécies e locais.

  -Precisas ter cuidado, pequeno. - Acariciou-a como se fosse um dos animais machucados- Não sabes que é perigoso ficar ao outro lado do rio?

 Ele se ouviu... e percebeu o que fizera.

 -Se tu estavas no outro lado do rio seguindo para o norte quer dizer que... Pelos chifres de pan! O que acabei de fazer?! - colocou as mãos na boca, apavorado - és um filhote de monstro... - Falou com os olhos arregalados - se descobrirem que eu te trouxe aqui vão nos atacar depois de tantos anos de paz... não!

  Não poderia devolvê-lo agora, pois com certeza tentariam atacá-lo. Não abandoná-lo na floresta pois pode morrer... mas também não pode continuar com ele, afinal não sabe do que seria capaz de fazer! Mas talvez... talvez ainda haja alguma esperança de que estivesse errado.

 A menina apenas esqueceu seu medo e tornou-se totalmente confusa, inclinando a cabeça, sem entender.

 -Diga-me, tu és um filhote de monstro? Qual tua espécie? - Pergunta se afastando aos poucos

 -Falas minha língua? - pensou alto, ainda paralisada, mas logo retomando à pergunta que foi feita balançando a cabeça para afastar seus pensamentos bestas - Não sou monstro, sou apenas uma criança, então eu lhe peço, não me machuque!

 -Então por que andavas para o norte? Tu não sentes medo?

 -Eu preciso , se não me cuido não há ninguém que o faça por mim. Sou uma orfã, então não há qualquer pessoa a minha espera. Muito pelo contrário, muitos querem que eu suma, e ficarão felizes por causa do meu desaparecimento. - não conseguiu mais encarar o homem, parecendo irritada  enquanto lágrimas corriam por suas bochechas rosadas

 Quando ouviu isso simplesmente lembrou-se da situação em que ela se encontrava e apenas a levou para seu abrigo tentando cuidar dos ferimentos há pouco conseguidos. Antes de fazer qualquer coisa para cuidar, ele tentava acalmar os animais, a maioria sempre aterrorizada por causa dos maus-tratos que sofreram. Só precisava mostrar que não os queria machucar e acolhê-los, vendo que alguns eram fáceis, porém outros poderiam demorar meses para conseguir sua confiança. 

   A casa era simples,  se encontrava dentro de uma árvore milenar que tinha o interior quase completamente oco, então não fora trabalhoso se abrigar no início. Lá haviam duas camas feitas com folhas grandes, uma para Grum e outra para os novos 'pacientes', que posteriormente se tornariam parte de um todo maior dos bichos e espécies da floresta. Uma mesa improvisada para construir suas coisas, como a flauta de pan ou os potes para colocar as frutas que colhia  ou também misturar ervas para ter remédios.

   Muitas vezes os animais entravam em sua casa e dormiam por lá, no entanto sempre que viam que levava consigo um novo animal para ser cuidado, sabiam que não poderiam lá  entrar naquele dia, e foi o que aconteceu. Acendeu uma tocha improvisada e colocou a pequena numa das camas, e começou a falar.

  -Agora eu cuidarei de ti, e depois que tratarmos seus ferimentos, poderá ir e fazer o que desejar

   -Hmm... - Não sabia o que dizer... Aquele homem falava sua língua? Aliás, não era um homem... tinha chifres, era peludo e tinha cascos ao invés de pés. Seria ele um monstro da floresta?

  -Não atravesse o rio, é muito perigoso. Aqui tu podes ser cuidada, então não sinta medo. Me diga, qual é o teu nome? - Ele falava enquanto pegava os potes com frutas no outro lado do modesto cômodo.

  Marie nunca sentira um sentimento de segurança tão grande como naquele momento, e não por causa do fogo da tocha seu coração esquentou-se, sendo acolhida deste jeito. Parece que alguém, sem nem mesmo ser humano, finalmente parecia dar alguma importância à sua existência.

  -M-meu nome é Marie, senhor

 -Muito prazer, senhorita - faz uma pequena reverência, tentando ser chique. Afinal, não é toda noite que se encontra um animal que interaja com falas em sua língua. - Meu nome é Grum.
  
  -Haha, falas de um jeito engraçado
 
  - Que bom que se diverte agora. Ouvi dizer que o riso é um dos remédios mais eficazes - diz após ter pego o pote de frutas vermelhas - tome, coma um pouco. Parece faminta.
 
  - Obrigada. -começou a pegar as frutas e comê-las com gosto, uma por uma - Já ouvi isto antes também- fala a menina, com os olhos radiantes enquanto continuava a comer

  - Não quero atrapalhá-la agora, mas, por acaso, já vistes algum monstro do norte?

  -De tudo que já vivi, não encontrei monstros com chifres ou com poderes mágicos como os das lendas, mas vi homens maus que fariam coisas tão maldosas quanto monstros.
  



As crônicas de Grum - TesteOnde histórias criam vida. Descubra agora