Capítulo 1

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Almacari/1889

NOVAS DESCOBERTAS TRAZEM LUZ SOBRE A IGNORÂNCIA!

Enviada pela Torre, uma ossada de um ser bípede muito antigo foi analisada pelos pares no Locrum. Nas palavras da Mestre Umar, chefe da divisão histórica do Locrum: "Esse foi um achado e tanto. O esqueleto tem muitas similaridades com os nossos próprios, mas nutrindo nítidas diferenças. O mesmo vale para os fenonianos. Isso nos leva a apenas uma constatação: se trata de um ancestral em comum, especulado há muito tempo. É precipitado dizer a idade, mas com toda certeza tem mais de 400 mil anos!". Se comprovadas a idade e ancestralidade, então talvez, finalmente, tenhamos um grande argumento contra a cega ignorância que recai sobre muitos, dando fim de vez a descriminação.


Aldrit soltou os cabelos diante da pressão esmagadora que a umidade do bosque exercia. A respiração, por vezes, era dificultosa e exigente. Chovera havia dois dias, e o prenúncio da próxima já estava nos céus em forma de densas e grandes nuvens acinzentadas. Isto, no entanto, não fora impedimento para que tanto Aldrit Pendragon quanto Belloc Belor saíssem naquela manhã, vindos de Durarrocha até o coração do bosque. Tendo evitado, com êxito, todo e qualquer tipo animal que pudesse perturbá-los. As raízes sobressalientes já haviam, mais de uma vez, aplicado golpes aos pés dos rapazes, e Belloc por pouco não torcera no tornozelo durante a caminhada, praguejando contra a vegetação. Os problemas de Aldrit, no entanto, eram outros. Além do terreno que ficava mais íngreme a cada passo, eram os galhos baixos com suas lascas e com suas folhas pontiagudas que vez sim, vez não, feriam sua face com espetadas e estocadas.

Os trovões que puderam ouvir mais cedo, no nascer do sol, agora retornavam aos céus. Aquele som intenso que retumbava por bons quilômetros no céu, atazanava os animais, fazendo-os buscarem abrigos para a prometida chuva.

Estamos próximos, pensou o Pendragon, revisando mentalmente as instruções que haviam coletado em Durarrocha antes de partirem para o bosque. Muito admirava a Aldrit que, nesses dois meses de trabalho incessante na ilha, nunca haviam sequer ouvido falar da clareira a qual se direcionavam. O processo de compreensão de que a ilha de Venhamar era muito mais do que apenas a Mansão onde trabalhavam era um processo lento na mente dos rapazes, que seguiam se impressionando com a beleza natural e ainda intocada da maior ilha de Wigia.

O fato de não ter que usar máscara para se proteger da poluição era algo que o surpreendia intimamente ao andar pelas ruas de Durarrocha. A realidade da capital, onde passava a maior parte dos seus dias, era verticalmente oposta. Sem algo que filtrasse o ar, andar nas ruas era uma tarefa penosa aos pulmões. E ambos podiam sentir facilmente a diferença na qualidade do ar. Ali, dentro do bosque, havia umidade, odores agradáveis e uma quantia alta de oxigênio não poluído. Encher os pulmões numa inspirada demorada era algo quase surreal de se fazer nas ruas de Nova Nartan; e, quando o faziam ali, sentiam a opressão de um ar limpo no corpo.

– Será que falta muito? – Belloc indagou de trás, colocando o cabelo negro em um coque desajeitado. Quando não o fazia, os fios caíam em sua face, tapando a visão. E as mãos, sujas, não seriam adequadas para passarem próximas aos olhos.

– Não – Aldrit respondeu, enchendo os pulmões. – Disseram que era o ponto mais alto da ilha, e já tamo andando em uma encosta tem um tempo.

– Espero que não tenha nada que exija uma escalada – brincou, passando a mão atrás do pescoço para aliviar a dor constante.

– Teriam citado isso, caso tivesse. Acho – deu de ombros, com os olhos focados em um trecho ligeiramente mais fechado logo adiante.

Sentindo a fadiga típica da manhã, Aldrit esticou os braços para cima espreguiçando e sentindo os músculos, um a um, reagirem. Para seu desagrado, apesar de a mata se fechar logo na frente, as copas das árvores estravam se tornando espaçadas. Isso permitia que flashes de luz entrassem ocasionalmente, quando as nuvens moviam-se liberando pequenos trechos do céu. A luz solar sempre açoitava-lhe os olhos, sensíveis em seu verde turquesa suave. Ter de inutilizar uma das mãos para fazer sombra sobre os olhos lhe incomodava profundamente, ficando limitado a usar apenas uma para abrir caminho entre os caules e galhos apertados mais adiante.

As Brumas de Outono - O Flagelo do Tempo Vol.1Onde histórias criam vida. Descubra agora