No sábado de manhã, ambas estavam na expectativa. Lauren queria ir logo pra casa de Camila, mas achou ridículo chegar muito cedo, seria bandeira demais. Já a chef andava de um lado pra outro pensando no que preparar para a sua convidada. Como gostava de peixe, resolveu seguir a intuição. Por fim cozinhar a distraiu e quando temperava o linguado o interfone tocou. Foi correndo atender.
- Entrega de uma garrafa de vinho.
- Opa, é aqui mesmo. - abriu se sentindo animada.
Lauren entrou e logo ela a recebeu na porta com um sorriso.
- Bom dia.
- Cheguei muito cedo? - vinha com capacete em uma das mãos e uma pequena mochila nas costas.
- Não, chegou na hora. Estava temperando seu almoço, aliás, nosso.
A morena gostou de ouvir aquilo.
- Quer esperar na sala ou ir pra cozinha comigo?
- Ah, prefiro vê-la cozinhar.
- Está animada pra andar de moto hein?
- Adoro andar de moto, um dia eu pego a estrada e vou pro sul.
- Nossa que longe! - Camila brincou.
Seguiram pra cozinha e Camila preparou a frigideira pra dourar o peixe.
- Vai dar uma fumacinha, mas não assusta. - jogou as postas de peixe e depois o azeite e um molho que Lauren não soube dizer o que era.
- Gosto de dourar porque fica crocante por fora e macio por dentro.
- Que peixe é?
- Calma, me deixa terminar.
Pacientemente a publicitária esperou com os olhos atentos aos movimentos de Camila. Ela foi colocando o peixe e por cima um molho. Depois fez uma salada bem rapidinha e serviu com arroz simples.
- O arroz é opcional, não precisa comer se não quiser.
- Estou com fome, vou comer tudo. - riu.
- Essa é minha tática, deixar os convidados com fome pra impressionar na hora de servir. Se ficar bom ou não, eles vão gostar do mesmo jeito.
- Você não precisa disso. O que vamos comer?
- Linguado com molho de limão e cogumelos.
- Hum. - Lauren fez uma cara de cobiça pra cima dos pratos.
- Eu gosto de peixe, então arrisquei.
Serviram-se e almoçaram batendo papo. Era disso que Lauren sentia falta e só podia ficar grata. Não era só a presença de Camila, mas a delicadeza em chamá-la pra almoçar.
- Se pudesse, faria isso todos os dias. - a morena falou mais pra si mesma.
- O que disse?
- Pensei alto, mas posso repetir. Se pudesse faria isso todos os dias da minha vidinha. - falou franzindo o nariz.
- Vidinha? Sua vida é ótima, do jeito que falou parece até que não gosta dela.
- Gosto em partes, adoro meu trabalho, amo o que faço e é aquele discurso profissional que você já deve conhecer. Mas quando se trata da vida pessoal, é vazia, muitos contatos, poucos amigos. Não sou chegada à rotina, mas gosto de dividir o dia a dia. Entendeu?
- Não. - Camila a olhava com certa curiosidade.
- Derek sempre me repreende por nunca ficar com uma pessoa por muito tempo. O problema é que as mulheres com quem namorei são vazias, previsíveis, fúteis e essas coisas a gente enjoa muito fácil. Por isso sempre terminei, sempre dei a desculpa do "não é você, sou eu". - fez a chef rir. - Eu quero ter alguém pra discutir comigo, me contrariar, alguém que pense e me faça até raiva às vezes.
- Uma mulher de personalidade então.
- Por aí... não precisa ser turrona ou mal humorada, do contra. Alguém que eu possa conversar.
- E não serve uma amiga?
- Serve, mas e a paixão? O amor? A vida a dois que deve ser uma delícia.
- Você diz deve ser, então nunca experimentou?
- Sinceramente? Não, o máximo que já namorei até hoje foram dois anos e no final a coisa tava periclitante. - brincou.
Camila ligou o som e deixou tocar as músicas dos cd's que Lauren havia lhe dado.
- Gosta mesmo do Ed Sheeran, não?
- Em especial dessa música. - no momento tocava Give Me Love e como sempre, quando escutava, Camila se sentia invadida pela letra e melodia.
Lauren escutava atentamente e olhava pra ela, que agora retirava os pratos da mesa e ia levando pra cozinha. Naquele momento um sentimento de proteção tomou conta dela. Não sabia se era por ouvir a música e se deixar emocionar ou se era algo de fato acontecendo. Queria pegar Camila e abraçá-la.- Você quer comer a sobremesa agora? - perguntou tirando a morena de seus pensamentos. Reparou que Lauren tinha os olhos marejados, mas preferiu ser discreta e não perguntar nada.
- Agora não, quero sentar naquele sofá confortável e conversar com você.
Camila olhou pra ela, achou que veria algum sinal de audácia ou malícia, mas não. Somente terminou de retirar as coisas da mesa e foi pra sala.
- Sempre que come você tem que recolher as coisas e deixar tudo arrumado? - Lauren pareceu curiosa.
- É um costume que adquiri em casa. Confesso que nem sempre acho bom, mas não consigo perdê-lo. Minha mãe é uma exímia dona de casa. Gosta de tudo muito limpo e impecavelmente arrumado. - riu. - Cresci ouvindo que não podia entrar de sapatos em casa, que não era pra sentar na cama, não colocar copo nos móveis. No fim das contas eu mesma criei o hábito de deixar tudo arrumado.
- Mas não é ligada nessas coisas?
- Não. - ela riu. - Só na cozinha. Minha roupa de ontem, por exemplo, está lá jogada na cadeira do meu quarto.
- Ainda bem, achei que era uma lunática.
- Sou muito organizada, gosto de ter tudo à mão, porque ganho tempo com isso.
- Ta certa. Eu sou meio bagunceira.
- Sério? Nem parece, você tem cara de ser enjoada.
- Que isso! Me acham tão legal. - Lauren fingiu mágoa.
- Você é legal, mas parece ser exigente.
- Sou, mas confesso que me atrapalho no quesito organização. Penso rápido demais e às vezes nem eu consigo me acompanhar. Você disse que sou legal. Acha mesmo isso?
- Acho. - a chef sorriu timidamente.
- Que mais você acha? - Lauren tentava uma aproximação. Foi chegando mais perto.
- Te acho inteligente.
- Hum... - fez uma cara pensativa e foi chegando mais perto.
- Engraçada.
Mais perto.
- Tem caráter, responsabilidade.
Chegou mais perto ainda.
- Além de ser uma excelente profissional, já andei lendo sobre você e me impressionei.
- Leu sobre mim? - estava quase de frente para Camila. Resolveu ajoelhar no tapete e ficar praticamente de frente pra ela. - O que leu?
- Você ganhou muitos prêmios da publicidade, trouxe muito prestígio a Rio Quality e está no ranking das melhores do mundo.
- Não sabia que tinha essa curiosidade, nunca me falou.
- Eu li sobre você quando me contrataram pra fazer a festa de fim de ano. Li sobre Derek também.
O sorriso de Lauren morreu.
- Confesso que me detive mais sobre você, achei mais interessante.
A morena voltou a sorrir.
- Também li a seu respeito. - a publicitária falou. - Achei que pessoalmente é diferente em algumas coisas.
- Que coisas? - Camila pareceu se preocupar.
- Alguns comentários sobre sua personalidade. Dizem que é muito séria, que não é de dar papo pra imprensa, só pra sua coluna no jornal. Falaram que é jogo duro quando faz uma crítica e que o que diz é lei na gastronomia.
Camila ficou impressionada com as informações.
- Já me chamaram de colher de pau, às vezes sou severa com alguns chefs.
- Discordo, você é severa comigo. - riu.
- Besta! - Camila a empurrou, fazendo-a cair sentada no chão.
- Discordo de outras coisas. - se levantou ficando novamente de joelhos. - Você é educada, reservada sim, mas de uma forma delicada. Quando está trabalhando tem os gestos sutis, as mãos precisas e eu nunca imaginei que isso fosse chamar minha atenção.
Camila já estava corada de vergonha, mas Lauren não parou com os elogios.
- Além do mais é extremamente profissional e dedicada, nota-se que faz tudo com o coração, sem nem pensar no dinheiro.
- Aí que você se engana, eu penso no dinheiro também.
- Sem dúvida, mas quando está cozinhando esquece-se de tudo, vejo no seu rosto. - olharam-se nos olhos.
- Você olha demais pra mim. - desviou o olhar.
- Olho porque sou completamente louca por você e já não sei mais o que eu preciso fazer pra você enxergar isso e me aceitar. Eu queria muito que ficasse comigo e me desse um beijo. Primeiro porque estou apaixonada e segundo que meus joelhos doem. - sorriu. Estavam tão próximas que podiam sentir o calor de suas bocas.
Camila fechou os olhos e os abriu ainda olhando para Lauren.
- Então levanta daí e vem me dar um beijo.
Lauren demorou alguns segundos para entender a frase e foi tempo suficiente para que Camila achasse que tinha se precipitado. Quando ela quis se afastar a morena segurou seu braço.
- Falei demais.
- Não, pela primeira vez falou o que eu tanto aguardava.
Suas bocas se encontraram num beijo tão forte que seus corpos se arrepiaram mutuamente. E dessa vez foi diferente, Lauren sabia que Camila queria tanto quanto ela. A morena se ajeitou entre as pernas dela e segurou em sua cintura. Não queria parar de beijá-la, mas aquela posição não ajudava. Foi se levantando e isso deu a impressão de que avançava sobre a chef.
- Calma aí. - Camila interrompeu o beijo.
- Desculpa, não quis ser abusada, é que meu joelho está doendo. - fez uma careta.
- Vem cá.
Camila sentou virando de lado na poltrona e Lauren ficou de frente pra ela.
- Assim é melhor?
- Vai melhorar ainda mais se você me der outro beijo.
Camila riu e a beijou novamente. Só que agora com calma, mais carinho, tiveram a sensação de serem um casal que há muito se conheciam. Suas línguas se buscavam com vontade e não podiam negar que era o melhor beijo de suas vidas.
- Por que riu agora pouco? - Lauren perguntou.
- Pelo seu jeito de falar, não perde a oportunidade de fazer uma graça, de dar uma cantada. Não precisa mais, eu já cedi.
- Cedeu? Então quer dizer que está me beijando pela insistência.
- Não Lauren, aliás, sim estou te beijando pela insistência, mas também porque quero, porque tenho vontade.
- Bom, se fosse pela insistência eu também não ia ligar.
A chef gargalhou.
- Você não tem jeito.
- Eu tenho, só tem que ler no manual.
Voltou a beijá-la e não quis mais parar, ficaram no sofá se beijando quase a tarde toda. O tempo havia parado para elas. Nem repararam que uma já estava praticamente no colo da outra. Camila colocou as duas pernas em cima das de Lauren e deixou que a morena a abraçasse. Não era só beijo na boca, eram beijos delicados pelo pescoço, ombro, carícias que ambas estavam adorando. Nada insinuante ou ousado, simplesmente carinho. Em dado momento, Lauren parou e ficou olhando pra ela. Nunca podia imaginar que depois de tanto insistir, Camila ia ceder assim tão de repente. Não que estivesse achando ruim, só estava surpresa.
- Que foi? - a chef perguntou.
- Acho que vou querer a sobremesa.
- Vou lá buscar.
Ela veio trazendo um prato só, não estava mais com vontade de comer doce àquela hora.
- Repeti a receita da festa de ontem, você não comeu.
- Reparou que não comi? Então estava prestando atenção em mim?
- Sempre presto atenção se os convidados estão comendo ou não e o que gostaram mais. É o meu feedback.
Não era bem o que Lauren queria ouvir, mas não estava em condições de reclamar, já havia conseguido demais pra um sábado.
- Não comi porque estava ansiosa em ver você. - baixou o olhar.
- Então me ver faz você perder a fome? Isso será um problema. Sou chef de cozinha, como faremos? - fingiu um drama.
- Foi só ontem, não viu que eu almocei hoje?
- Vai ver queria me impressionar. De repente nem gosta da minha comida, come só pra agradar.
- Não ta falando sério né? - Lauren chegou a olhar assustada.
- Anda, come, veja se gosta.
Havia feito crepe de nutella com geleia de morango.
- Não gosto de fazer crepes grandes, mas se quiser outro tem mais viu.
Lauren provou e achou uma delícia.
- Lembra no réveillon que eu deixei um restinho de pavê?
A chef fez que sim com a cabeça.
- Pois então... - deixou só o recheio na colher olhou para ela. - Acho que fica mais gostoso assim. - passou a colher na boca de Camila.
- Ei, não faz isso.
- Calma! Eu vou limpar. - não deu nem tempo dela se mexer. Passou a língua e logo abocanhou aqueles lábios. Sugou, mordeu, lambeu e de uma forma tão sensual que Camila chegou a gemer baixinho e Lauren estava gostando daquilo.
O dia passou que as duas não perceberam. Quando escureceu Lauren disse que teria de ir embora.
- Acho que está na hora de ir né?
- Você quer ir ou está dizendo isso achando que eu é que quero que você vá?
A morena olhou com sinceridade.
- Se eu pudesse não sairia mais daqui. - beijou os lábios da mais nova. - Mas você deve querer fazer alguma coisa, ou talvez queira descansar.
- Não estou cansada, não fiz nada hoje.
- Posso te fazer uma pergunta?
- Serei obrigada a responder? - Camila franziu o nariz num gesto tão lindo que Lauren sorriu e beijou a ponta dele.
- Não.
- Então manda.
- Hoje você está diferente, não só porque ficamos, mas está mais... digamos que amistosa. Resolveu abrir a guarda pra mim. Não estou reclamando, só queria saber o motivo.
- Voltei pra casa ontem com mil pensamentos, confusa, indecisa, chateada e ao mesmo tempo animada, não sei dizer. Pensei em tudo que já ouvi sobre mim até hoje e não é o que li viu, é o que me falaram.
- Como assim falaram?
- Lauren não se faça de boba, sei muito bem que Dinah e você estão de conluio. - brincou com a palavra.
- Conluio? Ah isso é uma injúria.
- Não é. - olhou seriamente pra ela. - Caso contrário seus presentes não chegariam a mim, nem suas surpresinhas. Mas deixa, não fiquei brava.
- Ainda bem! - Lauren levantou as mãos num gesto de alívio.
- Cachorra! - Camila lhe deu um tapa. - Agora admite né?! Bom, pensei também no que as meninas falaram ontem.
- Falaram o que? - se fez de boba.
- Sobre se relacionar, sobre aproveitar a vida e as oportunidades. - olhou com certa timidez. - Sou uma pessoa muito reservada, Lauren. Tenho muitos medos, porque não tenho ninguém. Minha família não quis mais saber de mim e assim é ate hoje, tem mais de dez anos. Sofri muito por alguém que não me amou e tenho um rancor que não acaba. Não sou a melhor companhia do mundo, tenho manias, tenho momentos de solidão e de mau humor. Não gosto de bagunça, não tenho muita paciência às vezes. Ninguém quer ficar perto de alguém assim.
- É... - Lauren se afastou. - A propaganda negativa está forte. Como sou uma publicitária de sucesso, talentosa, ganhadora de prêmios, você mesma quem disse... - olhou sorrindo. - Sou versátil e gosto de olhar o produto por vários ângulos. - levantou uma sobrancelha. - Aqui na minha frente vejo uma mulher batalhadora, sofrida não sei, talvez aborrecida pelos tropeços da vida. Mas que deu a volta por cima, se tornando alguém competente e requisitado. Nesse pacote profissional ainda veio uma mulher forte, deliciosamente linda e gostosa. - beijou-a. - Cheirosa e elegante. - mordeu o pescoço. - Sem contar que é educada, bondosa e inteligente.
As palavras dela fizeram Camila chorar, algo que raramente fazia na frente das pessoas.
- Eu levo esse produto pra casa sem pestanejar. Vem aqui, não chora. Você não é nada disso que falou e se alguém falou que é, era porque sentia inveja. Aprenda a se valorizar e se não souber fazer isso, eu farei.
Camila sorria e chorava ao mesmo tempo. Lauren sabia animá-la, mesmo quando nem sabia que ela estava chateada. Abraçaram-se e a chef repousou o queixo no ombro da morena. Depois de um tempo ela falou bem baixinho.
- A resposta é sim.
- O que disse? - Lauren a afastou.
- Ah... nada...
- Nada não, disse sim. Repita por favor, você disse tão baixinho.
Camila olhou para baixo e depois levantou o olhar, fechou os olhos e abriu de novo, num gesto quase medroso.
- Eu disse que a resposta é sim.
Lauren a princípio não entendeu, mas depois se lembrou do que tinha perguntado. Sorriu e puxou Camila contra seu corpo.
- Mania que você tem de me responder bem depois que eu pergunto, por que hein?
- Pra testar sua memória e saber se você não estava brincando comigo. Por um momento havia esquecido a pergunta, não é?
- Ta, eu me perdi um pouco, afinal hoje foi um dia de surpresas, mas não esqueci. Está falando sério?
- Se você tiver paciência, se não se importar com a minha bipolaridade.
- Adoro seus dois extremos e vou aprender a lidar com eles.
Voltaram a se beijar, mas sempre comedidas. Lauren não queria ser abusada e Camila não parecer oferecida. Nem sabia como agir, fazia muitos anos que não se envolvia com ninguém e saber as regras do bom comportamento já não era com ela. Depois de muitos beijos, Lauren decidiu ir. Queria que a chef pedisse pra que ficasse, mas ela não pediu. Camila também quis que Lauren decidisse ficar, mas pra ela a morena pareceu querer ir embora.
Despediram-se contra vontade.
- Posso te ver amanhã? - perguntou a publicitária.
- Você vem ou eu vou?
- Quer ir lá pra casa? A gente pode dar uma volta.
- Ta bom, apareço lá amanhã.
Beijaram-se novamente e a morena se foi.
Tirar o sorriso do rosto de Lauren era impossível, assim como diminuir as batidas do coração de Camila. Sempre que pensava na publicitária sentia seu corpo se acender. Custou a dormir, mas quando caiu no sono só teve bons sonhos e pela primeira vez em anos.
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Medida Certa
Hayran KurguCamila tem seu coração completamente protegido atrás de um parede de puro concreto e aqueles que tentarem se aproximar dele serão friamente desencorajados! Porem Lauren não vai desistir facilmente.. Esta fic é uma adaptação.