Parte VI

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Nico reclamou quando os policiais o pressionaram contra a parede fria do armazém de discos de flutuação.
— Você tem o direito de permanecer calado. Toda gravação ocular será usada como prova no seu julgamento — anunciou o policial acompanhado de um enorme cão de pelos dourados. 
O rapaz gemeu quando sentiu os pulsos apertados pelas algemas magnéticas. 
— Eu sou um legado, droga! As leis de Atlas não se aplicam a mim — respondeu, aborrecido.
O policial lhe puxou pelo braço estendido às costas, do lado de fora, quatro equipes apontavam armas para o fugitivo.
— Senhor Ferrer, a ordem de captura veio do prefeito e do conselho. Temos instruções específicas para tratar do senhor como convém nosso código criminal.
— Eu posso falar com o meu pai?
O policial encarou o rapaz, no rosto dúvida, e submissão. Afinal, era um Ferrer quem o questionava.
— Nosso trabalho aqui é apenas prendé-lo, depois levá-lo à Central de Polícia. Lá o senhor pode realizar os demais procedimentos legais.
Derrotado. Este era o sentimento do filho de Victor ao ser capturado durante a fuga. O prefeito foi rápido ao ordenar a sua prisão. E onde estaria seu pai que não percebera a notificação de segurança atrás do filho? Na cabeça de Nico, o questionamento.
Como esse filho da mãe sabia que eu estava no aeroporto?
O Ferrer tinha total certeza de que seu namorado não estava com a localização ativada, algo que o aborrecia fazê-lo. Nico era um entusiasta da privacidade — ainda que o filho do prefeito o deixasse em posição de risco, já que a política sempre fora um jogo de astúcia, e mortal, algumas peças não se encaixavam.

Uma multidão de repórteres aguardava Nico sair do aeroporto.
O rapaz não conseguia imaginar melhor situação da que aquela para humilhar o pai, muito mais até do que assumir sua homoafetividade em público.
Quando as portas se abriram, drones banharam de flashes o jovem Ferrer. As pequenas criaturas de metal batiam asas e piscavam com suas câmeras de alta resolução, e jornalistas apontavam microfones. O aglomerado de perguntas atravessadas lhe pressionava a atenção.
Tantos canais, tantas perguntas.
O rapaz ficou calado.
A situação saira do controle, e muito dela causada pela sua falta de coragem, e no coração, o peso do remorso frio.
Matar Krevlin não foi uma decisão sensata — pensou.
Do meio da multidão, um rosto conhecido, apareceu.
Jeffords Rodriguez afastou alguns repórteres com seus braços compridos.
— Parecem moscas na carniça — sussurrou para Nico. — Acho que não me atrasei, afinal. Então vamos logo sair daqui. Seu pai mandou eu vir te buscar.
O rapaz deu um sorrisinho aliviado. Ele só queria sair do alcance daqueles olhares da mídia de Atlas.
Eles voltaram pelo mesmo caminho que Rodriguez tinha feito. Parando na lateral de uma viatura branca com o nome Força Policial pintado de azul nas laterais seguido do número 26A.
As portas do veículo abriram como asas.
Bem-vindo, detetive Rodriguez — disse uma voz mecânica. Era ANE, a Assistente de Navegação Extensiva da polícia. — Qual o nosso destino, detetive?
— Vamos para a mansão Ferrer — respondeu Jeffords, acionando os cintos de segurança.
Traçando melhor rota... — um mapa se abriu no vidro dianteiro, números, gráficos e direções eram testadas.
Esperando, Jeffords apanhou um cartão do bolso.
— Você pode virar? — perguntou a Nico. O rapaz fez uma expressão desagradável.
— Não que é algo tão simples de fazer — respondeu, com os cotovelos pressionados às costas.
— Eu vou liberar as algemas — disse Jeffords. — Eu não quero que o seu pai te encontre desse jeito. Isso não ia pegar bem pro meu lado.
Nico virou-se do melhor jeito que conseguira, os cotovelos apertando-se contra o banco.
Então Rodriguez aproximou o pequeno cartão, ao mesmo tempo ANE concluira a pesquisa de rota, estampando no vidro um percurso de vinte minutos até Montana Ferrer.
A trava da algema soou com um bip quando foi liberada.
Nico passava os dedos entre os pulsos marcados. — Experiência de bosta — pensou. — Podemos sair daqui?
Jeffords o encarou, o motor do carro vibrou.
— Tudo pronto.

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