A hora do almoço chegou antes de ter tempo de tirar as coisas a limpo com Nat e Hannah. Aproximei-me discretamente da mesa delas no bar, com os olhos ainda vermelhos e congestionados da véspera. A minha representação era digna de um Óscar.
— Posso explicar? — comecei, puxando uma cadeira para me sentar. Ambas pareciam embaraçadas, confusas e um pouco distantes. Falei com a voz hesitante, o que não era fingimento porque estava realmente nervosa. — Eu... eu devia ter-vos contado os problemas que ando a ter em casa. Na verdade, está a ser difícil aguentar e isso faz-me... andar de mau humor e um bocado estranha. — A primeira lágrima rolou-me pela face e caiu na horrorosa mesa de plástico. Outras se seguiram, e eu enxuguei-as com a mão.
A reação não se fez esperar. Ambas vieram ter comigo para me abraçar.
— Porque não nos disseste? — protestou Hannah. — Podíamos ter-te ajudado.
— Sabíamos que andavas stressada — acrescentou Nat. — Tens aguentado muita coisa; isto acabaria por te acontecer mais tarde ou mais cedo.O abraço coletivo durou alguns minutos até eu me libertar.
— A minha mãe vai procurar ajuda, falar com pessoas e tentar obter algum tipo de assistência.
Nat deu-me tantos socos no braço que ele começou a doer-me.
— Isso é fantástico! Para celebrarmos, vou oferecer-te um café expresso duplo com leite, coberto de chocolate.
— Vocês são boas de mais para mim. — Funguei outra vez. — Obrigada por serem tão compreensivas.
— É para isso que servem as amigas — declarou Hannah, no preciso momento em que Genevieve passava pela porta. Os nossos olhos encontraram-se e o tempo parou. Ela tentou disfarçar a sua reação ao ver os nossos rostos alegres e luminosos, mas falhou por completo. Detetei a raiva e a incredulidade a lutarem entre si. Avançou, tentando fazer um sorriso, mas este parecia-se mais com uma careta.E, agora, seguia-se a grande tirada para eclipsar a estrela da companhia. Levantei-me, enxuguei as lágrimas e dirigi-me a ela. Envolvi-lhe o corpo delgado nos braços e ela retraiu-se imediatamente, mas eu mantive-me firme com um grande sorriso, gozando com o seu desconforto. Ficámos presas uma à outra num estranho abraço simbiótico e quase acreditei que parte do sangue dela corria agora nas minhas veias.
Falei num tom de voz deliberadamente alto para todos ouvirem.
— Desculpa de fiz com que te sentisses rejeitada. Eu não sou nada assim. Tenho andado com uns problemas em casa.
— Não faz mal — resmoneou ela num tom brusco. — Na verdade, isso não me incomodou.
— Não. Eu portei-me muito mal. Desculpas-me a sério?
— Sim. É claro — respondeu ela asperamente.
— E ficamos amigas?Soltei-a e ela recuou como se tivesse sido fulminada. Nat tinha.se virado por uns momentos com o porta-moedas aberto e pedia a Hannah umas moedas. Genevieve tirou partido da distração delas.
— Só por cima do meu cadáver — segredou ela num tom malévolo.
Atirei a cabeça para trás e ri-me ostensivamente.
— Genevieve! Tens um sentido de humor tramado.
Genevieve não estava à espera desta reação, e o rubor que se espalhou na cara dela deu-me uma sensação de poder. Tinha descoberto uma brecha na sua carapaça e tencionava não lhe dar tréguas. Durante a hora seguinte, ri-me e gritei na minha cadeira, tagarelando incessantemente de uma maneira frívola e animada para mostrar a toda a gente como estava completamente à vontade. Tive o cuidado de incluir Genevieve em tudo o que dizia, referindo o nome dela constantemente e chegando a abreviá-lo para Gen. Os olhos verdes dela abriam-se cada vez mais com ódio. A hostilidade entre as duas era tão forte que pensei que toda a gente a conseguia sentir, mas ao olhar de relance Hannah e Nat percebi que elas não davam por nada.