Capítulo VIII

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Meus olhos abriram atônitos e instintivos após uma forte batida na porta. Senti um desconforto na região do pescoço e percebi que durante a noite anterior, enquanto choramingava e tentava conectar os pontos narrados que me ligavam à família Varcô, acabei dormindo sentada na cadeira da penteadeira, e por estar tão cansada permaneci assim por horas a fio. Gemendo baixinho esfreguei os olhos, e fiquei apoiada na mesa da penteadeira enquanto os ossos estalavam em consequência da minha péssima ergonomia. Tudo o que eu precisava agora era um banho, um copo de água e uma grande garrafa de pura cafeína.

-Uma boa noite de sono?_ Virei o rosto para trás a fim de encarar o dono daquela voz cheia de sotaque. O rosto familiar preencheu a minha mente, foi identificado como Edgar, o inconveniente da mansão. Ele me encarava com uma das sobrancelhas erguida, como se analisasse a cena, confuso. Eu continuava imóvel, como um morto-vivo, enquanto minha mente ainda se habituava a aquele corpo e a aquele quarto.

Foi, então, que o susto refletiu tardiamente, fazendo-me levantar em um pulo desajeitado, empurrando a cadeira, que só não caiu ao chão devido ao visitante ter um rápido reflexo, segurando-a antes de completar o movimento de queda. Ignorando-o, olhei-me no espelho para avaliar os danos ocorridos naquela noite, mas, tanto a minha roupa quanto o quarto estavam intactos. Eu não havia perdido o controle, não dessa vez.

-Você é um pouco... Maluca, não é?_ Edgar se afastou alguns passos. Ele me avaliava com seus olhos verde-escuros, que pareciam apontar todos os defeitos em minha personalidade e imagem desleixada. Observei a porta do quarto, aberta atrás de si, e a comodidade com a qual ele me atravessou, sentou em uma das poltronas, esticou as pernas sobre a mesinha e bocejou, confortavelmente. Afinal, quem era o desleixado nesse momento?

-Talvez você não devesse entrar no quarto das outras pessoas assim... Não é educado. Eu poderia estar ocupada, trocando de roupa ou me preparando para um banho, ou apenas não querendo receber visitas._ Explodi visivelmente irritada, mas sem deixar o tom de voz agressivo. Edgar simplesmente continuou a me observar, os olhos semicerrados, avaliando as minhas palavras em sua mente enquanto puxava um pote, que estava sobre a mesinha de vidro em frente à poltrona, repleto de doces. Pegou alguns chicletes, colocou-os no bolso da jaqueta, depois sorriu para mim com caninos pontiagudos e olhos inocentes:

-Eu não entendi. Você fala rápido. Meu inglês é ruim. Mas foi... Divertido._ Ele levantou e foi em direção à porta do quarto depois de roubar metade dos meus chicletes de boas vindas. Alcancei o seu ombro, que era exatamente da minha altura. Eu não queria criar confusão com meus novos parentes, mas ele não estava me dando muitas opções. Olhei para cima, buscava um dos meus olhares de ameaça:

-Você está de brincadeira comigo?_ Seus olhos se voltaram para mim enquanto arqueava as sobrancelhas e avaliava as minhas expressões de raiva. Seus dedos passearam sobre a barba curta e aparada, e ele pareceu, finalmente, entender o que eu havia dito. Suas expressões visuais mudaram, a tonalidade dourada da noite anterior surgiu na íris de seus olhos maliciosos:

-Ah... Você quer brincar comigo?_ Ele pareceu farejar o ar à minha volta. Um ruído lhe arranhava a garganta e ele inspirava o meu aroma. Sorriu maldoso para mim, depois se aproximou rapidamente, prensando-me contra a penteadeira. Senti o meu rosto corar pelo ato repentino, e antes que ele fizesse mais alguma coisa o empurrei dando lhe um forte tapa na face. Ele não pareceu sentir a mínima dor com a bofetada, e mordeu os lábios com um sorriso torto como se tivesse gostado ainda mais do meu reflexo.

-O que está acontecendo aqui?_ Um rapaz desconhecido e de vestes pretas apareceu apoiando-se na porta. Ele não era muito diferente de Edgar em relação ao físico, possuía uma barba rala e olhos negros como diferenças principais. Ele, assim como a média populacional da casa, encarou-me como se eu fosse uma peça famosa de museu, interessante, embora não soubesse o porque. Ele percebeu a postura de Edgar e a minha, e se voltou para o primeiro conversando no idioma natal. Depois olhou para mim, surpreso:

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