Gwen
Tinha passado a manhã olhando para o túmulo da minha mãe antes de ir para a faculdade, pensava em tudo o que estava acontecendo, primeiro os sonhos estranhos, sonhos lúcidos.
Minha realidade foi virada de ponta cabeça, cinco meses antes tudo estava bem, e foi então que aconteceu, meus sonhos começaram e então minha mãe caiu de cama em uma doença inexplicável que médico algum conseguira diagnosticar e quando realmente tomamos ciência, já era tarde demais, ela definhou em exatos três meses naquela cama, me lembro de ouvir algumas coisas que a mesma resmungava em momentos de dor extrema e foi então que uma noite tudo cessou, ela apenas se calou, seu corpo magro e pálido ficariam marcados para sempre em minha memória, a mulher cheia de vida que me amava imensamente, havia partido. Era uma sensação inexplicável em meu peito, era tão incapacitante que nem forças para falar eu tinha, passei semanas sem dizer nada, nem em seu enterro, apenas fiquei ali, sentada na cadeira sem entender como aquilo acontecera enquanto ouvia as pessoas dizendo as mais diversas palavras de conforto.
Os dias passaram lentamente, se arrastando, gelados e nublados, o tempo parecia ter estagnado em um céu cinzento, e para fechar com chave de ouro, os meus colegas da faculdade me olhavam com pena quando passava pelos corredores quieta. Eu havia mudado, parte de mim havia morrido e a Gwen que não tinha medo de nada e ninguém, se viu desamparada e com seu mundo despedaçado.
A imagem da mulher que me criou, deitada naquele caixão com uma expressão serena no rosto, lembrar que não pude fazer nada me matava a cada dia, chegava a ser uma tortura. Estava parecendo um verdadeiro zumbi no meio de tantos jovens felizes e animados com a festa que aconteceria no fim de semana. Afinal, a grande alegria do jovem universitário era isso, e claro, café.Enquanto isso, eu apenas pensava em qual apartamento alugaria, pois não poderia ficar mais naquela casa, era mórbido para mim, ainda podia ouvir os passos da mulher nas escadas, ouvir seus gritos de dor e seus suspiros pesados durante a noite. Isso definitivamente me deixaria louca, pensar que teria todos os meus melhores momentos bagunçados por uma tragédia que me acometeu de um dia para o outro.
Sendo assim, pensando no quanto poderia gastar no apartamento enquanto olhava para os anúncios, frustrada por ser tudo muito fora do meu orçamento ouço a voz de uma das meninas, Kalsey, que se aproximava da sua forma mais alegre possível, ela se senta ao meu lado e olha meu rosto pálido e esboça um sorriso gentil antes de fitar os anúncios que me deixavam tão concentrada.- Conseguiu achar algo bom?
Apenas balanço a cabeça negando e então a mesma passa os a mão pelos fios de seu cabelo loiro brilhante que parecia ter sido hidratado no dia anterior.
- Já pensou em dividir o apartamento? Como eu e a Wendy fazemos. Nós podemos te ajudar também.
- Obrigada K. Mas olha, você e a Wendy moram juntas, a Kate mora com os pais, só sobra o Andrew e o Caleb que moram naquela república nojenta.
- Não é nojenta, você que tem um TOC por limpeza, apesar de que o seu quarto tem estado um verdadeiro nojo esses tempos.
Apenas faço uma careta e então sinto as mãos de Caleb em meus ombros me fazendo uma espécie de massagem enquanto se debruça levemente em meu corpo para fitar os anúncios.
- Oi meninas, só quero dizer que não aguento mais ter que ficar indo no laboratório o tempo todo por causa daquele professor, são fungos, estão isolados nos seus devidos potinhos, não vão sair destruindo tudo.
O rapaz de cabelos pretos como a noite se senta ao meu lado e pega a lata de refrigerante que eu nem tinha aberto e volta novamente o seu olhar para os anúncios dos apartamentos comigo.
- Cal, a Gwen vai dividir o apartamento com alguém, eu sugeri você ou o Andy, mas ela disse que não quer companheiros nojentos.
- Eu não disse isso, disse que a sua república é nojenta.
Faço uma careta ao ver a expressão divertida dos dois, implicância era um dom que eles tinham, dominavam essa arte, a troca de olhares entre eles me faz revirar os olhos e então antes mesmo que os dois viessem com as perguntas sobre o meu estado físico e mental, aponto para um apartamento que tinha me agradado, olho para eles e suspiro cansada.
- Acho que vai ser esse, com o aluguel da casa da minha mãe e com o trabalho talvez eu consiga manter tudo sob controle
Sorrio e olho para ambos que analisam concordam com a cabeça, não disseram nada, não era necessário, não precisaria de mais palavras de conforto ou coisas do gênero, só precisava me mudar, que o resto se encaixaria com tempo e terapia. Rapidamente junto todos os papéis que havia espalhado pela mesa e jogo tudo na bolsa antes de me levantar.
- Em minha defesa, minha república não é nojenta, os meninos sim. Então me leva com você. Ou melhor, leva o Andy, ele atrapalha a harmonia da casa.
Olho para Caleb que sorri e pisca um dos olhos para mim antes de beber um gole do refrigerante que era meu.
- Ele atrapalha a harmonia ou te impede de espiar os garotos se trocando?
- Os dois
Quando estava com meus amigos conseguia finalmente viver como uma pessoa normal e aceitar o que estava acontecendo comigo nesses meses, por vezes até me esquecia do acontecido, tem sido mais fácil com eles ao meu lado, isso é fato, mas no momento em que chego em casa não tenho o que fazer sem ser ignorar tudo o que aconteceu para não voltar a ficar enterrada na minha cama e em meus pensamentos, me afogando na minha culpa.
Essa mudança seria boa para mim, definitivamente. Mas eu não sabia que seria tão difícil romper esses laços com o que foi o meu porto seguro, deixar não só a casa para trás, mas também, a minha mãe, de certa forma.
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Federkleid
FantasyDepois de um trauma em sua vida, Gwen descobre suas raízes passadas sendo uma bruxa perseguida em uma caçada mortal que vai muito além dos anos. Gwen Williams é uma estudante de medicina que tem sua vida mudada de cabeça para baixo após o faleciment...