Capítulo 6

89 1 2
                                    

Fazia tempo que Catherine não se encontrava assim. Deitada em sua cama, pensando na vida, ou melhor, remexendo no passado. Ela ainda continua sendo forte, não irá desabar. Mas de certa forma, ir embora foi o desabar dela. Era idiotice pensar que se mudando iria fazê-la esquecer tudo que tinha guardado dentro de si e tudo que assombrava seu passado, nunca iria esquecer, estaria sempre guardado dentro dela, como agora. Ela quase não pensava mais no quanto sentia falta do sorriso materno de sua avó, nas brincadeiras de seu avô e na proteção dos braços de Vitor. Era como se ela estivesse seguindo em frente de verdade. Tocando com a vida. Estava feliz ali, na companhia de Luke, que era tão atencioso e nunca a deixava ficar triste e com seus novos amigos que eram tão legais sempre, sem falar no quanto amava aquela cidade. Era verdade que sentia saudade da Paloma e da tia, tinha saudades também dos antigos amigos, mas isso sentia até mesmo no Brasil, já que com o fim do colégio, todos foram se afastando. Deixou esses pensamentos sobre o passado para trás e pensou no presente e no futuro. Talvez devesse arrumar um emprego de meio período para passar o tempo, já que tinha muito tempo livre, mas não precisava do dinheiro, com todo o dinheiro que foi deixado para ela, Catherine tinha dezoito anos e era rica, muito rica. Sua família sempre teve uma boa condição financeira, e com “sempre” quer dizer desde que o avós saíram do interior e começaram a ganhar dinheiro com seu negócio, crescendo cada vez mais e se tornando ricos. Mas Catherine nunca se importou muito com isso de dinheiro, para ela não fazia diferença morar numa mansão ou numa pequena casinha, desde que houvesse comida na mesa e amor no lar, era tudo que precisava. Catherine tinha tudo. Menos o amor. E o que faria no futuro? Quando terminasse a universidade e se formasse? Continuaria ali? Mudaria de país ou cidade…Voltaria para o Brasil? Só o tempo poderia responder essas questões.

– Você está bem, Cat?

Era o Luke, colocando a cabeça para dentro do quarto.

– Eu toquei a campainha e você não atendeu, pensei que não estava em casa, mas ai vi que a porta estava destrancada e fiquei preocupado.

– Está tudo bem…Estava apenas pensando na vida. Não ouvi a campainha.

Ele suspirou aliviado.

– Eu sei que você precisa de tempo as vezes e tudo o mais, e eu te admiro por ser tão forte como é, mas por favor, não comece a se trancar no quarto e deixar a vida passar e não fazer parte dela.

– Eu sei, eu sei.

– Eu trouxe sorvete, levanta daí.

– Não! - protestou sonolenta. – Venha aqui, pega dois colheres lá na cozinha e volta aqui.

– Tem certeza que eu posso entrar no seu quarto?

– E por que não poderia?

– Sei lá, vocês meninas são estranhas, se eu entrasse no quarto da Alicia ou da Hannah, elas me espancariam até eu ficar em carne viva.

Catherine começou a rir e Luke foi pegar as colheres e sentou-se na cama. Sorvete de flocos, o favorito de Catherine. Luke observou todo o quarto, como se ali fosse algum tipo de paraíso feminino secreto, e então se deteve nas fotos que estavam na parede. Catherine havia acrescentado mais três fotografias, uma com a Paloma, uma na praia sábado com os amigos e uma com o Luke e Catherine rindo um para o outro - Alicia que tinha tirado aquela foto.

– São…?

– Meus pais, meus avôs, meus amigos e o Vitor, sim.

– Você se parece com eles… Quem é Vitor?

– Meu namorado, ex-namorado…

Ela não sabia dizer o que significava sua expressão. Mas antes que ele pensasse alguma besteira, ela disse diretamente:

– Ele morreu.

Seus olhos se arregalaram e sua boca se abriu em um “o” perfeito, ele baixou a cabeça e quando levantou para falar algo, seu tom era pesaroso, como se tomasse a dor dela para si.

– Eu não sei o que dizer, Cat, sinto muito é a única coisa que me vem à mente.

– Não precisa dizer nada. Está tudo bem.

– Sem querer ser inconveniente e nem te fazer pensar mais nisso, mas, há quanto tempo aconteceu?

– Há mais de um ano.

– Eu não sei como você consegue suportar tudo isso consigo, carregando sempre um sorriso…

– Eu apenas estou seguindo em frente, não direi que é fácil, porque não é. Eu tenho que ser forte por eles. Tenho que ser. Você não faz ideia do inferno que era em minha mente. Aqui é o meu recomeço, Luke. Estou vivendo. Quando eu era pequena e perguntava por meus pais, a vovó dizia que eles estavam me olhando lá do céu e vovô dizia que me amavam muito, que eu nunca poderia esquecer isso. Talvez estejam todos me olhando agora e eu os deixarei orgulhosos.

– Tenho certeza que estão orgulhosos, estejam onde estiverem.


– Você acredita que existe um paraíso, Luke?

– Eu não diria exatamente um paraíso, mas um lugar bom para onde as pessoas boas vão, sim. Sabe, isso de crenças sempre foi meio complicado para mim, a maioria das pessoas seguem a religião que os pais seguem apenas por comodidade e quando você tem uma opinião diferente, se sente meio pária, sabe? Meus pais e meus irmãos são cristãos, mas não do tipo fanático, nem nada, vão à missa normalmente, essas coisas, mas desde cedo eu questionava todas as coisas, tinha minhas próprias crenças e perguntas. Sou agnóstico teísta. E você, acredita no paraíso?

– Eu não sei. Sinceramente. Mas eu espero, de todo o coração, que exista, que eles estejam em um bom lugar. Acho que eu sempre fui meio pária. Também tenho minhas próprias crenças, e raivas. Como eu posso acreditar nesse Deus que todos veneram? Se ele permitiu que aqueles que eu amei fossem tirados tão cruelmente de mim, como pode permitir toda destruição, ódio e necessidade que há no mundo? Guerras, doenças… Por quê? Mas ainda assim, eu acredito numa força maior. Mas com certeza não nesse Deus que dizem existir.

– Eu entendo o que você quer dizer.

– Você tem planos para o futuro?

– Alguns. Me formar, me estabelecer financeiramente, formar uma família com alguém que eu ame e que me ame também.

Catherine sentiu como se garras frias envolvessem seu coração ao ouvir Luke falando em se casar com alguém. Estava sendo idiota, porque sentira isso? Luke era seu amigo, devia se sentir feliz se ele estivesse feliz. Se encontrasse o amor de sua vida. Luke merecia. Pensou em si mesma e no quanto não tinha nada planejado para o futuro. Era quase como não ter uma base.

– Ei, por que ficou tão calada? Está pensando no futuro?

Catherine mal percebera que estava viajando por entre pensamentos e quando se deu conta, viu que o tempo todo fitava Luke sem realmente vê-lo.

– Não. Não tenho planos para o futuro.

Luke apenas a olhou como quem compreende.

– Eu me lembro de uma coisa que meu avô me disse, uma coisa que eu guardei comigo dali em diante. - Luke começou a dizer, depois de um tempo, quando o sorvete já estava quase no fim. – Ele me contou que a vovó era o amor de sua vida, que na primeira vez que a viu e olhou em seus olhos, soube que era ela. Ele me disse que um dia eu também encontraria o amor da minha vida, que naquele momento mesmo, ela estava em algum lugar, e que quando a encontrasse, não podia perdê-la. Eles estão casados há cinquenta e oito anos, e o vovô disse que a cada dia que passa, a ama mais, tinham um história juntos, de dificuldade, união e acima de tudo, amor e respeito. Eu achei aquilo tão lindo, Catherine, mesmo que eu tivesse apenas onze anos, eu desejei um dia encontrar alguém que fizesse eu me sentir daquela maneira como o vovô descreveu.

Catherine não tinha palavras. Queria abraçá-lo por ter compartilhado isso com ela. Queria dizer tudo e ao mesmo tempo nada. Mas de qualquer maneira, a forma intensa como ele a olhava nos olhos, impediu que ela dissesse uma única palavra. Naquele momento ela poderia beijá-lo.

– Ah! Esqueci de dizer, vou dar um festa nesse fim de semana.

Me EncontraWhere stories live. Discover now