II

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São Paulo
2019

- Mas que merda! - Disse isso consideravelmente alto, devido ao meu fone
de ouvido estar tocando Cícero no último volume. Ainda bem que na agitação do metrô, ninguém me ouviu.

Eu estava prestes a pegar o trem quando lembrei que havia esquecido meu cartão e teria que atravessar toda a estação e andar até minha casa na Santa Cecília. Mandei uma mensagem para a Giovana, que insistiu em pagar meu café e resolvi dar meia volta e seguir meu caminho até a Avenida Paulista.

Faltava apenas uma semana para meu embarque. Já estou sentindo falta dessa cidade caótica. Mesmo sabendo que Londres é uma capital ainda mais completa e culturalmente rica, ela não teria os labirintos místicos que São Paulo tem. Esse caos, de alguma forma, me fazia sentir em ordem.
Disfarcei o leve tropeço que dei ao descer do trem na Consolação e ri ao pensar em tudo que poderia acontecer somando minha inexperiência e distração em um lugar como a Inglaterra.

Comecei a percorrer a avenida em direção ao meu Starbucks preferido. Observei as pessoas, as crianças, andando livremente naquela tarde de domingo. Sempre foi um dos meus passeios preferidos.
Principalmente com o Leo. Afinal, era quase sempre com ele que eu saía. Depois que comecei a namorá-lo, acabei me afastando de muitos amigos. Mas isso acontece quando você precisa se dedicar à alguém que te vê como posse.

A Paulista pulsava vida, música e movimento. Ainda estava triste e sentindo um aperto no peito devido ao término com Leo. Ele ainda me enviava gravações, e meu coração doía a cada acorde no ukulele acompanhado da sua voz suave. E então, pensava em todas as vezes em que pedi que ele tocasse para mim e ele estava cansado ou ocupado demais pra isso. Respirei fundo, me enchendo de convicção. Eu havia tomado a decisão certa.

Estava quase chegando quando senti o celular vibrar. O nome de Leo me acertou como um golpe, e esbarrei em um homem apressado devido à minha parada brusca. Pedi desculpas, desconcertada, e atendi com a mão levemente trêmula.

- Era pra gente estar aí, né?

- Como sabe que estou aqui?

Senti meu coração queimar.

- A Giovana comentou com o Pedro. Não é a mesma coisa sem mim, não é?

Engoli em seco, segurando para não chorar e deixar minha voz falhar. Odiava ser tão sentimental e chorar com facilidade.

- Eu estou muito bem. - Foi tudo que consegui dizer.

- É isso mesmo que você quer? Eu te amei tanto, Melissa. Nós iríamos provar ao mundo que amor verdadeiro existe...

Isso... - "Não é amor", eu queria dizer. Me encostei na parede, observando o vai e vem frenético, deixando uma lágrima escorrer. Olhei para cima, tentando conter meus rios internos, e umedeci meus lábios trêmulos. - Isso não é amor, Leonardo.

Ele riu.

- Você insiste em ir pra longe... porque não apenas um mês? Um ano! UM ANO! E deixar pra trás um relacionamento de quase três... você não lembra, Mel? - Sua voz se suavizou. - Não se lembra de nós ouvindo Los Hermanos na praia, daquele pôr-do-sol? De quando você me chamava de pierrot...

Apertei meus olhos com força. Leonardo jogava sujo, e eu, fraca que sou, só conseguia usar minha energia para não chorar como uma criança. Balancei a cabeça e desisti de tentar me conter. Minha voz saiu falha e trêmula.
- Claro que me lembro. E também me lembro das vezes em que precisei de você e me deixou sozinha. Das vezes em que teve ciúmes dos meus amigos sem motivo. Das vezes que pedi por um carinho e... e não tive. Você que escolheu isso! Tantos casais namoram à distância... você quer tudo do SEU JEITO! Eu não te quero mais. Não quero... - Desliguei o telefone e deixei os soluços saírem. Coloquei minha mão na boca, tentando amenizar aquela cena patética. Uma criança passou por mim e perguntou para a mãe o porquê de eu estar chorando. Nessa hora saí andando, abraçando meu corpo.

A flower on the meadowWhere stories live. Discover now