O banco

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Sentado num banco à luz do luar,
Vejo se aproximando uma idosa,
Quase como um barco prestes a naufragar.
Ela se senta, pesarosa,
Querendo conversar.
Espero que não sejas leprosa!
Com o cigarro na boca, me pego a pensar:
"Maldita velha ociosa.
Que fazes tão tarde longe de seu lar?"

A maldição desta senhora,
Me faz levantar.
Maldita foi a hora que chegaste
Para me perturbar.
Quando pego meu jornal, ela, sem demora,
Põe-se a me chamar.
"Maldita velha", penso, "Terei de excomungar-te com uma priora?".
"Que queres, dona?", pergunto-lhe a bufar,
"Tenho três filhos em casa. Preciso ir agora!".
Ela, com o demônio no olhar,
Se põe, com a chegada da aurora,
A balbuciar:
"És solteiro, homem. Tendes nada de ir embora".

A senhora me faz jogar minutos a fio,
Tentando lembrar de onde havia lhe visto.
"És dona de bordel?", chio.
Só poderia ser de lá que saira isto
"Diga-me", insto ao ofídio.
"Já sabes quem sou, homem. Nosso encontro já estava previsto".

"Sepulcro da humanidade", vocifero,
"Achas que te conheço, criatura banal?".
Sem falar, ela, com um sorriso insincero,
Retira das vestes o colar fatal.
"De onde pegaste isto?", reverbero,
"Viera me assombrar, ser imoral?"
Neste momento me exaspero.
Demonstro o meu entendimento de forma cordial.

"Profeta do pecado", disse-lhe," senhora do destino,
Que és demônio ou enviada do divino,
Animal ou menino,
Me leve ao reino,
E dê-me uma chance de converter-me ao Deus trino!"

"Homem,", ela proferiu, "tu eras bom.
Nasceste de uma mãe apaixonada.
Por que perdeste o tom?
A mulher fora usada,
Você a deflorara apenas por usar batom.
A sentença é uma piada.
Espero que ainda se perdoe, se tiver o dom".

Passaram alguns anos e continuo no banco,
Enquanto me é dado o ensino.
Pessoas olham e eu me espanco.
Não sei se escutarei da morte o hino,
Mas continuo forte e franco.
Espero a segunda visita do divino,
Para o dado solavanco,
Que libertará meu espírito.

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