Os olhos castanhos de Kabila estão fixos nos meus, sua boca fechada em um bico, não fofo ou convidativo, mas irritado. Sua expressão não é das melhores, ao contrário disso, está muito longe do habitual. Suas mãos estão apoiadas sobre a bancada do bar, seu corpo ligeiramente inclinado para frente.
Eu a fitava e logo desviava sempre que ela erguia uma sobrancelha. O que eu diria? Sei que deveria dizer algo, mas o quê?
— Vai ficar calada mesmo? – pergunta. Mordo o lábio e tenciono meu pescoço.
Faltava menos de quinze minutos para o final do turno e finalmente eu poderei tirar essa roupa que me pinica em todas as partes.— Você não deveria se zangar pelo o que viu. – digo, me referindo a cena que ela casualmente presenciou entre mim e Zulema.
— Eu sei que não, mas estou e você sabe o porquê.
— Já conversamos sobre isso. Você faz com que eu me sinta constrangida.
Ela passa a mão pelos cabelos e tira debaixo do balcão uma garrafa de vodca. Kabila serve nós duas em copos de shot. Minha garganta queima quando a bebida forte desce, aperto os olhos por alguns segundos, sentindo meu estômago queimar.
— Deveria ter pedido demissão antes dessa merda acontecer. – há uma amargura desconhecida em sua voz.
— Está arrependida de ter se apaixonado por mim?
— E não deveria? – ela ri sem humor. — se você mal me corresponde, mal nos dá uma chance. Agora que assisti você com aquela mulher que nunca vi antes, vocês estavam quase...
— Não estávamos quase nada! Não queira insinuar nada, Kabila! E sabe do que mais? Essa conversa já me encheu!
— Okay, okay. – ela se serve de mais um shot, e logo mais um outro. Como eu quero essa garrafa. Desesperadamente e de repente não me importo de me submeter à um coma alcoólico. — Você tem que voltar pra lá, Anabell está de olho em nós duas.
Me viro, seguindo seu olhar. Anabell acena, tenho ânsia. É como estar na pele de um pássaro desatento, diante de uma naja oportunista.Deixei o copo vazio, Kabila, e minhas decepções ali no bar e voltei para o mar de mãos ásperas.
[...]
Na ida para o camarim, uma confusão me faz parar. Mais da metade das minhas colegas de trabalho estão paradas no meio do corredor, entre as portas. Todas de costas, murmurando no mesmo tom confuso. Uma verdadeira bagunça!
Minha curiosidade aguça quando uma delas grita, parecia assustada com algo. Fico na ponta dos pés para tentar enxergar o motivo da baderna, mas apenas capto o som da porta batendo atrás de Sandoval. Um silêncio absoluto se sobrepôs no alto dos sussurros, uma fila, ainda bagunçada, se formou entre as paredes do corredor e só ai pude ver a causa dessa cenário conturbado.Levei minha mão até a boca, mas ninguém parecia notar a minha presença. Apenas Sandoval, e o corpo ensanguentado de Anabell eram o alvo da pequena plateia.
— O que é isso?! – gritou meu chefe.
Apesar de não gostar de Anabell, não consegui deixar de sentir a dor de seus membros quebrados, seu rosto cobertor por aquele vermelho vivo, o roxo e o inchaço de seus olhos. Meu estômago embrulhou, desviei meu olhar e encontrei Rizos, estranhamente me fitando. Ela me inspecionava, quieta e inteiramente indiferente ao que acontecia.
— Quem fez isso?! Eu quero que a responsável apareça agora! – o grito dele me tira transe. Ele mirava cada uma de nós, como se qualquer gesto ou expressão fosse nos entregar.
— Kabila. – chamou. Por um segundo pensei que... — chame os seguranças, diga que os espero na sala das câmaras.
Ela assentiu e apressada, se foi.

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Unravel
FanfictionPassar anos presa a uma boate nunca foi o sonho de Macarena Ferreiro, logo ela já não suporta mais a vida que leva e por si só tenta refazer os passos abandonados de quando era apenas uma garota que buscava alcançar suas metas. Porém, a suspeita de...