-Não sei mais como responder a isso, delegado. Amber anda um pouco estressada... Mas posso assegurar que esse pequeno equívoco não irá mais se repetir.
-Senhora Trandafiri, já é a terceira vez, só neste mês, que Amber vem parar na delegacia. Comportamentos assim não são normais para uma jovem na idade dela. Acredite em mim, muita coisa passou por esse lugar, muitos jovens já se sentaram nessa mesma cadeira, mas, ela, certamente, é um caso complicado para lidar como apenas um ato de vandalismo e rebeldia adolescente.
-Mas foi em legítima defesa, Smith. Ela tinha sido atacada, e nada é mais coerente do que se proteger... Isso não é contra a lei._ Delegado Smith apoiou a cabeça nas mãos e os cotovelos sobre a mesa. Ele estava visivelmente irritado com a insistência que minha mãe depositava a sua frente. Apesar do seu estado enfadonho, Smith não a respondeu com ignorância ou indiretas, como quando estava sozinho comigo, pelo contrário, manteve a voz tranquila e suave, tentava controlar as suas palavras ao buscar uma gentileza que não lhe condizia.
-Kate, levar um assaltante para a emergência não é legítima defesa. Os médicos disseram que se o atendimento tivesse demorado mais ele poderia vir a ter complicações por hemorragia interna. Isso não é mais brincadeira de criança, tornou-se um caso de agressão grave. O próprio meliante, inclusive, pode vir prestar uma queixa contra Amber, e eu terei que ouvir o que ele disser e acatar o seu relato.
-Mas se ela não houvesse se protegido, ele poderia ter... Ter feito algo com ela. Seria um dano psicológico permanente, não concorda comigo, Smith? Ou não se pode mais defender a honra nesse país? Devemos deixar que ela nos seja roubada, mesmo quando sabemos como nos defender?_ Minha mãe continuou a enrolar o delegado, que a ouvia sem muito interromper. Eles conversavam como se eu não estivesse na mesma sala, ouvindo a mesma conversa quinzenal sobre mim. Apoiei minhas mãos atrás da cabeça e me recostei na parede. Fechei os olhos e os deixei discutindo enquanto me concentrava em uma música que havia ouvido na televisão de um supermercado há umas três horas, antes de ser abordada por um assaltante armado com uma faca.
-A questão não é se ela se defendeu ou não. Amber é uma jovem potencialmente perigosa. Ela tem dezesseis anos e já se envolveu em cada situação que, por Deus, não parece ser uma criança criada por você, Kate. Já recebemos queixas da escola em que estudava por se envolver em brigas violentas. Ela já destruiu até uma padaria em uma briga de rua. Acha que foi fácil convencer o padeiro a não prestar queixas contra ela? Tivemos que conseguir um tradutor italiano._ Minha mãe olhou de relance para mim. Tanto ela quanto eu sabíamos bem que quem convencera aquele padeiro, que por sinal era português e não italiano, fomos nós, principalmente quando me ofereci para trabalhar na padaria por dois meses, gratuitamente, como forma de pagamento aos danos. Ele aceitou, e ficamos até quase amigos no final daquele tempo.
-Ela estava apenas tentando ajudar... O padeiro mesmo testemunhou que ela reagiu ao assalto da padaria, só que não imaginou que a proporção da luta seria tão grande.
-Kate, o modo como fala parece incentivar as ações de sua filha. Eu não sei se ela assistiu a muitos filmes de ação e se impressionou com os heróis, mas isso não existe na vida real. Ela não é feita de aço e nem as pessoas são de borracha._ Delegado Smith já começava a aumentar o seu tom de voz, deixando cada vez mais claro que não aliviaria tão facilmente dessa vez. Minha mãe segurou a língua e deixou que o delegado reclamasse mais sobre mim, como se fosse o único dono da razão, pois, com o ego inflado, estaria mais suscetível a rodeios.
-Eu já estou tomando atitudes, delegado._ Ela voltou a sua atenção ao delegado ranzinza com olhos inocentes. Era um truque desconfortável ser tão gentil com um homem tão odiável quanto aquele. Eu só queria ir para casa, apesar de já estar acostumada com a delegacia. Eu ainda precisava limpar o sangue do assaltante do meu corpo e me arrumar para o trabalho. Por que Smith não era mais direto e dizia logo o que eu deveria fazer para compensar o mal entendido?
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O Clã Varcô - Amostra Grátis
Ficción GeneralAmber Trandafiri nunca foi como as outras pessoas. Seu corpo era mais forte, habilidoso e resistente. Seu comportamento também era instintivo, buscando sempre adrenalina e ação. Ela nunca conheceu o seu pai, vivendo apenas com sua mãe, julgando assi...