CAPÍTULO 9 ou O chamado à aventura ou ainda o aumento da consciência

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A melhor dupla, às terças, nas aulas de pesquisa, eram as irmãs J, isso antes do meu desmaio e dos dias de molho em casa ouvindo Good Vibrations na péssima voz do meu irmão que estava lá, segundo ele, pra me fazer sentir melhor, é claro... Até que ele decidisse "tocar" Eleonor Rigby numa versão jazzista soprando entre as mãos e fazendo uns tututus e esquivando dos travesseiros que eu lançava da cama. Genevieve e Julia Jean e o carinha de coturnos com a camisa do RHCP (seu nome era Artur, e ele era um tipo turista do terceiro ano que escrevia uma pesquisa na qual Genevieve gostava de sugerir observações mesmo que ele não solicitasse) – tinham ligado, aliás Julia Jean ligou e disse que a irmã e o carinha de coturno estavam mandando um oi.

"Eles querem saber se você toparia participar de um projeto", Julia Jean falava com a voz roufenha "Se sim... Eu preciso contar o que você perdeu..."

"Eu tenho escolha?"

"Vievi conseguiu uma informação valiosa sobre como pretendem formar a nova banda...", disse em seguida ignorando a pergunta.

"Nova, mas e a antiga?"

"Já era."

"E... Uma banda pra quê?"

"Assumir o lugar da antiga Pumpkin"

Silêncio.

Na terceira semana no grupo para escolha do nome de uma árvore decrépita, na aula de biológicas, já era possível ouvi-los fazendo piadas. Era o que Pumpkin me fizera lembrar. Não só Laila, essa história não é sobre ela... Não mais. Nos anos ouvindo gracejos sobre abóboras eu tinha aprendido que de duas uma, ou você comprava briga e o apelido se multiplicaria como uma cepa no interior de um avião ou você aceitava que talvez o efeito fosse outro mais adiante.

"O que você sabe tocar?" perguntei quebrando o silêncio.

"A Vievi perguntou se você acha ruim a gente te chamar de Pumpkin"

"Não..."

"Ótimo!", exclamou, "então Pumpkin você pode ficar com o baixo"

"Eu não tenho um baixo"

"O Artur consegue pra gente..."

"E qual vai ser o nome?"

A ideia para o nome surgiu de um momento de asceticismo de Genevieve, foi o que ela contou ao carinha do coturno e sem segundas ou terceiras opções – "Habemus cohortem" ela disse sem qualquer hesitação. Eu não sabia o que era asceticismo, mas tinha noção de que Genevieve pensara em tudo sozinha e não por falta de ajuda.

"Bisters on my fingers", Julia Jean leu em voz baixa e então mais alto olhando pela webcam. "Bisters... on my fingers, você sabe o que significa?"

"Ela não disse, mas eu pesquisei"

"De onde ela tirou isso?"

"Beatles" falei num daqueles instantes de asceticismo do comprimido para intolerância a lactose batendo com o cajano na ponte e gritando a plenos pulmões You shall not pass! "É de Helter Skelter". Julia Jean fez um – caramba – sem levantar a voz e repuxou os músculos do pescoço numa careta de admiração metade da testa desaparecendo no quadradinho à direita.

"Você gostou? Se você disser, com sinceridade, eu também digo..."

"No três?"

Fizemos a contagem a partir do dedão.

"Não!"

Rachamos.

As coisas eram tais como eram com Genevieve. E essa ideia, ao acordar na traseira de uma ambulância, ao ver seu professor se transformar numa esfinge com tetões, ao dar-se conta da sensação de testemunhar... fora da própria consciência... Era insuportável.

QUEIME DEPOIS DE LEROnde histórias criam vida. Descubra agora