17 de fevereiro

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O clima estava agradável aquela manhã. Nem muito quente, nem muito frio; no ponto certo. Porém, eu não estava ligando muito pra isso, na verdade, não estava ligando para nada que não fosse a bendita notificação de uma semana atrás. O dia chegou e eu não me conformava em ter ignorado, tão descaradamente, a mensagem de alguém tão importante com um pedido tão curioso. Afinal, por que não consigo simplesmente deixar pra lá?

Enquanto tomava sua xícara matinal de café forte, meu pai me fitava com uma cara de quem quer saber - ou dizer - alguma coisa, mas que prefere não ser chato ou insistente.

- Tudo bem! Eu conto. Entretanto, - ergui o dedo indicador em complemento à minha observação - saiba que não é porque preciso conversar, mas sim por você tanto querer saber.

- Com toda certeza - respondeu, em deboche.

- Júlia tentou entrar em contato comigo há uns dias e eu não consegui lhe dar uma resposta. Tenho sido um idiota com ela e os outros a tanto tempo que não esperava ser convidado para algo tão importante em sua vida. Talvez por isso, tenho pensado tanto nisso. Não sei. Estou confuso. Não seria pior para nós ressuscitar uma relação que, evidentemente, não temos mais? - Suspirei exasperado - Acontece que eu tenho tudo que busquei alcançar e ainda assim...

- Ainda assim deseja vê-la. Você ainda não tem a sua garota, Miguel. Não que seja uma lei que o homem tenha uma mulher para ser feliz e completo, mas você precisa porque é o que deseja e não tente mentir para si mesmo. Algumas pessoas que passam por nossas vidas são, simplesmente, insuperáveis - notei a nostalgia em sua voz sabendo que não falava apenas de mim.

- É, talvez tenha razão - falei meio que a contragosto por ter que admitir - De toda forma, ela nunca vai sentir o mesmo por mim e provavelmente ainda está com a pessoa que realmente queria.

- E se não estiver? E se ainda existir uma chance pra você?

- Não importa mais! O baile é hoje, nunca vamos chegar a tempo - se não fosse a agonia do momento eu teria rido da frase clichê que nunca me imaginei usando.

- Vamos sim! - garantiu - Comprei as passagens de avião faz tempo. Chegamos em menos de três horas. Se tiver algum serviço nos próximos dois dias pede pra alguém te substituir. Vai arrumar suas coisas, passaremos o fim de semana na sua mãe. Já está tudo certo.

Fiquei boquiaberto com a enxurrada de palavras inesperadas daquele homem que, até então, julgava previsível. Como assim ''Já está tudo certo''? Não gastei muito tempo tentando processar a informação, pois isso poderia demorar demais e eu estava com mais pressa que nunca.

Poucas horas depois, pegamos o voo para Belo Horizonte. Meu pai explicou com mais calma que nossa Laurinha tinha lhe telefonado contando da formatura e que Ju havia nos convidado. Pelo que entendi, ela já sabia que eu não contaria ou aceitaria o convite e resolveu se adiantar. Se em algum momento eu criaria coragem de bater de frente com meu passado, isso ela precisou contar com a fé.

Chegada a hora da festa, eu estava completamente arrumado por fora e um verdadeiro caos por dentro. Ainda assim, preparado para encontrá-la e pedir desculpas por meu erro e explicar porque o cometi. Mesmo que já não fizesse diferença.

Me senti em um verdadeiro baile americano ao pisar dentro do espaçoso ambiente com um globo de luz no alto, pessoas bem vestidas, músicas lentas e um salão especial para dança. Perguntei-me até que horas da noite aquele cenário iria durar antes que começasse a parecer um baile funk, o que não faz muito meu gosto. Certamente, aquele era um momento para pessoas como eu aproveitarem.

Fiz questão de me atrasar para conseguir passar despercebido em meio aos demais e não chamar atenção. Busquei com os olhos a dona de toda saudade que havia em mim quando ouvi uma voz familiar pronunciar meu nome com este mesmo sentimento.

- Miguel? - Me virei para ver uma mulher que, inusitadamente, usava um vestido cor de rosa goiaba com detalhes de tule bordado na parte superior. Uma vez, há muitos anos, eu disse que gostaria de vê-la usar alguma roupa nesta cor - Nem acredito que esteja realmente aqui. Bem na minha frente - disse, abraçando-me apertado e fazendo lembrar a falta que este abraço faz.

- Me perdoa, Ju - comecei olhando nos seus olhos como da última vez que nos vimos - Eu precisava vir te dizer que doeu todas as vezes que fui frio quando tentou lutar para que não acabássemos como estamos atualmente. E eu tenho minhas razões, mesmo que não as ache justificáveis. Fico contente que você e o Gustavo tenham dado certo, mas na época eu...

- Espera - interrompeu com uma expressão confusa - você sabe que eu e o Távio não duramos nem quatro meses, não sabe?

- Co-como assim? Então não estão juntos desde 2019? - indaguei perplexo com a notícia.

- Exatamente! Como não ficou sabendo disso?

- Bom, parece que ninguém me contou essa novidade e eu não quis investigar porque tinha certeza que vocês eram coisa certa!

- Eu não acredito - pronunciou em um tom de voz quase inaudível enquanto apertava os olhos com os dedos da mão - Esse tempo todo eu estava crente que sua mãe tivesse lhe contado.

- Acho que ela tentou falar a respeito, mas eu não quis ouvir - suspirei indignado comigo mesmo. - Mas o que deu errado tão cedo entre os dois?

- Eu até tentei, afinal, você sabe melhor do que ninguém o quanto eu queria isso, mas, em uma das noites mais tristes da minha vida, você disse que eu deveria focar na notícia mais importante e, eu fiz isso, eu não conseguia parar de pensar em você e eu chorei tanto às escondidas naqueles primeiros dias porque temia que terminássemos como dois estranhos e, a cada dia eu sentia mais a sua falta e ficava torcendo pra te ver entrar pala porta da doceria, mesmo sabendo que não ia acontecer. Não deu pra continuar porque a notícia da sua partida era a mais importante. Eu estava confusa, Miguel e quando enfim entendi minha confusão, era tarde demais. Eu senti que tinha morrido pra você. - Uma lágrima caiu pelo seu rosto mostrando a sinceridade e dor do que sua boca pronunciava - Repassei em minha mente a lembrança de nossa despedida várias e várias vezes até compreender o que quis dizer com aquela música. Sei que não merecia te procurar outra vez e não percebi que era você quem estava ao meu lado o tempo todo, mas eu te peço, por favor, me dê mais uma chance...

- Não sabe como esperei por isso, Júlia, se soubesse não teria feito-a sofrer de tal forma, mas penso que talvez tenha sido necessário para que enxergássemos onde o amor realmente está e a falta que ele faz... E, sabe de uma coisa, hoje eu descobri que a vida é um mar de chances e não seria certo lhe recusar mais uma!

Conclui minhas palavras exprimindo em um beijo saudoso todo o amor que vinha escondendo ao longo de anos no fundo do meu ser e emanando a alegria indescritível que é ter um amor correspondido depois de tanta luta.

Quando você ama alguém e suas esperanças, por algum motivo, esvaem-se, é normal desistir, até porque ninguém é obrigado a sofrer sozinho, entretanto, se uma nova chance surgir ao seu alcance, seria tolice recusa-la.

FIM
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NOTA DA AUTORA
Mais uma obra concluídaaaa😍
O que acharam do conto, do final?
Espero que tenham gostado. Compartilhem tudo aqui nos comentários!!!
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Obrigada por terem me acompanhado até aqui mais uma vez. Amo muito todos vocês
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Não tenho previsão para a postagem de uma próxima obra, mas tenho muitos planos em mente.
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Deixem a estrelinha🌟🌟
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[15-06-20]

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