Capítulo 2

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_15/01/5507_
(primeiro mês)

Ele era o único modelo que permanecia de olhos abertos. Espiando por debaixo das lentes do visor, ele espera com entusiasmo o momento em que aquelas portas finalmente se abririam e veria novamente a luz tão viva que aquecia sua pele ao toque. Era um dos únicos momentos de sua existência, que ele poderia ver o pedaço da natureza que não fora engolida pelo deserto que a rodeava. Finalmente abrem-se as portas, a vivida luz corre tocando seus pés invadindo toda cabine. Assim que fora autorizado a retirar o visor, sua ansiedade o impulsiona em direção ao seu tão aguardado oásis. Mascarados então tomam a sua frente.

"Permaneça em sua posição."

Em fila, todos os modelos Combate seguiam os Mascarados, estes que os guiavam em posse de bastões elétricos que usavam para atordoá-los, separá-los em brigas que, por serem bem instáveis, eram bastante frequentes.
O artificial não reproduzia com perfeição o que a exposição ao natural trazia ao corpo dos Operadores em fase de maturação, por conta disto, seu desenvolvimento dependia também de periódicas visitas ao Oásis. Ele gostava de respira aquele ar, de sentir a textura das folhas sob seus dedos, de ouvir o assobio do vento e a batida das folhas na copa das árvores. Próximo as árvores, ele observava o verde que se estendia, curioso em saber o que havia mais adiante. Notou, ao pé de uma delas, ao lado dos arbustos, um lustroso brilho alaranjado. Sem ao menos perceber, seu corpo fora impulsionado ao local.

"Não estão autorizados a cruzar as árvores."

A voz robótica precedera a forte colisão contra seu corpo, um Mascarado que o empurrava de volta enquanto ele via aquele misterioso objeto se distanciar. Ele sabia que não podia cruzar aquela fronteira, mas algo crescia dentro de si, o desejo de saber o que era tal objeto, ver o que havia além da barreira de folhas. Naquele momento, ele notou mais adiante o agito de alguns modelos.

"Você me fez tropeçar de propósito!"

"Eu só estava passando!"

"Mentira! Vai pagar por isso!"

Os modelos avançam um contra o outro e Mascarados logo intervêm, sendo prontamente repelidos pelos modelos que brigavam entre si. Apesar de possuírem aspectos semelhantes à crianças de 10 anos, eram extremamente fortes o bastante para levantar duas vezes o próprio peso com mera facilidade. Mascarados que delimitavam a área de circulação são obrigados a sair de seus postos a fim de cessar o conflito, o que abrira caminho para que ele pudesse alcançar aquele misterioso objeto. 

Ele avançou por entre as árvores e pegou a fria caixa na areia, se escondendo entre as sombras para não ser visto pelos mascarados. Tinha uma grande rachadura na ponta, grades escuras e enferrujadas, na frente, alguns pequenos botões azul-escuros e um maior e um pouco danificado. Ele fuça o objeto, sente sob os dedos a grade de metal descascado, uma arisca sensação que mancha a ferrugem. Pouco acima, ele puxa uma pequena haste de metal que aumenta seu tamanho, e ao ser pressionada diminui. Repete tal gesto mais a vez até que aperta um dos botões e percebe que eram impulsionados para dentro. Apertou todos até que, ao apertar o botão próximo ao maior, escuta um baixo chiar. Levou o objeto a orelha e ouviu o longínquo som como se alguém estivesse falando. Ele se afastou mais ainda do murmúrio e daquela agitação decorrente a briga para conseguir ouvir melhor. Tentou apertar o maior e último botão, percebeu que ele não era impulsionado para dentro, contudo escorregava para o lado, ele girou o botão. A voz desapareceu, e então ele continuou a girar até ouvi-la novamente. Apertou novamente os quatro botões, o chiado aumenta. Girou novamente o botão maior e ouviu a voz, bem mais nítida.

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