É teatral

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Em cena

Um casal de atores

Palco nu e luzes acesas como se não houvesse plateia.

Dicionario: Nave - espaço destinado as cadeira de um teatro - plateia

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Ele estava lá como um semideus despido de sua imortalidade e soberania. Imóvel estava.

E assim contemplava o seu caderno, a fim de que seus problemas se esvaíssem num simples farfalhar de paginas. Ela chega silenciosamente e o observa de longe e antes mesmo dela se mover ele interrompe o silencio.

Ele (arrogante) ̶ O que você quer? Ainda não sei o que vamos fazer! Espere lá fora.

(Ela continua imóvel e ele irrita-se com sua presença. Com um olhar fulminante ele mede a visitante.)

Ela (sustentando o olhar dele) ̶ Só quero fazer uma pergunta.

Ele ̶ Pois diga.

Ela ̶ Por que você anda com isso em baixo do sovaco o tempo todo?

Ele (tom de zangado) ̶ O que te importa?

Ela (defensiva, como quem não quer nada) ̶ Só queria saber.

Faz silencio na nave

Ele (suspiro) ̶ São apenas anotações que me ajudam na inspiração.

Ela (titubeia) ̶ Posso ver? (vai aproximando do palco)

(Ele recua como um garotinho escondendo a bola.)

Ela (controlando o riso) ̶ eu não vou roubar e nem estragar.

(Ele senta na borda do palco e ela se aproxima. Folheia o caderno e joga o caderno em direção de uma das cochias. E ele corre pegar. Ela ri e ele se zanga).

(Enquanto ele limpa o caderno.)

Ela ̶ esse caderno é seu?

Ele ̶ e se for?

Ela ̶ O nome que está nos dados é de uma mulher?

Ele (irritado) ̶ Não, o caderno não é meu.

Ela (inquiri) ̶ Então os pensamentos não são seus?

Ele ̶ E quem é você para julgar?

Ela (atônica) ̶ Eu? (apontando para si), sou ninguém.

Ele ̶ Então o que você quer de mim? O que faz aqui?

Ela ̶ Tenho que querer algo de você. Só vim por que te vi antes e achei que você precisava de ajuda.

Ele ̶ Ajuda eu? De que?

Ela ̶ Sobre o prazo de entrega do roteiro...

(ele não esperou o termino da frase)

Ele ̶ E você acha que eu preciso da sua ajuda?

Ela ̶ Eu acho que sim.

Ele ̶ Como você acha que ajudaria?

Ela ­̶ Você já tentou ligar para a dona do caderno?

Ele ̶ Para falar o que?

Ela ̶ Fala serio você rouba o caderno (pega o caderno de suas mãos) e nem se importa em saber quem é a autora de seus textos?

Ele (grita) ̶ Eu não roubei... (baixa o tom) e ela não escreve as minhas historia, (desculpas) ela só me inspira.

Ela (consensual) ̶ Ta, ta, mas você conhece ela... já falou com ela?

Ele ̶ Para falar o que?

Ela (falando para plateia) ̶ Que moleque travado. (vira se para ele) Sei lá, comece falando que você é o idiota que achou e escondeu o caderno dela e que agora tá com bloqueio de escritor.

(ele faz careta e fica pensativo ao folhear o caderno)

Ele (verbaliza para si) ̶ O telefone não pode ser o mesmo!?

Ela ­̶ Você já tentou?

Ele (verbaliza para si) ̶ Não vai ser o mesmo, já faz muito tempo.

Ela ­̶ Você já tentou? Aposto que é o mesmo.

Ele (olhando para ela) ̶ Os dados estão desatualizados, faz oito anos que achei (balançando o caderno).

Ela (descendo do palco) ̶ Isso só faz pensar que ela deve ser alguém mais madura, com uma fisionomia diferente de a oito anos a trás, que seus ídolos e ideologias de ontem, não passam de apenas história e que os gostos de outrora são apenas recordações, mas que continua pertencendo ao mesmo bairro, rua e telefone.

Ele ̶ Você quis dizer sedentária?

Ela (passeando pela nave) ̶ Não, sedentária não. Acho que apenas não sente necessidade de mudar de local ou coisas para se sentir bem. E as vezes pode ser número de trabalho.

Ele ̶ Eu vou tentar e se não for? O que eu ganho?

Ela ̶ Paro de te perturbar. (Ele a mede de esgueio) Maasss se eu ganhar fico com o caderno. Fechado?

(eles se medem sem dizer uma só palavra. Ele pega o telefone e ela continua passeando pela nave).

Ela (dançando enquanto anda pelas as filheias de cadeiras) Acho que ela deve ser uma mulher forte, guerreira que não teme a vida, mesmo que não tenha os holofotes para si... (Gesticula como se conversa-se alguém) Quando eu tiver uma filha vou por o nome dela - Amália Rodrigues­ - Nem vou por o nome do meu marido, Amália Rodrigues numero nove na numerologia...

Ela (vira se para o palco) ─Ta ligando?

(ele responde que sim com a cabeça)

Ela (aponta para ele) ─ Você colocou o nove na frente.

Ele (faz careta) ̶ Pus!

Ela anda pensativa contando os passos enquanto ele olha para frente esperando o incessante tum tum tum se desenrolar ate que no teatro um som de telefone, ela vai ate sua bolsa numa das cadeiras da plateia e antes mesmo dele falar alo...)

Ela ̶ Também te acho um idiota

FIM

O céu é azul, o amor é lindo....Onde histórias criam vida. Descubra agora