Capítulo 1

321 18 9
                                    

Ren Abe era uma pessoa normal, que vivia uma vida comum, com mais do mesmo. Desde que começou a faculdade não morava com sua mãe, alugou um chalé no meio do nada o mais afastado possível do barulho e agitação da civilização. Banff era uma cidade pequena, mas sempre movimentada pelo grande volume de turistas, para ele Banff era um paraíso, gostava de sentir o cheiro do verde, e da neve derretendo sob as rochas das montanhas.
Mas nem sempre morar afastado de tudo era vantajoso. Aquele dia em especial, não era um bom dia para estar no meio do nada.
Havia brigado com sua namorada, na verdade ela havia brigado com ele, tudo porque nas ultimas semanas esteve concentrado nos seus deveres da faculdade e no estágio.
Como se não bastasse foi se queixar com sua mãe que ligou para ele, para defende-la e não a ele que era seu filho.
Como resultado, havia perdido a paciência e havia largado a celular sob o balcão da cozinha e saído para caminhar.
Isso sempre funcionava para acalma-lo ouvir a natureza sempre era mais agradável do que ouvir as pessoas, o frio era agradável e sempre gostou mais do frio do que do calor, porém estava frio demais.
Estava tão concentrado em não pensar em nada que não percebeu que havia um pouco longe demais. E quando viu as primeiras estrelinhas de neve não imaginou que o tempo iria virar tão de repente em uma tempestade.
Ao contrario de quando saia para fazer trilha não havia saído vestido para suportar o clima, e muito menos trazia suprimentos. Não conseguiria voltar para casa como o tempo estava, então precisaria encontrar um abrigo antes que morresse com uma hipotermia. Porém para todos os lados que olhava era tudo branco e vento. O frio começava a nublar seu raciocínio.
Mantenha a calma disse a si mesmo, as coisas poderiam ser piores.
Ouviu um uivo de lobo, seguido por vários.
Ok as coisas poderiam sim piorar. Apressou o passo. Qualquer buraco em uma rocha, até mesmo uma árvore oca serviria para que conservasse o calor do seu corpo.
Não queria morrer antes de encontrar um sentido para essa droga de vida.
Ótimo já estava, filosofando sem mesmo ter certeza que iria morrer, mas achava que preferia morrer congelado a ser triturado vivo pelos lobo...
Seus pensamentos foram interrompidos quando pisou em falso e saiu rolando sabe-se lá em que direção batendo a cabeça em algo duro. Antes de perder a consciência viu a morte bem diante dos seus olhos. Ela tinha a forma de um enorme lobo dourado com incríveis olhos verdes, mas se ia morrer pelo menos poderia encontrar o consolo por não sentir dor, pensou enquanto lentamente perdia a consciência.

Um ser humano! pensou o lobo maravilhado encarado o garoto desacordado em sua frente.
Ouviu quando ele gritou e ouviu o baque quando ele se chocou contra a pedra. Era a primeira pessoa que via em não sabia quanto tempo, esteve evitando se aproximar da civilização por um bom tempo e desça vez apenas se aproximou porque estava caçando. De qualquer maneira, não era para aquele garoto estar ali. Ele não parecia um caçador, talvez estivesse apenas perdido, mas também poderia não sobreviver se não fizesse nada.
Cravou as presas em seu casaco e o arrastou. Ali perto havia um túnel onde escondia comida as vezes. Ele provavelmente não caberia lá em pés, mas como estava com certeza. Quando já o tinha bem acomodado e longe do frio o examinou com cuidado.
Ele tinha uns vinte anos talvez, traços asiáticos e sobrancelha bem marcada, mas o galo enorme na cabeça o preocupava. Era melhor acorda-lo.
Começou a lamber seu rosto e grunhir.
"Acorde"
Gemeu não podia gritar. Não parou de lambe-lo.
Acorde, por favor.
Ele balançou a cabeça e gemeu.
Encarou na expectativa, então ele abriu os olhos, olhos grandes, castanhos e brilhantes.
Estava a tanto tempo sem ver uma pessoa que começou a considerar aquele cara realmente bonito?
De confusão aqueles olhos passaram para medo num instante.
Ele ficou extremamente parado como se avaliasse por onde deveria fugir.
Ah, era verdade. Ele Não sabia que não iria lhe fazer mal algum. Adoraria poder sorrir para ele, mas lobos não sorriam apenas mostravam os dentes.
Mesmo assim. Deu uma lambida enérgica em seu rosto.
Ele arregalou os olhos mais uma vez surpreso.
Então um pouco mais aliviado por ele estar bem se deitou pousando a cabeça em seu peito.
― Não acredito, você me trouxe até aqui?
Não podia falar, mas abriu a boca deixando a língua de fora, esperava que estivesse parecendo amistoso.
― Que dia estranho - ele murmurou e fechou os olhos.
Rosnou.
Ele os abriu novamente.
Lambeu o seu rosto.
Não durma agora.
Era o que queria dizer.
Ele suspirou e fechou olhos novamente.
Rosnou de novo.
― O que você quer?
Que você fique acordado!
Adoraria dizer isso a ele, mas não podia.
Fechou os dentes em sua mão com delicadeza.
Ele o encarou de novo.
― Você não quer me comer não é? Já teria feito isso a muito tempo.
Grunhiu e mastigou sua mão sem usar força nenhuma.
Ele suspirou de novo e com a outra mão começou a acariciar sua cabeça. Bom, não era por aquilo que estava esperando, mas serviria se fosse para mantê-lo acordado.
Só não pensou também que fosse gostar tanto daquilo, fazia muito tempo que não recebia carinho alguém, de ninguém e... E estava até balançando o rabo.
Aquilo era vergonhoso, mas quem estava se importando, lobos não tinham vergonha.
― Eu nunca vi um lobo como você - ele disse.
O olhou.
― Você é bem bonito, até parece uma pessoa.
Sacudiu o rabo euforicamente e lambeu sua mão.
Sim, continue falando.
― Hoje não foi um dia bom, mas depois de tudo acho que poderia ter sido pior. Eu poderia ter morrido.
Eu não vou deixar você morrer - pensou o encarando.
Estava comprometido a isso desde que o viu ferido e sozinho na neve, isso fazia apenas alguns minutos, mas não tinha importância.
― É normal um lobo ser tão expressivo? Ou eu bati minha cabeça com força demais?
Ele levou a mão a testa.
― Au! - gemeu - Definitivamente foi uma bela pancada. Então será que eu estou imaginando você?
Mordeu a mão dele com mais força.
― Isso doeu, então acho que não, - ele olhou para cima pensativo e espantado - mas como pode você entender o que eu estou falando.
Eu costumava ser uma pessoa também - suspirou.
― Seu pelo é tão quente, e macio - ele sussurrou enfiando os dedos nele - eu sinto posso dormir a qualquer minuto.
Dessa vez não conseguiu impedi-lo, por mais que tenha rosnado e sacudido sua mão ele dormiu. A única coisa que poderia esperar é que ele ficasse bem.
Enquanto observava seu rosto adormecido, não parava de se perguntar qual devia ser o nome dele.
Estava feliz por ter encontrado uma pessoa, e que principalmente não queria colocar o seu coro pendurado em uma parede, mas também estava extremamente frustrado por não poder conversar com ele.
Por fim, era bom sentir o calor humano de novo, e era tão confortável que também fechou os olhos e dormiu.

Caninos DouradosOnde histórias criam vida. Descubra agora